Estabelecendo Pippa Lee (Robin Wright Penn) em flashbacks da sua infância e adolescência e na dinâmica do seu casamento com Herb (Alan Arkin), Rebecca Miller, na maior parte do tempo, evita o tom episódico da narrativa. Para isto, ela elipses de tempo com fluidez e criatividade — como no jantar entre Herb e Pippa, na qual a câmera se afasta até revelar esta a algumas décadas atrás.
A cineasta também aposta em símbolos que ilustram sutilmente momentos importante, como quando Suky (Maria Bello) enche o prato de cereais de Pippa e outro plano similar onde a mesma cena é vista, apenas substituindo o conteúdo por drogas. A cena montada a partir de fotografias, além de aumentar a tensão da descoberta que irá ser feita, faz um belo paralelo com a atividade de Kat (Julianne Moore).
Do elenco, agradou-me a atuação de Alan Arkin, como um homem consciente, mas que evita se render a sua avançada idade. Maria Bello está intensa no papel da mãe de Pippa, exibindo a mudança de humor de uma mulher sob efeito de anfetaminas. Blake Lively não compromete na composição da adolescência de Pippa. E se Keanu Reeves está apenas seguro, Monica Bellucci e Julianne Moore estão marcantes, mesmo em um curto tempo.
Mas é Robin Wright Penn o destaque: atriz talentosa e que abraçou os sinais da idade, ela atravessa o filme em pleno estado de torpor. Contudo, na tristeza em seu olhar ela revela que está à beira de um ataque de nervos. Mesmo no olhar cuidadoso ao medir a pressão de Herb, ela não esconde a ansiedade de talvez esta medição a libertar definitivamente do casamento, o que apenas a enriquece como personagem.
Apesar de moralmente reprovável pontualmente, durante uma cena no furgão ao final do filme, A Vida Íntima de Pippa Lee mostra que ainda que vivamos muitas vidas (pais/mães, filhos, amantes), no núcleo somos apenas uma pessoa que grita no âmago de nossa consciência para ganhar liberdade e se revelar ao mundo como ela é.
Avaliação: 3 estrelas em 5.
Crítico de cinema filiado a Critics Choice Association, à Associação Brasileira de Críticos de Cinema, a Online Film Critics Society e a Fipresci. Atuou no júri da 39ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo/SP, do 12º Fest Aruana em João Pessoa/PB, do 24º Tallinn Black Nights Film na Estônia, do 47º TIFF – Festival Internacional de Cinema em Toronto. Ministrante do Laboratório de Crítica Cinematográfica na 1ª Mostra Internacional de Cinema em São Luís (MA) e Professor Convidado do Curso Técnico em Cinema do Instituto Estadual do Maranhão (IEMA), na disciplina Crítica Cinematográfica. Concluiu o curso de Filmmaking da New York Film Academy, no Rio de Janeiro (RJ) em 2013. Participou como co-autor dos livros 100 melhores filmes brasileiros (Letramento, 2016), Documentário brasileiro: 100 filmes essenciais (Letramento, 2017) e Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais (Letramento, 2018). Criou o Cinema com Crítica em fevereiro de 2010 e o Clube do Crítico em junho de 2020.