Mano (o estreante Francisco Miguez) é um jovem vivendo os dilemas da adolescência. Apaixonado por uma colega de classe que não nota a sua existência, flertando com a experimentação de drogas e encarando o mundo com olhos de angústia e indignação ao mesmo tempo em que elabora as suas próprias regras, ele é um retrato bastante complexo do jovem de classe média brasileira.
Assumindo a notícia do divórcio de seus pais – em uma interessante cena que ao invés de investir em diálogos, utiliza a economia visual no olhar cabisbaixo do irmão Pedro (Fiuk), às bagagens arrumadas até a cara de vergonha e humilhação da mãe – e o homossexualismo do pai como pontos de partido da narrativa, Bodanzky não se prende a convenções e adota uma abordagem com múltiplas histórias sem jamais perder o foco e a coesão. Não apenas acompanhamos Mano, como o auto-destrutivo Pedro que ao terminar seu namoro imerge em uma depressão niilista ou Carol (Gabriela Rocha), apaixonada por seu professor (Caio Blat).
As figuras paternas da narrativa também assumem papel de destaque: Denise Fraga, mãe de Mano, e as fundas olheiras; José Carlos Machado, o pai, que não esconde a própria adolescência ao honestamente assumir para seus filhos sua homossexualidade; o músico vivido por Paulo Vilhena que eventualmente surge como conselheiro de Mano.
Mas é o estreante Miguez quem consegue transmitir com segurança o turbilhão de emoções que ele atravessa. Vivendo todos os momentos com genuíno sentimento de novidade, é divertido observar sua reação após a primeira transa, mesmo que instantes depois ele demonstre certo cinismo e maldade ao acusar injustamente um professor ou difamar uma colega de turma, fundamentais para que o enxerguemos como um ser humano complexo e não um protagonista unidimensional.
Mas, o mais gratificante é a rima narrativa que Bodanzky usa ao ilustrar, em dois momentos, Mano tocando Something dos Beatles, em uma vez desajeitado e na outra perfeitamente seguro de si – o que não apenas ilustra um aspecto romântico do coração de Mano como o amadurecimento que se adquire com a prática, e a vida nada mais é do que a prática diária de uma rotina.
Desconstruindo a vida daquele universo de jovens que virá a ser a geração do futuro, As Melhores Coisas do Mundo é bom o suficiente para, com gosto agridoce, nos ajudar a reviver aqueles bons momentos que não voltam mais.
Avaliação: 4 estrelas em 5.
Crítico de cinema filiado a Critics Choice Association, à Associação Brasileira de Críticos de Cinema, a Online Film Critics Society e a Fipresci. Atuou no júri da 39ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo/SP, do 12º Fest Aruana em João Pessoa/PB, do 24º Tallinn Black Nights Film na Estônia, do 47º TIFF – Festival Internacional de Cinema em Toronto. Ministrante do Laboratório de Crítica Cinematográfica na 1ª Mostra Internacional de Cinema em São Luís (MA) e Professor Convidado do Curso Técnico em Cinema do Instituto Estadual do Maranhão (IEMA), na disciplina Crítica Cinematográfica. Concluiu o curso de Filmmaking da New York Film Academy, no Rio de Janeiro (RJ) em 2013. Participou como co-autor dos livros 100 melhores filmes brasileiros (Letramento, 2016), Documentário brasileiro: 100 filmes essenciais (Letramento, 2017) e Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais (Letramento, 2018). Criou o Cinema com Crítica em fevereiro de 2010 e o Clube do Crítico em junho de 2020.
1 comentário em “Crítica | As Melhores Coisas do Mundo”
Quero ver agora! =D