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Solteiros com Filhos

Friends with Kids, Estados Unidos, 2011. Direção: Jennifer Westfeldt. Roteiro: Jennifer Westfeldt. Elenco: Adam Scott, Jennifer Westfeldt, Jon Hamm, Kristen Wiig, Maya Rudolph, Chris O’Dowd, Megan Fox, Edward Burns. Duração: 107 minutos.
Um dos objetivos dos personagens de Solteiros com Filhos depois do nascimento do primeiro filho é o de permanecerem legais. Mesmo que este desejo venha de uma brincadeira, a injeção de responsabilidade é tão intensa que antes descontraídos e divertidos adultos cedem lugar a criaturas estressadas e exaustas e as (raras) saídas noturnas e programas com os amigos tornam-se tão animadores quanto trocar uma fralda suja no meio da madrugada. Ao menos isto é o que constatam os amigos solteiros nas visitas cada vez mais escassas e turbulentas pois, encarando outro momento na vida, pensam enxergar um panorama amplo onde amor, felicidade e filhos são palavras mutuamente excludentes. 
Escrito, dirigido e estrelado por Jennifer Westfeldt, um clone menos avoado da Lisa Kudrow, a Phoebe de Friends, o roteiro segue os melhores-amigos Jason (Scott) e Julie (Westfeldt) que, ao observar o ambiente permanentemente instável na vida familiar dos casais de amigos Ben (Hamm) e Missy (Wiig) e Leslie (Rudolph) e Alex (O’Dowd), decidem conceber um filho fora do casamento, sem envolvimento amoroso e mantendo intacta a amizade. A ideia, claro, é vista com descrença, zombaria e expectativas forjadas no fracasso, mas eles se mostram bem sucedidos na educação do pequeno e mantêm a chama sexual acesa com outros parceiros (interpretados por Megan Fox e Edward Burns), o que provoca naturalmente inveja e mágoa nos outros casais.
Apesar da divisão de responsabilidades ocorrer a princípio sem prejuízo da amizade, as coisas não saem como planejado e Julie começa a despertar uma afeição não correspondida por Jason, um mulherengo incorrigível, dono de comentários infelizes e infantis sobre flertes e posições sexuais. Aliás, para um cafajeste, Jason mostra-se incapaz de ler nas entrelinhas a vontade da amiga em formar uma família. Tal contexto sugerido e as situações decorrentes não são novos, e é fácil recordar outras comédias românticas ao pensar brevemente na narrativa: Juntos pelo Acaso apresentava uma proposta às avessas; Amizade Colorida Sexo sem Compromisso, os riscos de embarcar numa amizade com benefícios; e Plano B ou Coincidências do Amor, as intempéries de mães solteiras e respectivos envolvimentos românticos.
Todavia, diferente dos exemplares acima, que variam do descartável ao aceitável, Solteiro com Filhos tem uma narrativa madura, livre da maioria dos aborrecidos penduricalhos liberais, e ostentando um charme nas rugas e linhas de expressão de personagens que, na contemporânea Nova York, até agem segundo os modernos preceitos de relacionamentos, mas cultivam os sonhos clássicos de amor e família. A diretora Jennifer Westfeldt também não exagera em artimanhas cômicas e no cinismo sarcástico (oportunidades não faltaram para isto), além de ter a sorte de contar com o espirituoso Adam Scott e suas tiradas inspiradas (“Vamos excluir o nosso filho? Falar mal dele pelas costas?“) e uma história atual e verossímil (observe Alex enxugando as mãos no suéter de Leslie, para identificar aonde o abuso de intimidade conjugal nos conduz).

Contando com dois protagonistas improváveis, Adam Scott e Jennifer Westfeldt, que não carregam o estigma de serem rostos conhecidos e bonitinhos de comédias românticas, o elenco também conta com confiáveis coadjuvantes egressos de Missão: Madrinha de Casamento, Kristen Wiig, Maya Rudolph, Jon Hamm e Chris O’Dowd, além da beldade Megan Fox e Edward Burns. Aliás, a sequência que reúne todos em um jantar de ano-novo é emblemática e eficiente ao evidenciar as rachaduras e mesquinharia existentes nas amizades, e nem a aparentemente gratuita canalhice de um personagem foge da atenção da diretora que concede um momento de humanização posterior.

Revelando um timing cômico adequado, diferencial de boas comédias de situação, a montagem de Tara Timpone acerta nos cortes secos (Julia e Jason sozinhos no bar depois da festa de aniversário deste), e nos raccords sonoros encadeando sequências distintas (a revelação dos planos de gravidez). Também é difícil não se apaixonar pela fotografia de Nova York em estações charmosas como o outono e inverno ou com a trilha sonora incidental que, mesmo intrusiva em certos momentos, acerta geralmente no bom gosto musical. 

Pecando apenas no desfecho tolo, apressado e previsível – aí sim, rebaixando o filme ao nível daqueles citados mais acima -, Solteiros com Filhos comprova os talentos múltiplos de Jennifer Westfeldt e é uma opção atraente e agradável para escapar dos blockbusters deste período.

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1 comentário em “Solteiros com Filhos”

  1. Estou afim de conferir Solteiros com Filhos há muito tempo. Chris O'Dowd é um dos melhores comediantes em atividade (nem sempre aproveitado como deveria no cinema), egresso da igualmente brilhante série inglesa "The It Crowd". O resto do elenco (vale lembrar: quase todos vindo de séries televisivas) é igualmente ótimo e instigante. Se vier pros cinemas goianos, verei, com certeza!

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