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Excluídos, o thriller da Netflix que mirou em Corra! e Nós

Uma mulher conseguiu construir meticulosamente uma vida de privilégios. Mas a chegada de dois estranhos à cidade ameaça derrubar esse castelo de cartas.

Diretor – Nathaniel Martello-White
Elenco – Ashley Madekwe, Justin Salinger, Jorden Myrie, Bukky Bakray, Samuel Paul Small, Maria Almeida

EXCLUÍDOS está disponível no catálogo da Netflix!

Crítica postada no Letterboxd:

Muito bem resolvido em se tratando de signos formais, embora problemático quando pensado estruturalmente.

Após se perguntar se a vida é apenas o acúmulo de dívidas e todo o desgaste para pagá-las, Neve foge. Quando a reencontramos, em tempo incerto, não é mais a mesma pessoa do início, mas de certo modo é, porque as inseguranças são expressadas de modo formal.

O plano baixo não a agiganta na imagem, mas a aprisiona debaixo das estruturas naturais (ela não pode deixar de ser quem é) e humanas (as mentiras nunca ficam escondidas por muito tempo). Em comparação, Marvin e Abigail, enquadrados da mesma forma, tem o céu cristalino e estruturas que os libertam por saberem quem são.

Nathaniel Martello-White, na sua estreia no roteiro e direção, inverte a polaridade do terror social de Jordan Peele. Se em Corra!, os brancos apropriavam-se do corpo negro, em Esquecidos, é Neve que escala na sociedade inglesa negando quem é. Para ocupar os espaços de poder e fazer parte da elite, precisa rejeitar o sangue negro e vestir a peruca.

A crítica é dirigida em como a sociedade condiciona o agir de Neve (gosto de imaginar que o diretor escolheu o nome em razão da cor), levando-a a rejeitar quem é e, em análise derradeira, seus filhos que lembram suas raízes. O passado, na forma deles, volta para assustá-la.

Aí começam os problemas estruturais. Apesar de serem interpretados por atores (Jorden Myrie e Bukky Bakray) que tentam conferir nuances complexas a Marvin e Abigail, a estrutura da narrativa nega isso. Óbvio que a antagonista da narrativa é Neve, que traumatizou os filhos de tal modo que se tornaram quem são, mas ilustrá-los de modo psicopático até acentua a tensão, embora reduza a componente humana e crítica.

Abigail devolve a meia irmã Mary à identidade através do cabelo; já Marvin ensina o meio irmão Sebastian a se defender. Ambos nutrem ressentimentos por terem sido preteridos em favor daqueles, porém ainda há certo elemento fraterno que os une, além de uma pretensa manipulação. A estrutura narrativa aniquila justamente isso, já que a empatia do espectador está com os filhos abandonados, e não com Neve.

Aí mora o perigo do lugar de fala – sou bastante flexível quanto a isto: acredito que todos possam falar sobre o que querem, mas que o peso que deve ser dado a cada fala deve ser medido pelo nível de vivência e conhecimento do que fala. É o que Denzel Washington tratou como diferenças culturais: Scorsese poderia ter dirigido A Lista de Schindler e Spielberg, Os Bons Companheiros. Será que, neste grande “se”, tais filmes teriam tão bons como foram?

Nathaniel Martello-White é negro, mas é homem. Há maniqueísmo na abordagem de Neve e do abandono materno. A cena inicial não serve para tridimensionalizar a personagem, que é vista como alguém que nasceu para pensar exclusivamente em si e fugir dos problemas logo que estes se apresentam. Dá para compreender a ideia de que abandonar os filhos é abandonar a parte de si que nega – a da mulher negra – mas o saldo é amargo.

Ainda assim, aprecio a naturalidade do desfecho que, ao menos, é fiel à personagem que retrata.

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