Lembranças de lado, a história escrita por Allison Burnett apresenta Jill (Seyfried), garçonete que há alguns anos fora a única sobrevivente de um serial killer, o que deixou marcas no psicológico da garota e a levou a ser internada durante dois meses em uma instituição psiquiátrica. Obcecada e desconfiada, o que justifica as aulas de defesa pessoal e os quatro trincos na porta da sua casa, Jill tem um zelo quase obsessivo pela irmã mais nova Molly (Wickersham), dedicada estudante e alcoólica em recuperação. Certa noite, ao voltar do trabalho, Jill descobre que Molly desapareceu, mesmo esta tendo uma importante prova no dia seguinte. Ignorada pela polícia (“adultos têm o direito de desaparecer”) que enxerga nela uma lunática ambulante, Jill empreende uma busca implacável pelo paradeiro de Molly antes que seja tarde demais.
Fiapo de narrativa episódico e mal desenvolvido, não é surpresa que os “personagens” no caminho de Jill sejam caricaturas descartáveis e, na maior parte das vezes, hostis apenas para que desconfiemos serem assassinos em potencial. Entre sujeitos ameaçadores que não hesitam encarar de baixo para cima e outros de dentes podres e amarelados e intenções dúbias, a angelical Jill destaca-se no submundo por todas as razões erradas na busca daquele com “olhos de estuprador“, como alguém lhe afirma certo momento. O que, porém, a jovem não parece cogitar é que, embora ela não se recorde das feições do serial killer, ele certamente se lembra dela, o que começa a minar o fraco roteiro na medida em que pensamos nele em retrospecto.
Dessa maneira, não há muito que o diretor Heitor Dhalia possa fazer para reduzir o estrago provocado pelo péssimo roteiro. Introduzindo flashbacks das traumáticas memórias de Jill a conta-gotas, o diretor acerta no ambiente frio e opressivo empregado na narrativa, destacado pela boa fotografia de Michael Grady, além de se mostra hábil na tensão sugerida ao longo do trajeto nos caminhos vicinais de uma floresta. Mas, os ingratos closes com que leva o espectador a induzir a desaprovação e/ou ofensividade de praticamente todo o restante do elenco e o sumiço de um importante personagem que retorna, sem abrir a boca, num plano-médio no final demonstram um nervosismo de Heitor Dhalia, o qual ninguém poderia suspeitar depois de ter visto seus outros filmes nacionais.
Quem sabe 12 Horas funcione melhor com os notívagos daqui a uns 4, 5 anos nas telas do Supercine. Porque precisa estar com muito sono para se convencer com esse thriller!
Crítico de cinema filiado a Critics Choice Association, à Associação Brasileira de Críticos de Cinema, a Online Film Critics Society e a Fipresci. Atuou no júri da 39ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo/SP, do 12º Fest Aruana em João Pessoa/PB, do 24º Tallinn Black Nights Film na Estônia, do 47º TIFF – Festival Internacional de Cinema em Toronto. Ministrante do Laboratório de Crítica Cinematográfica na 1ª Mostra Internacional de Cinema em São Luís (MA) e Professor Convidado do Curso Técnico em Cinema do Instituto Estadual do Maranhão (IEMA), na disciplina Crítica Cinematográfica. Concluiu o curso de Filmmaking da New York Film Academy, no Rio de Janeiro (RJ) em 2013. Participou como co-autor dos livros 100 melhores filmes brasileiros (Letramento, 2016), Documentário brasileiro: 100 filmes essenciais (Letramento, 2017) e Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais (Letramento, 2018). Criou o Cinema com Crítica em fevereiro de 2010 e o Clube do Crítico em junho de 2020.
3 comentários em “12 Horas”
Como o Dhalia topou fazer esse filme?
O Falcão Maltês
E aí, Márcio
Tudo bem? Como vai a família? A esposa? Os meninos?
Devem estar grandes, né!
Então tudo bem.
Por que você não faz a crítica do filme nacional "Os 3". Saiu esta semana nas locadoras. É um ótimo filme sobre relacionamento e amizade entre três jovens. Misturado um pouco com o tema de "reality show" pra bagunçar a vida deles, mas o principal é a amizade entre o triângulo.
Abraço,
Mauricio.
Só mais uma coisa. Essas duas letras "L" no "Sallem" é aquele lance de numerologia?
Acho que vou tirar o "u" do meu nome pra ficar " Mallricio.
Realmente, o filme nem tenta esconder as inúmeras falhas, mas não vou negar que em alguns momentos me fez esquecer delas em função de algumas cenas a meu ver bem conduzidas, inverossimilhanças à parte, como na longa jornada que a personagem de Seyfried percorre de carro no escuro e sozinha, falando com o algoz no telefone — que me deixou muito tenso –, e para depois culminar num clímax, como você diz, totalmente anti-climático, o que devo dizer que achei ousado por parte de Dhalia ou dos produtores (possivelmente eles devem ter posto a mão no corte final).