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Crítica | Meu Namorado é um Zumbi

Título original: Warm Bodies | País de origem: Estados Unidos | Ano de lançamento: 2013 | Dirigido por: Jonathan Levine | Escrito por: Jonathan Levine baseado no livro de Isaac Marion | Elenco: Nicholas Hoult, Teresa Palmer, Analeigh Tipton, Rob Corddry, Dave Franco e John Malkovich | Duração: 1h37min.

Desde A Noite dos Mortos-Vivos (1968), em que George Romero transformou criaturas exumadas da terra em ícones do cinema, os zumbis e as evoluções posteriores têm sido melhor usados como metáfora da sociedade contemporânea do que somente instrumentos para assustar. Meu Namorado é um Zumbi em nada diverge disso partindo do conflituoso R para discutir a urgência do ser humano (ou zumbis, se preferirem) de se conectar com alguém, uma mensagem estampada já na primeira cena e que, por mais óbvia que seja, não perde a sua relevância ao discutir o ápice do isolamento provocado por smartphones e a irônica sensação de conectividade que eles produzem.

Escrito por Jonathan Levine, que também dirige, o roteiro estabelece as regras de comportamento dos Cadáveres cedo na narrativa in off de R (Nicholas Hoult), um cadáver reflexivo e repleto de dilemas existenciais com um quê neurótico, e de quebra responde algumas perguntas deixadas em aberto por George Romero, como o porquê dos zumbis andarem em bandos e a predileção por cérebros humanos como maneira de consumir as memórias dos outros, uma ideia original que junto à reflexão proposta no parágrafo anterior, é a chave que rege as redes sociais. No entanto, a vida moribunda de R sofre uma mudança radical quando, durante um ataque a uma equipe humana que estava buscando mantimentos, ele se apaixona por Julie (Teresa Palmer, membra da escola Kristen Stewart de atrizes e com uma pitada de Naomi Watts), mas não antes de devorar o seu namorado Perry (Dave Franco, a cara xerocopiada do irmão James). Dedicado a mantê-la segura, R ainda tenta conquistá-la apesar das adversidades, já que além do fato dele ser um cadáver, Julie ainda é filha do líder da resistência Grigio (John Malkovich), cuja rixa com os Cadáveres é bem mais pessoal.

A princípio uma esquisita combinação de gêneros bem díspares, o pós-apocalíptico com zumbis e a comédia romântica, a narrativa demora um bocadinho para encontrar o equilíbrio satisfatório, mas quando o faz também ultrapassa as barreiras impostas pelos rígidos clichês dos gêneros originais e parte disso vem da figura do contraditório protagonista. Com cicatrizes no rosto iguais às de Edward Mãos de Tesoura, R compreende a natureza animalesca dos Cadáveres, a fome que sentem e a ameça que representam, e até parece apreciar devorar Perry, embora esforce-se para convencer o espectador que não. Porém, a caracterização cuidadosa que parte da ótima maquiagem e do figurino – um moletom vermelho que o diferencia de todos os demais zumbis e lhe dá vida através da cor -, à narração essencial para que uma criatura monossilábica com dificuldade de encadear uma frase expresse-se e à boa atuação de Nicholas Hoult, cujo rosto infantil contrapõe-se ao rosto ensaguentado após um banquete, ajudam a aceitar a ingenuidade e boa-vontade de R em ser uma “pessoa” melhor e, consequentemente, o relacionamento impossível com Julie.

Também ajuda a insegurança do rapaz diante de Julie, agindo como uma criança enquanto revela a sua coleção de vinis e durante um passeio de carro, sendo capaz ainda de roer-se por dentro até soltar uma pérola como “Este encontro não está indo bem. Quero morrer de novo”. Uma pena então que depois de estabelecer corretamente o universo pós-apocalíptico destruído em cores azuis frias iguais aos pálidos Cadáveres e fugir de meia-dúzia de conflitos e resoluções artificiais, sendo honesto com a história que pretende contar (adoro particularmente a decisão de R de contar o que fez com Perry após hesitar durante o tempo necessário), o diretor Jonathan Levine acaba abraçando clichês bobos e descartáveis, como o que coloca os Cadáveres caminhando em câmera lenta em direção à tela, e momentos particularmente constrangedores nos inserts de um coração batendo e ganhando vida.

Mas o pior é o surgimento da amiga de Julie, Nora (Analeigh Tipton), cujos gritinhos, suspiros e ações destoam totalmente do filme que se estava contando até então (eu deveria ter suspeitado que ela retornaria após o close dado no seu rosto antes). A título de comparação, até o melhor amigo de R, interpretado pelo normalmente inconveniente Rob Corddry, consegue ser doce e prestativo sem sacrificar a verossimilhança do personagem, exceto o palavrão perdoável gritado em momento de empolgação. Já os Esqueléticos funcionam bem porque representam tanto a ameaça implacável que justifica erigir um muro (outro símbolo óbvio e eficiente da mensagem da narrativa) quanto o destino inevitável dos Cadáveres após determinado tempo de putrefação.

Com uma das melhores trilhas sonoras que ouvi recentemente, passando de Guns ‘n Roses a Bob Dylan, Bruce Springsteen a Scorpions, para refletir com precisão o instável relacionamento de R e Julie, Meu Namorado é um Zumbi é uma versão inusitada de Romeu e Julieta em um mundo despedaçado, mas ultimamente capaz de ser curado pelo amor.

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2 comentários em “Crítica | Meu Namorado é um Zumbi”

  1. Sallem, concrdo que o filme supere expectativas, porém achei quatro estrlas um exagero. Achei mediano por ter tentado ser diferente, mas terminou caindo na mesmice… Como vc mesmo falou! Abs

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