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Crítica | Frankenweenie

Frankenweenie | Estados Unidos | 2012 | Diretor: Tim Burton | Roteiro: John August baseado no roteiro de Leonard Ripps | Vozes: Charlie Tahan, Catherine O’Hara, Martin Short, Martin Landau, Winona Ryder, Robert Capron, Conchata Ferrell, Christopher Lee | Duração: 1h27min.

Existem dois Tim Burton competindo em Frankenweenie para impor a sua própria visão infantil da história clássica escrita por Mary Shelley, Frankenstein: de um lado, o esquisito, mas sensível jovem cineasta que maravilhou o mundo com o seu encantador cinema gótico; do outro, um diretor bem estabelecido, com uma legião de fãs fiéis e cujas críticas divididas e a recepção morna de seus trabalhos recentes o tornaram bastante indulgente para se autoproclamar visionário e incompreendido. Duas personalidades inconciliáveis em um mesmo autor que terminaria entregando um produto irregular, um amálgama de emoção genuína e rancor que diminui aquele que é o charme da animação: a simplicidade e universalidade de sua mensagem.

Refilmagem do bom curta-metragem dirigido por Tim Burton em 1984, o roteiro escrito por John August já sofre com a obrigação de costurar novos elementos a uma história linear e que já havia sido muito bem contada anteriormente com um terço da duração. Em suma, trata-se da história de amizade entre Victor Frankenstein, um brilhante e precoce cientista, mas desprezado no colégio, e o seu fiel cachorrinho Sparky, que certo dia morre atropelado. Lidando com a angústia da perda e inspirado pelas aulas de ciências, Victor descobre uma maneira de reanimar cadáveres e decide utilizá-la para devolver a vida a Sparky, ingenuamente acreditando que conseguiria escondê-lo dos olhos curiosos. Até que estudantes do seu colégio, movidos pela proximidade da feira de ciências, obriga Victor a revelar o seu experimento provocando resultados desastrosos para a cidade inteira.

Funcionando sempre que investe no aspecto emocional, o que é uma surpresa diante da frieza que Tim Burton tem demonstrado nos seus últimos filmes, a narrativa consegue convencer da existência de um amor tão forte entre Victor e Sparky capaz de superar inclusive as barreiras da morte. Sem pesar a mão no sentimentalismo, Burton faz com que a aproximação de Sparky e a poodle do vizinho funcione singela e discretamente e até a incompreensível rejeição que o cachorro sente de si mesmo ao ver seu reflexo no espelho funciona dentro do contexto da narrativa. Assim, nem as pieguices exageradas, como o discurso do professor afirmando que a ciência está tanto no cérebro quanto no coração, chegam a incomodar diante de sua escassez e da força da história central.

Nesse sentido, a atmosfera gótica da animação estabelece por contraste uma amizade pura capaz de sobreviver à opressão do preto e branco, às sombras e aos relâmpagos que se acumulam na ótima fotografia de Peter Sorg. Por sua vez, a concepção visual dos macabros coadjuvantes investe no exagero de suas características físicas mais marcantes para distanciá-los do sorumbático protagonista, cujas olheiras fundas e a palpável melancolia acentuam a carência afetiva do rapaz que mais parece uma versão rejuvenescida de Johnny Depp.

Entretanto, logo no instante em que fisga o público, Tim Burton passa a insistir em introduzir referências excessivas e pouco orgânicas à narrativa. Se não incomodam o nome Shelley gravado numa lápide, a vizinha do protagonista cujo sobrenome é Van Helsing ou ainda a mecha branca em forma de relâmpago que remete à noiva de Frankenstein, o cineasta é autoindulgente ao homenagear os seus próprios filmes, como na escultura feita nos arbustos de Edward Mãos de Tesoura e a pipa semelhante ao bat-sinal de Batman. Ele também compromete o desenvolvimento do protagonista, assumidamente seu alter-ego, ao utilizá-lo para rebater críticas a seu trabalho, obrigando sua mãe a condescendentemente afirmar que “ele está sozinho no seu próprio mundo” ou introduzindo uma mensagem sobre ciência e genialidade que o coloca imediatamente acima da nata dos diretores… ao mesmo na sua humilde opinião.

Perdendo completamente o controle no terceiro ato quando inexplicavelmente um mesmo experimento produz resultados diversos – e não cola a explicação do professor acerca de variáveis – só para homenagear o máximo de monstros clássicos do cinema quanto é possível (Godzilla, Gremlins, Drácula e Lobisomem), Frankenweenie ainda assim é o melhor trabalho de Tim Burton nos últimos anos, sobretudo quando revisita o seu lado mais sensível da juventude que reconhecia no estilo gótico uma ferramenta para contar boas história. E não o contrário.

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4 comentários em “Crítica | Frankenweenie”

  1. Ótimo texto, Marcio.
    No entanto, percebo que gostamos do filme por motivos contrários, pois o que você enxergou como ressalva, eu achei um deslize e vice-versa. Por isso que o cinema é essa arte tão linda, complexa e pessoal =)

    Eu achei, como nos exemplares anteriores de Burton, a questão emotiva bem pouco explorada, considerando o potencial que poderia ser investido na amizade garotinho X totó. Como recurso emocional de Burton, só me recordo mesmo das lágrimas que escorrem dos olhos dos personagens, o que não necessariamente chega a comover o espectador. Senti falta dessa aproximação dos dois.

    Em contrapartida, a figura do professor de ciência é espetacular e essencial para a história. Não considero "piegas" o que ele diz a Victor sobre "ciência e coração", afinal, essa quote é que justifica o terceiro ato regado de experiências fracassadas pelos outros alunos, que apenas quiseram ressuscitar seus bichos de estimação para ganhar a feira escolar, enquanto Victor foi por sentir saudades de seu melhor amigo. Aí sim acho que está o coração do filme, mas ainda assim, carece de catarse e envolvimento.

    Em suma, gostei mais do que "Frankenweenie" representa do que exatamente de sua história. Quanto à estética, nem o que falar, Burton é mestre nisso. Mas somente nisso, eu diria =)

    Abs.

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