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John Carter – Entre Dois Mundos

(John Carter), Estados Unidos, 2012. Direção: Andrew Stanton. Roteiro: Andrew Stanton, Mark Andrews e Michael Chabon baseado no livro de Edgar Rice Burroughs. Elenco: Taylor Kitsch, Lynn Collins, Samantha Morton, Willem Dafoe, Thomas Haden Church, Mark Strong, Ciarán Hinds, Dominic West, James Purefoy, Bryan Cranston, Polly Walker. Duração: 132 minutos.


Para muitos espectadores e inclusive críticos e repórteres especializados em cinema, a atribuição da palavra ‘épico’ adquire a errônea conotação de que diante de nós repousa uma obra-prima de inestimável valor cinematográfico. Porém, historicamente esse gênero (sim, estamos diante de um gênero igual ao suspense ou a comédia) é carente de unanimidade, bastando relembrar alguns tropeços não tão longínquos como ‘Alexandre’ ou ‘Cruzada’ para observar que taxar de ‘épico’ nem de longe é sinônimo de qualidade. Sendo assim, usado no sentido correto, ‘John Carter – Entre Dois Mundos’ é um autêntico épico com tudo que lhe é de direito: locações exóticas, orçamento faraônico (US$ 250 milhões), cenas de ação em grande escala, bem como milhares de figurantes (estes substituídos por personagens digitais). O que não significa nada, pois é somente um filme mediano, desinteressante e incapaz de provocar grande animosidade de empolgação ou desapontamento.


Baseado em ‘A Princesa de Marte’, primeiro dos onze volumes escritos por Edgar Rice Burroughs, o autor de ‘Tarzan’, a história escrita há um século parece ultrapassada e reedita muitos elementos de outras ficções científicas. E, mesmo que jamais possa acusar o autor de plágio (afora se ele possuísse uma bola de cristal), é indiscutível que todos os temas abordados no roteiro escrito a seis mãos tenham sido melhor explorados anteriormente, padecendo de uma falta de ineditismo e crônica apatia que sepultam as ambições deste caro projeto. No roteiro, John Carter (Kitsch) é um veterano da guerra civil norte-americana teletransportado à Marte (ou Barsoom) no meio do conflito entre o impiedoso Sab Than (West), líder de Zodanga, e os habitantes de Helium, sobretudo o rei Tardos Mos (Hinds) e sua filha Dejah Thoris (Collins). Acolhido por seres esverdeados com quatro braços,  os Tharks, John Carter descobre ser dotado de ‘poderes’ oriundos da ausência de gravidade, participando decisivamente da guerra em Marte e revelando o envolvimento da sagrada raça dos Therns, liderados por Matai Shang (Strong), no curso do imbróglio.


Apostando na típica caracterização messiânica do personagem conflituoso, a direção de Andrew Stanton (dos excelentes ‘Procurando Nemo’ e ‘Wall-E’) tem o árduo trabalho de contextualizar o público no breve prólogo acerca dos eventos ocorridos no planeta vermelho antes de nos enviar à Nova York, no final do século XIX, onde ironicamente transcorrem os melhores momentos do longa. Reverenciando o faroeste, Andrew Stanton já apresenta seu protagonista no distintivo contraluz antes de adentrar no escuro e sujo bar frequentado por uma pequena escória, para posteriormente homenagear e expandir temas do gênero, como a relutância de John no auxílio à Dejah e sua abundância de nomes (‘Virgínia’, ‘Dotar Sojat’), no contraste a um dos ícones do gênero, o Pistoleiro Sem-Nome eternizado por Clint Eastwood. Aliás, a narrativa é uma analogia ao conturbado período histórico da secessão vivenciado por seu autor, não sendo difícil comparar Helium, Zodanga e os Tharks respectivamente a nortistas, confederados sulistas e índios Apaches. O que fica evidente na forma que Zodanga utiliza o poderoso Nono Raio, para escravizar e destruir, ao passo que Helium tem sonhos mais ‘industrializados’.


Porém, se a narrativa detém uma veia político-histórica latente, também apresenta sintomáticos clichês que somadas aos fracos diálogos (‘Você é feio, mas é lindo!’ ou ‘Podemos ser de mundos diferentes, mas eu o conheço’) afundam o problemático e arrastado segundo ato. Explorando pobremente a mitologia da obra –  elementos foram descartados visando possíveis continuações – e investindo na (falta de) química entre John Carter e Dejah Thoris e na indecifrável dedicação de Sola (Morton) a sua ‘cria’, ‘John Carter’ também falha nas burocráticas e supostamente grandiosas sequências de ação que, pouco inspiradas, são reféns quase exclusivamente dos ótimos efeitos especiais, destacando-se a fabulosa caracterização dos Tharks que lhes confere personalidade nas presas e expressões faciais. Encenando referências óbvias a ‘Guerra nas Estrelas’ – o ataque à estrela da morte e os pod racers -, Duna’ e ‘Stargate’, sobretudo na trilha sonora de Michael Giacchino, como não enxergar os Na’vi de ‘Avatar ao ver John Carter banhado no sangue azul de um gigantesco monstro?

Mais bem sucedida é a fotografia de Daniel Mindel que, tecendo a correspondência entre a aridez do velho oeste e o deserto marciano, aposta nas cores quentes chapadas e impressionantes tomadas panorâmicas. Com elipses divertidíssimas envolvendo as tentativas frustradas de fuga de John Carter, a montagem de Eric Zumbrunnen aproveita o crucial cerco dos Tharks ao redor do protagonista para revisitar seu passado em fusões e raccords inspirados. Uma pena, portanto, que a maioria dos grandes combates sofra com cortes rápidos, mais prejudiciais nas salas 3D (o filme não foi filmado da maneira apropriada, tratando-se de uma conversão).

Interpretando John Carter como um homem pertinaz cuja beligerância pretérita lhe trouxe somente dor e luto, Taylor Kitsch é competente, apesar de não ser grande ator, para segurar a narrativa nas costas embora desaponte a entonação do ‘Eu estou em Marte?’ semelhante a alguém dando um ‘Bom dia’ no elevador. Sua colega de elenco, Lynn Collins, é moderadamente bem-sucedida retratando a princesa de Marte como uma mulher teimosa e guerreira cujos trajes ousados e avantajados exercem uma influência enorme no seu par. Por outro lado, Dominic West é aborrecidíssimo como um vilão que, bem, quer dominar tudo e todos e Mark Strong acaba retornando ao conforto rotineiro de suas atuações maliciosas depois de surpreender em ‘O Espião que Sabia Demais’.



As vezes ousado e sombrio na traumática imagem de corpos mortos levados à fogueira e uma decapitação que, apesar de envolver um personagem digital, é distinta nos padrões Disney, noutras vezes tolo e infantil especialmente na ideia de conferir cores aos heróis e vilões, ‘John Carter’ é uma aposta ousada, longa (25-30 minutos a menos não fariam falta), cara e divertida, porém incapaz de escrever seu nome junto de outros épicos memoráveis.

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16 comentários em “John Carter – Entre Dois Mundos”

  1. Todos têm comentando deesse filme, mas ainda não o vi. Pelo que entendi, é um filme que divertirá, mas que não é marcante – acho que isso significa que eu devo ver, né?!

  2. Tudo bem que esse filme pode ter muitas coisas inspiradas de outros de ficção, mas para o ator que vivencia a trama já é uma viagem, imagina quem está diante da tela! Ser transportado para outra dimensão ou mundo paralelo pode ser demais para a cabeça. Filme ótimo, recomendo a todos.

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