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À Beira do Abismo

À Beira do Abismo (Man on a Ledge, Estados Unidos, 2012). Direção: Asger Leth. Roteiro: Pablo F. Fenjves. Elenco: Sam Worthington, Elizabeth Banks, Anthony Mackie, Jamie Bell, Genesis Rodriguez, Edward Burns, Kyra Sedgwick, Titus Welliver e Ed Harris. Duração: 102 minutos.

Durante os pouco mais dos 100 minutos de duração de À Beira do Abismo, dois pensamentos me acompanharam enquanto observava o desenrolar do plano do personagem de Sam Worthington para provar a sua inocência por um crime que não cometeu: no primeiro, eu assimilava os mecanismos narrativos (mal) usados para unir os pedaços do rebuscado roteiro; no outro, eu estava tão embevecido com a intensidade deste thriller, que interrompi momentaneamente as habituais reflexões e anotações. E, enquanto eu encontrava dificuldades para enxergar o “abismo” do título nacional – exceto se uma movimentada avenida do centro de Nova York possa ser tomada por um precipício -, foi muito mais fácil curtir a narrativa vertiginosa e francamente absurda sobre um homem a dois passos de cometer suicídio no parapeito de um altíssimo andar de um hotel

Esse homem é Nick Cassidy (Worthington), ex-policial e fugitivo do presídio de Sing Sing sentenciado a 25 anos pelo suposto roubo de um diamante do magnata David Englander (Harris). Determinado a provar sua inocência ameaçando sacrificar a sua vida, ele submete-se ao crivo da imprensa representada pela caricatura de repórter interpretada por Kyra Sedgwick e ao juízo da platéia de cidadãos nova-yorkinos, ao mesmo tempo em que é os negociadores Dougherty (Burns) e, sobretudo, Lydia Mercer (Banks) tentam convencê-lo, inicialmente, a abdicar da ideia suicida para em seguida, tornarem-se participantes diretos nos eventos. Simultaneamente, o seu irmão Joey (Jamie Bell, o eterno Billy Elliot) e a namorada Angie (Rodriguez) tentam furtar o autêntico diamante do cofre de Englander a fim de provar a inocência de Nick e desmascarar o vilão protegido por um esquema envolvendo policiais corruptos, dentre eles, Dante (Welliver).

Sim, o roteiro de Pablo F. Fenjves é consciente da irrelevância de mais da metade dos personagens, e desafio o espectador a encontrar a mínima utilidade do negociador Dougherty cuja única função aparente é convocar Mercer a pedido de Nick. A propósito, considerando o esforço do roteirista em conceber a totalidade da situação descrita (como Um Dia de Cão ou O Quarto Poder), é embaraçosa a ação dos cidadãos que, em um primeiro momento, instigam Nick a saltar com gritos de “Pule! Pule”, para em outro momento, transformá-lo no herói do povo, no homem comum levado ao extremo. Há, inclusive, o vergonhoso momento manipulador em que, para retardar a ação de alguns policiais, Nick começa a lançar maços de dinheiro à população de curiosos causando tumulto e alvoroço nas ruas. Obrigado seus personagens a agir de forma estúpida e incompreensível – é Englander quem remove o diamante do único lugar em que ele estaria verdadeiramente seguro para, bem, colocá-lo naquele em que ele se encontra mais exposto -, Pablo F. Fenjves ultimamente comete o equívoco de introduzir um dos elementos mais frágeis para unir as pontas do roteiro: o livre-arbítrio potencializado pelo tempo meticulosamente seguido por Joey para executar as ações no outro prédio. Dessa forma, a identidade de Nick TEM que ser revelada no momento exato para induzir os policiais a checarem a segurança e fornecerem a senha de segurança para entrada no cofre (agora imagine um filme todo recheado de situações desse tipo).

Mesmo com um roteiro tão problemático, a competente direção de Asger Leth distraí e empolga o espectador o suficiente para que ele ignore a movimentação das engrenagens e suspenda a descrença na maior parte da narrativa. Balizando sua direção na simplicidade de recursos óbvios, mas eficientes, Asger Leth apresenta Nick em um ângulo baixo rodeado de arranha-céus, rapidamente convidando o espectador a compartilhar a experiência vertiginosa através de planos plongés, aproximações de baixo para cima e a abundância de travellings aéreos, adotando uma abordagem mais convencional para as cenas transcorridas durante a tentativa de furto do diamante. Usando a visão privilegiada de Nick para conceber sequências empolgantes e tolas (é uma sorte que nosso herói não sofra de algum distúrbio oftalmológico), a direção é beneficiada pela boa montagem de Kevin Stitt que, de forma equilibrada e fluida, alterna entre as histórias paralelas sem prejudicar o ritmo e o envolvimento do espectador.

Ajudado pelo desempenho correto e simpático de Sam Worthington e seus “olhos honestos” como mencionado por um personagem em determinado momento, o ator parece nascido para interpretar heróis perseverantes (vide Avatar e Fúrias de Titãs). Além dele, Elizabeth Banks extraí o que pode de sua personagem unidimensional, imediatamente apresentada ingerindo comprimidos, consequência de um suicídio “bem-sucedido” no mês anterior. No mais, o restante do elenco despudoradamente traja a máscara da canastrice: Jamie Bell é estabelecido como um jovem constantemente tenso e suado, Ed Harris é o vilão ganancioso e incompetente, Anthony Mackie, o melhor amigo arrependido e Genesis Rodriguez, bem, apesar de não fazer nada ela se despe até ficar apenas de lingerie rosa antes de se preparar para invadir um cofre, o que diz muito sobre o seu caráter e planejamento da ação. Apresentando membros da imprensa que não hesitam em apostar com quantos minutos Nick irá pular, ao menos o roteiro não tortura o espectador incluindo o antipático chefe de polícia ou um ex-relacionamento amoroso do herói chorando ao vê-lo no beiral e implorando para ele descer.

Afora isso, mesmo com sua parcela de clichês, pedaços do roteiro extraídos de filmes melhores e meia dúzia de personagens caricatos, além de um formato burocrático e derivado, À Beira do Abismo tem o seu ar de novidade (exceto, talvez, se você já tiver visto A Tentação) e é ágil e intenso o bastante para não deixar o espectador pensar nos seus defeitos e furos de lógica.

Menos mal, pois dessa forma ele funciona precisamente como uma boa diversão escapista facilmente esquecível. Agora Asger Leth, como ousa não incluir o contrazoom de Hitchcock?

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1 comentário em “À Beira do Abismo”

  1. Em Viagem 2: A Ilha Misteriosa tem contrazoom. Você deveria ver.

    Mas discordo de você sobre a vertigem. Acho que o filme não consegue representar bem. Enfim…

    Toda a parte do roubo é ofensiva, cheia de falhas, de possibilidades. Uma chatice. Cortar o fio vermelho? Sério?

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