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Sempre em Frente (C’mon C’mon)

Sempre em Frente (C'mon C'mon)

109 min.

Por Alvaro Goulart

O que quer que você planeje fazer, nunca acontece. Coisas em que você nunca pensaria acontecem. Então você só tem que ir em frente. Sempre em frente, sempre em frente…”, conta Jesse enquanto entrevista a si próprio.

E é com essas pílulas de sabedoria que aprendemos com Jesse e reaprendemos a olhar o mundo sob os olhos de uma criança. Em Sempre em Frente, Johnny (Joaquin Phoenix) e seu sobrinho Jesse (Woody Norman) forjam um relacionamento tênue, mas transformador, quando são inesperadamente colocados juntos nesta história delicada e profundamente comovente sobre as conexões entre adultos e crianças, o passado e o futuro, do escritor-diretor Mike Mills.

Johnny é um jornalista de rádio que está realizando diversas entrevistas com crianças pelos Estados Unidos quando sua irmã Viv (Gaby Hoffman) pede para que tome conta temporareamente de seu filho de nove anos para poder cuidar de seu marido com transtornos psicológicos – embora não deixe claro, acredito ser bipolaridade. Apesar do laço familiar, a relação entre tio e sobrinho não é estreita. Na verdade, eles pouco tem de conhecimento um sobre o outro. O laço de amizade se desenvolve enquanto eles deslumbram o mundo – ou um pouco do país – através do olhar um do outro.

O lidar com uma criança não é uma tarefa fácil. Ainda mais se tratando de uma criança cujo círculo familiar possui instablidades. Johnny encara a tarefa com uma certa arrogância de início. Afinal, ele escuta diversas crianças em seu trabalho. Não haveria de ser muito diferente tomar conta de uma que o enxerga com algum fascínio. Jesse não é uma criança dos comerciais de margarina. O pequeno, sob suas próprias palavras, está mais acostumado a sair com adultos; possui diversas teorias conspiratórias e algumas idiossincrasias um tanto dissonantes aos de sua faixa etária. Mas é um menino de uma doçura peculiar e com uma visão cirurgica sobre alguns aspectos da vida que muitas pessoas de idade mais avançada não conseguem contemplar.

Enquanto a paternidade de Johnny é desenvolvida, a maternidade de Viv não é questionada. Ela é apresentada de forma realista e ao mesmo tempo respeitosa. Ao longo do filme, descobrimos um pouco do que a irmã do jornalista vivenciou antes mesmo da maternidade. E que nem sempre tudo vai sair perfeito. Seja enquanto filho ou enquanto genitor, haverão momentos de descompensação. Como já foi dito, lidar com uma criança não é uma tarefa fácil. E para ambos os envolvidos pode ser um processo exaustivo.

Viv (Gaby Hoffmann) com Jesse (Woody Norman)

Acompanhamos as dificuldades do personagem de Phoenix muito antes de seus momentos de maior desespero. Seja tentando impor seu formato de solução ou seu entendimento sobre a vida, vemos um homem cujo trabalho é ouvir mas que nem sempre está disposto à escutar. Mesmo capturando diversos depoimentos e vivencias e criando o seu registro sobre elas, ainda é capaz de duvidar da capacidade da lembrança. Se o título do filme já indica a direção a ser tomada, o jornalista muitas vezes insiste em seguir na direção contrária, caminhando afastado dentro do quadro, ora se perdendo de si, ora dos seus.

A melancolia do filme é ressaltada poeticamente através da fotografia: O preto e branco afasta do realismo documental trazido pelas entrevistas que acontecem ao longo da história ao mesmo tempo que acolhe a todos, conectando-os em uma mesma palheta. Os planos fechados nos personagens nos permite quase participar dos diálogos entre eles e poder ir um pouco além do papel voyeur que assumimos enquanto expectadores. É como se pudéssemos estar deitados na cama enquanto Johnny lê as passagens de O Mágico de Oz para Jesse, ou estivéssemos prontos para responder as perguntas inesperadas da criança. Em contraponto, os planos abertos nos mostram uma Nova York onde todos se esbarram mas não se conectam, uma praia cujo som das ondas é mais interessante que a imagem das mesmas.

Johnny (Joaquin Phoenix) e Jesse (Woody Norman) na cama

Sempre em Frente nos apresenta diversos contrastes. Se nos deparamos com depoimentos reais a respeito do futuro, o filme também nos presenteia com cenas arrebatadoras do passado longínquo e recente de seus personagens fictícios. Os planos aéreos das cidades nos são oferecidos com uma trilha musical amena, como se trouxesse ordem ao caos intrínseco daquele ambiente. Se no filme temos a história do Mágico de Oz sendo contada a Jesse, é Johnny que caminha por sua estrada de tijolos – aqui em tons de cinza.

Acompanhar o caminhar de Johnny e Jesse é uma experiência agridoce. Não é difícil compreender os receios daquele homem de meia idade em não estar preparado para lidar com algumas situações inesperadas enquanto cuida de seu sobrinho. As quase duas horas de filme são também um apaixonante aprendizado sobre o quanto é possível aprender com as crianças. É incrível poder compartilhar do olhar simples e objetivo de Jesse sobre a vida. O filme deixa claro a capacidade de observação das crianças e jovens. Eles possuem uma maturidade proporcional às suas vivências e atenção a temas negligenciados por muitos adultos. Afinal, “crianças tendem a pensar livremente. Adultos, quando pensam, pensam numa caixinha”.

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2 comentários em “Sempre em Frente (C’mon C’mon)”

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