Argo | Estados Unidos | 2012 | Direção: Ben Affleck | Roteiro: Chris Terrio baseado no artigo de Joshuah Bearman | Elenco: Ben Affleck, Bryan Cranston, Alan Arkin, John Goodman, Victor Garber, Tate Donovan, Clea DuVall, Scoot McNairy, Rory Cochrane, Christopher Denham, Kerry Bishé e Kyle Chandler | Duração: 2h
Baseado no artigo escrito por Joshuah Bearman a partir de uma crise diplomática mantida em sigilo até poucos anos atrás, o roteiro de Chris Terrior transporta a história ao Teerã da década de 79 quando a população oprimida pelo governante anterior, o Xá, através de uma série de rebeliões, levou ao poder o líder islâmico, o Aiatolá. Instigados por uma mensagem de ódio, e a exposição em praça pública de dissidentes enforcados é um alerta para quem desejar se insurgir contra o novo governo, os manifestantes furiosamente se dispararam contra a embaixada dos Estados Unidos exigindo a devolução de um adoecido Xá, que oportunamente se exilou em terras ianques, já que mantinha boas relações com o governo de Jimmy Carter. Durante a invasão, 6 membros do corpo diplomático conseguem fugir e se refugiar na embaixada canadense, mas é apenas uma questão de tempo para que eles sejam descobertos pelos iranianos cuja ojeriza pelo povo norte-americano automaticamente os condenaria à morte. Entra em cena o agente da CIA especializado em exfiltração Tony Mendez (Ben Affleck) para organizar uma ousada missão de resgate.
Carente de opções viáveis, Tony Mendez recorre a uma ideia absurda, e que por isso mesmo poderia funcionar, recrutando de Hollywood o artista de maquiagem vencedor do Oscar John Chambers (John Goodman) além do produtor Lester Siegel (Alan Arkin) para ajudá-lo a organizar um filme falso, a ficção-científica Argo, inspirado em algum episódio tosco de Flash Gordon. Com a desculpa de buscar locações exóticas na Ásia para as filmagens fictícias, Tony se manda para o Irã com passaportes falsos e um plano de fazer os 6 fugitivos se passarem por membros da equipe de filmagem, algo que aterroriza aqueles homens há meses enclausurados dentro da embaixada sem nem ter a liberdade de pisar o pé de fora.
Apresentando desde o início uma narrativa que flerta com o extravagante universo do cinema embora mantendo firmes os pés no chão, Ben Affleck contextualiza a situação política através de evocativos storyboards que contam a história iraniana nos últimos anos, para em seguida corta e retratar a crueza de uma rebelião popular em que bastaria o acalorado ânimo da população para um confronto. Frisando o estado de agitação popular em que o mero avistamento de um ocidental branco leva a um exaltado bate-boca, e transferindo com elegância e fluência a ação para os corredores frios da CIA instantes depois, a narrativa muito bem montada por William Goldberg equilibra-se satisfatoriamente entre a ação in loco no Irã, a politicagem debatida nos escritórios da inteligência e o mundo falso do cinema.
Atribuindo identidade própria a mundos tão distintos, o diretor de fotografia Rodrigo Prieto investe em uma paleta de cor azulada para apresentar os inquietos e apressados agentes da CIA, chefiados pelo autoritário e cônscio Jack O’Donnell (Bryan Cranston, que tem um ótimo momento, mas nada para justificar o cochicho de Oscar), e não é a toa que eles parecem sempre estar em movimento constante, carregando documentos de cima para baixo e aguardando ordens disparadas por FAX e telefone. Enquanto isso, as sequências nos estúdios envolvendo os divertidos Chambers e Lestes aproveitam as cores fortes inspiradas no glamour do show business, que sofrem uma radical mudança ao pisar no Irã ganhando tons saturados, além de um grão grosso e tom urgente nos closes em rostos ansiosos e no claustrofóbico isolamento na embaixada canadense.
Mas é a faceta cineasta de Affleck quem eleva Argo a um patamar maior – como ator, ele está bem, conforme o restante do elenco, mas nada muito espetacular. Dono de um estilo clássico (e classudo), o diretor realiza suas escolhas com competência, ou conferindo credibilidade à história introduzindo o interesse do ministério da cultura iraniano em acompanhar a equipe de filmagem, ou elevando o nível de tensão a um grau absurdo durante a conclusão. Nem mesmo o uso excessivo de exageradas artimanhas – atravessar um set de filmagens nunca pareceu tão difícil – prejudica a narrativa que naquela instante já havia prendido o espectador na cadeira e dentro de sua inacreditável história real.
Trazendo algumas imagens de arquivos que revelam as licenças dramáticas empregadas na composição do elenco e conferem autenticidade ao que fora vista, Argo é a mais nova prova – como se precisássemos de tantas assim – do imenso talento de Ben Affleck como cineasta, para cético nenhum botar defeito… inclusive em relação à história.
Crítico de cinema filiado a Critics Choice Association, à Associação Brasileira de Críticos de Cinema, a Online Film Critics Society e a Fipresci. Atuou no júri da 39ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo/SP, do 12º Fest Aruana em João Pessoa/PB, do 24º Tallinn Black Nights Film na Estônia, do 47º TIFF – Festival Internacional de Cinema em Toronto. Ministrante do Laboratório de Crítica Cinematográfica na 1ª Mostra Internacional de Cinema em São Luís (MA) e Professor Convidado do Curso Técnico em Cinema do Instituto Estadual do Maranhão (IEMA), na disciplina Crítica Cinematográfica. Concluiu o curso de Filmmaking da New York Film Academy, no Rio de Janeiro (RJ) em 2013. Participou como co-autor dos livros 100 melhores filmes brasileiros (Letramento, 2016), Documentário brasileiro: 100 filmes essenciais (Letramento, 2017) e Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais (Letramento, 2018). Criou o Cinema com Crítica em fevereiro de 2010 e o Clube do Crítico em junho de 2020.
1 comentário em “Crítica | Argo”
Muito bom filme, e eu acho que o interesse gerado no assunto discutido, mas para ser honesto, eu sinto um pouco elitista, porque nem todo mundo entende. Definitivamente vale a pena assistir Argo é um filme contou com inteligência, bom ritmo e um elenco muito atraente.