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Um Dia

Um Dia (One Day, Estados Unidos/Inglaterra, 2011). Direção: Lone Scherfig. Roteiro: David Nicholls. Elenco: Anne Hathaway, Jim Sturgess, Patricia Clarkson, Romola Garai. Duração: 107 minutos.
Baseado no best-seller de David Nichols, o que nos dias de hoje não significa absolutamente nada (Stephenie Meyer emplacou uns e todos sabem o que se sucedeu), Um Dia é uma versão Nicholas Sparks mais madura, mas igualmente lacrimejante e melodramática. Baseada em uma estrutura narrativa peculiar e intrigante, a qual revisita os 15 de julho na vida de Dexter e Emma desde 1988 ao longo de mais de 20 anos, a história se debruça no amadurecimento do relacionamento de seus personagens fugindo da pontualidade e imediatismo que cerca a maioria dos romances. Ironicamente, esse mesmo artifício revela a principal fraqueza do roteiro – outras serão vistas nos parágrafos seguintes – pois, o reencontro anual com os personagens não esconde a considerável perda de informações que motivaram mudanças súbitas na vida e no comportamento de cada um.

Emma (Hathaway) e Dexter (Sturgess) passam a noite de formatura juntos e, apesar dos esforços de fisgar e seduzir o jovem, Emma consegue estabelecer apenas laços de amizade com aquele que viria a ser o seu amor platônico. Findo este 15 de julho de 1988, acompanhamos a rotina anual de cada um que, sozinhos ou juntos nos anos subsequentes, trilharam caminhos diametralmente opostos e conheceram novas pessoas. Ela, inteligente, perspicaz e adorável, mas que não consegue alcançar o sucesso que lhe é devido; ele, cafajeste, presunçoso e arrogante, torna-se apresentador de um programa de televisão controverso. Inevitavelmente, eles descobrirão estar destinados um para o outro desde àquela fatídica noite, e mesmo que o roteirista David Nicholls pese a mão, obrigando Emma a cometer sacrifícios enormes e não-retribuídos para conquistar Dexter, o determinismo de uma história de amor na concepção de “foram feitos um para o outro” tem seu quê de charme.

Nesse meio termo, Hathaway rapidamente transforma-se no elo com o público. A doçura sonhadora, a meiguice e o despreendimento transformam Emma em uma companhia agradabilíssima, algo que o babaca do Dexter não consegue enxergar. Antipático, egocêntrico e narcisista, ele usa Emma mais como alguém para saciar a solidão provocada por sua personalidade e aplacar sua dor e vícios do que como uma verdadeira amizade. Interpretado pelo inexpressivo Sturgess e sua característica cara de paisagem e sofrimento, é praticamente impossível crer a bela e sensível Emma apaixonaria-se pelo sujeito depois de um desastrado jantar no qual ele expõe o seu (des)interesse e umbiguismo. Dessa maneira, ela surge como âncora trágica da narrativa, entregando-se aos amores de uma pessoa que ela não ama, apenas para surprir a carência sentimental. O que é revelado na mais clichês das frases, enunciada conforma a cartilha Nicholas Sparks: “ela o fez decente; você a fez feliz”.

Durante o amadurecimento de Emma e Dexter, os traços adolescentes, sonhadores e inconsequentes, cedem espaço para versões realistas, cínicas e desiludidas, propelidas por tragédias, algumas delas abordadas com excessivo descaso e descomprometimento em função da estrutura narrativa  – mais um efeito negativo desta. Alçado à condição de protagonista, decisão incorreta e questionável, Dexter submete-se a um arco dramático amplo desde a doença da sua mãe (Clarkson), o cancelamento do programa de televisão, o seu casamento com Sylvie (Garai, a jovem de Desejo e Reparação e cada vez melhor atriz), até um evento que o humanizaria definitivamente. Por sua vez, a vida de Emma é descrita em função do sonho em se tornar escritora ou o relacionamento com Ian (Rafe Spall), o que é decepcionante.

Esmiuçando e dissecando frações da vida daqueles personagens, determinados momentos deveriam ser explorados mais apropriadamente no roteiro de David Nicholls. A demissão de Dexter após uma entrevista desastrada e a contratação em um programa sobre videogame carece do vislumbre da jornada do personagem, apesar de entendermos o que levou a esta queda vertiginosa. Analogamente, o relacionamento de Emma com Ian, apresentado em um jantar sem faíscas ou na inabilidade do sujeito em fazer piads, culmina na explicação de que ela não “aguenta mais ele assistir a Ira de Khan todos os dias”. Essa demasiada exposição torna-se constante no filme, exigindo que um personagem precise contextualizar ao público os eventos que estão transcorrendo, no que expõe a artificialidade da empreitada; ora, se Emma e Dexter são tão amigos, era esperado que ele revelasse às más notícias no tempo esperado e não meses depois.

Por outro lado, a narrativa anual é bem explorada pela diretora dinamarquesa Lone Scherfig (do ótimo Educação), e o uso de raccords e elipses na montagem de Barney Pilling destacam-se. E não apenas a temporalidade, mas o duo de personagens permite que a fotografia de Benoît Delhomme individualize a trajetória de Emma em um sépia nostálgico, ao passo que Dexter está sobremaneira banhado na depressiva paleta de cores azulada. Finalmente, a trilha sonora de Rachel Portman evita ser intrusiva demais, pontuando de forma competente a narrativa.

Sim, a idéia é curiosa e o exercício narrativo válido (apesar de falho). A trajetória de duas pessoas é desenhada diante de nossos olhos e, convenhamos, não é algo costumeiro na produção de romance. É uma pena, portanto, que o 15 de julho escolhido soe desesperadamente clichê e expositivo, tornando por comparação, os desconhecidos 364 dias restantes de cada ano, aparentemente mais interessantes.

E Emma (não Dexter) mereceria uma história de amor melhor.

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8 comentários em “Um Dia”

  1. O livro é ótimo, mas a narrativa se perde no filme em razão do pouco tempo para a explicitação dos contextos pessoais. A escalação da Anne Hathaway não ajudou; a composição da personagem ficou bem aquém do esperado para quem conhece o livro.

  2. Discordo, acho que o que carregou o filme foi a Anne e a a forma doce que ela fez na personagem.

    O que decepciona no filme é a falta de desenvolvimento e explicação de algumas coisas, o que o faz um pouco seco, não explora a emoção e as reações dos acasos como devia.

  3. Achei um ótimo filme, isso porque ainda não li o livro, mas achei a história linda, quem gosta do ''gênero'' Nicolas Sparks e Cecilia Ahern, assim como eu, vai gostar do filme!

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