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Crítica | Tron – O Legado

Em 1982, Tron – Uma Odisseia Eletrônica empregou maciçamente efeitos especiais gerados por computadores na construção de cenários e demais elementos interagindo com os atores. À grosso modo, ele representou para a computação gráfica o mesmo que Avatar para a escala de uso do 3D, uma revolução digital. Outro elemento menos lisonjeiro mas importante marcou a sua estréia: o filme um enorme fracasso e acabou se transformou em cult ao longo dos anos. Estruturando a sua narrativa a partir do antagonismo entre a religião e a ciência, algo claro quando um programa pergunta a outro em determinado momento “Você acredita no Usuário?”, Tron fascinava (à época, claro) mais pelo visual do que pela coesão do roteiro e apresentação de seu universo.

28 anos depois, a continuação faz jus a todos as qualidades e defeitos do antecessor. E, desta maneira, Tron – O Legado é um filme que jamais cessa de impressionar pela criatividade com que apresenta o universo da Grade e a escala de utilização do 3D ao passo em que se mantém nostálgico ao retomar inúmeros dos componentes existentes no filme de 1982 (atualizados para o universo da Apple). Não surpreende também que esta nova visita ao mundo digital seja justificada por uma narrativa inconsistente, investindo novamente em uma analogia religiosa ineficaz e no fraco relacionamento pai e filho.

Sam Flynn (Garett Hedlund) se tornou o herdeiro da corporação Encom após o misterioso desaparecimento do seu pai Kevin Flynn (Jeff Bridges). Alheio às decisões da empresas, ele interfere com pontuais sabotagens, como ao enviar um importante sistema operacional para o domínio público. Mas, ao receber uma mensagem do antigo fliperama do seu pai, Sam é transportado para a Grade, onde o encontrará de novo, aprisionado por Clu (a versão digitalmente rejuvenescida de Jeff Bridges), programa criado para criar a utopia da perfeição.

Falhando em tornar amigável o universo para os espectadores, os roteiristas Edward Kitsis e Adam Horowitz apresentam um mundo povoado de Programas onde apenas Kevin e Sam são Usuários. Assim, experimentando o ar de novidade de Sam, os espectadores são arremessados a batalhas de discos e a uma corrida de motocicletas de luz, assumindo a natureza de entretenimento destes jogos. Pior: depois de reencontrar seu pai, lá pelo meio da projeção, o roteiro investe em um flashback expandindo conceitos como algoritmos isomórficos e até jazz digital.

Se a coisa é confusa para os não-iniciados, o diretor estreante Joseph Kosinski saí-se admiravelmente bem. Contido, Kosinski evita os excessivos cortes que tornam a ação incompreensível ao mesmo tempo em que usa, de maneira harmoniosa, a câmera lenta e a inversão do eixo. Outro bom elemento da narrativa é a trilha sonora de Daft Punk, na linha daquela ouvida em O Cavaleiro das Trevas e A Origem, criando uma quase balada eletrônica – os DJs ainda interpretam a si mesmos em um bar.

Mas é realmente o visual que merece destaque. Da direção de arte do esconderijo de Kevin Flynn, um ambiente etéreo, ao bar de Castor (Martin Sheen, em uma versão hi-tech do Charada de Jim Carey), tudo naquele ambiente se encaixa perfeitamente. Melhor é quando re-aproveita e atualiza os elementos do universo de antes, como as naves em forma de arco ou as motocicletas de luz. O figurino também merece destaque escapando do ar careta e retrô e adotando uma repaginação bem vinda e jamais excessiva. Enfim, construindo um contraste entre a realidade e o universo digital através do uso do 2D/3D este é um dos poucos filmes que vale a pena gastar um pouco mais para a experiência tridimensional.

Divertindo-se na pele de Clu, Jeff Bridges cria um vilão ameaçador e de uma mágoa e rancor palpáveis observadas no desprezo com que enxerga Sam Flynn pela primeira vez. Além disto, no outro papel, como Kevin Flynn, Bridges retoma o ar descontraído do nerd de computação ao investir em longos momentos de meditação e na sua retórica filosófica. Garett Hedlund não tem o mesmo carisma, mas não compromete. E o destaque fica com a bela Olivia Wilde (Quorra), expressiva e de uma ótima presença em cena.

Falhando pontualmente, ora na mudança de comportamento de um importante personagem nos minutos finais ora na alegoria religiosa de diálogos como “Ele é o filho do nosso criador” e “Falsa Divindade”, Tron – O Legado revive o mesmo percurso do pai com relativa autenticidade: uma empolgante viagem a um mundo digital impecavelmente criado apesar de imperfeito.

Avaliação: 3 estrelas em 5.

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2 comentários em “Crítica | Tron – O Legado”

  1. achei muito estranho este filme, parece que foi intencional, querendo comparar Deus, o diabo, e Jesus, fica claro em toda a parte do filme, querendo colocar o Deus como criador que perdeu o controle da criação, deixando todas a merce de um ser perfeito que ele criara, no caso real lucifer, da qual deixa de obedecer suas ordens, e o filho sam, que foi tentar salvar o erro do pai, ou seja, mais uma das tentativas de comparação

  2. Essa é uma leitura pertinente e esperada dos realizadores deste, e do seu antecessor de 1982. Acrescenta a narrativa uma dimensão a mais, porém eles exploram superficialmente.

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