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O Que Esperar Quando Você Está Esperando

What to Expect When You’re Expecting, Estados Unidos, 2012. Direção: Kirk Jones. Roteiro: Shauna Cross e Heather Hach baseado nos livros de Heidi Murkoff. Elenco: Cameron Diaz, Matthew Morrison, Jennifer Lopez, Rodrigo Santoro, Elizabeth Banks, Ben Falcone, Anna Kendrick, Chace Crawford, Brooklyn Decker, Dennis Quaid, Chris Rock, Joe Manganiello, Rob Huebel e Thomas Lennon. Duração: 110 minutos.


A gravidez inspira bonitos momentos de reflexão e comunhão, disso não há dúvida; ela também traz consigo um humor bem peculiar decorrente das mudanças físicas e emocionais vividas pela gestante e da incapacidade do seu companheiro de compreender o estresse emocional da futura mamãe e lidar apropriadamente com a situação. Este é um cenário fértil para uma bem-humorada, doce e sensível comédia de situação com um quê de romantismo, qualidades que O Que Esperar Quando Você Está Esperando infelizmente não possui. Pelo contrário, a narrativa adaptada do livro de autoajuda escrito por Heidi Murkoff e seguindo a estrutura de múltiplas subtrama do agradável Ele Não Está Tão a Fim de Você abraça sem restrições o óbvio, o grosseiro e o aborrecido, como se julgasse que rechear a sua antologia de rostos conhecidos e famosos bastaria para conquistar a espectadora (o uso no feminino é proposital), já embevecida quando o assunto é maternidade.

Escrito por Shauna Cross e Heather Hach, a história acompanha quatro casais grávidos e um outro esperando na fila de adoção, seus problemas individuais e a responsabilidade crescente com o iminente nascimento do bebê. Uma das futuras mamães é Jules (Diaz), a controladora apresentadora de um reality show de perda de peso que está grávida de Evan (Morrison), o seu parceiro no programa dança das celebridades e com quem ela nunca parece chegar a um consenso. A outra gestante é Wendy (Banks), casada com Gary (Falcone) e cuja ansiedade em engravidar está estampada no seu ofício (ela é dona de uma loja de bebês e autora de um bizarro livro infantil sobre amamentação), assim como no aplicativo que informa o período de sua ovulação ou ainda na necessidade de realizar cinco testes de gravidez para comprovar que esta ocorrera de fato. Mas Gary tem outros problemas: lidar com o pai extremamente competitivo Ramsey (Quaid) e com a madrasta Skyler (Decker), grávida de gêmeos e adorando a gestação (para a inveja desesperada de Wendy). Ainda há o casal Holly (Lopez) e Alex (Santoro) adaptando a sua vida para esperar uma criança africana (um comentário humanitário mas com traços de crítica social) e os cozinheiros concorrentes Rosie (Kendrick) e Marco (Crawford), jovens que reviveram os tempo de colegial praticando sexo irresponsável – cuja consequência é uma gravidez inesperada.

Mesmo carismáticos, os intérpretes encaram o traumático carma da unidimensionalidade, infelizmente, tão comum neste gênero e acentuado pelo próprio formato que exige uma rigorosa divisão de tempo entre os personagens. Nesse sentido, Jules quer tudo do seu jeito, enquanto Evan é inclinado ao diálogo; Wendy manifesta o pior da gestação, como os pés inchados, gases e incontinência urinária, além de um descontrole sentimental inverossímil que a leva a destruir o celular de sua (também) irritante ajudante ou a realizar uma palestra atipicamente sincera; já Gary, o filho inseguro, e Ramsey, o pai ricaço que acha que um bolo de dinheiro sacado do bolso é a solução de todos os problemas, limitam-se a um antagonismo tolo e obrigam a patricinha Skyler (quem diria!) a ter a ingrata missão de apartá-los. E se Rosie e Marco encarnam os clichês das comédias românticas juvenis, como o tom de “eles se odeiam, mas se amam” e as amizades descartáveis, Holly e Alex falham em ser personagens reais em meio a subterfúgios engraçadinhos (ele adere a um grupo de pais chefiado pelo verborrágico personagem de Chris Rock) e inconvenientes (ela é demitida do emprego de fotógrafa e mente ao marido, mesmo não sendo da sua índole) – e esta seria a subtrama mais propensa a ter um autêntico conflito, graças à infertilidade de Holly que é simplesmente cuspida na tela para que Jennifer Lopez possar ter seu momento “dramático”.

Talvez esteja sendo demasiadamente exigente condenando a narrativa somente por causa de esteriótipos e personagens rasos, porém não posso ignorar o descompasso moral que permeia o projeto. Reduzindo a importância dos homens a ponto de torná-los meros bancos de sêmen dispostos a realizar as vontades de suas mulheres por temor ou em troca de favores sexuais (Holly convence Alex sugerindo praticar sexo oral), a narrativa defende que, por terem “sacrificado o corpo”, “mulheres controlam o universo dos bebês”, o que lhes permite agir de forma intransigente e autoritária – e digo isto sem machismo e reconhecendo ser impossível, para um homem, entender a turbulência emocional vivida pela gestante. Praticamente castrados, é compreensível que os machões terminem venerando o fortão do parque (solteiro e sem filhos, evidentemente) e não vacilem ao afirmar que “bebês estragam a felicidade”. Mas, ei, para manter-se nos cômodos trilhos do clichê, o desfecho acumula pedidos de desculpas e reconsiderações do suporte masculino na gravidez, do amor à família, e outros ensinamentos prontos que dá sono só de pensar em repetir.

Por sua vez, privilegiar o humor pastelão e a escatologia em prejuízo de aproveitar o potencial de certas situações demonstra a superficialidade da narrativa. Assim, a inclusão de um aborto é uma decisão ousada, mas que acomete confortavelmente a menos preparada a ser mãe, esvaziando sua subtrama e tornando-a dispensável. Além disso, a hemorragia ocorrida durante um dos partos serve só para provocar “tensão” e reconciliar dois personagens. Entretanto, o que esperar de uma narrativa cuja corrida de carrinhos de golf (?) surge como a reviravolta emocional de um perdedor? Pior somente o “senso de humor” do diretor Kirk Jones (dos bons A Fortuna de Ned e Estão Todos Bem) investindo no vômito dentro do troféu e na justaposição desse e um prato de almoço, ou o estímulo visual na forma de uma mordida numa banana empregado durante uma discussão sobre circuncisão.

Apresentando uma cronologia frouxa e uma estrutura narrativa precária que recorre a coincidências forçadas para unir as subtramas (Gary participou de uma edição do programa de Jules, já Holly aceita fotografar os Cooper), o que mais impressiona no final é a realista barriga prostética usada por Cameron Diaz. Curiosamente, esse elogio resume O Que Esperar Quando Você Está Esperando, uma comediazinha de boa aparência e bem realizada, mas falsa e vazia de humor, drama e romance.

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1 comentário em “O Que Esperar Quando Você Está Esperando”

  1. Em vários aspectos nossos textos são parecidos, Márcio. Sinceramente, essa divisão de núcleos, sem um desenvolvimento necessário de cada uma, torna o filme apenas esquecível – tive que recorrer ao IMDb para lembrar um dos núcleos do filme. Há algumas piadas até ousadas, mas o humor na obra é, de forma geral, "bobo". O romance idem.

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