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Loucas em Apuros

5/5

Loucas em Apuros

2023

92 minutos

5/5

Diretor: Adele Lim

Ser da geração dos anos 90 trouxe uma perspectiva hermética a respeito da comédia juvenil. Esse subgênero era guiado pela autodeterminação de seus personagens – homens brancos heterossexuais – em perder a virgindade. Basicamente era esse o elemento central do enredo, e a comédia vinha das situações constrangedoras nas quais suas tentativas frustradas se transformavam. Herdeiro de uma leva que contava com Porky’s e Picardias Estudantis, o epítome da minha geração foi American Pie. Outro tema recorrente era a despedida de solteiro envolvendo as mais absurdas loucuras que iriam ser um último degustar da “liberdade” antes da “castração” do homem que aconteceria com a cerimônia do casamento. E para celebrar com risadas esse último rito masculino, o gênero nos ofereceu mais recentemente o terceiro filme do grupo de amigos de Jim (e Stifler) e a trilogia Se Beber, Não Case. Todos esses filmes foram construídos em cima de uma ótica masculina – e repleta de problemas. Demorou muito tempo até que a indústria oferecesse uma perspectiva feminina, afinal, as mulheres também tem histórias engraçadas para contar. E não faltam ótimos exemplos de narrativas protagonizadas por mulheres para se gargalhar: Missão Madrinha de Casamento, A Noite é Delas, Fora de Série e, é claro, Loucas em Apuros.

Esbarramos com a história de quatro mulheres que, em uma viajam para a China para fechar um contrato de negócios, acabam em uma jornada de autodescoberta. Pode parecer o resumo de uma narrativa insossa de autoajuda, mas o longa oferece momentos escatológicos de gargalhar. Longe de ser mais um filme de amigas que completam a frase uma da outra como as irmãs Wilson de As Branquelas, ou as gêmeas, de O Iluminado. O filme nos apresenta quatro mulheres distintas: Audrey (Ashley Park), uma advogada empresarial; Lolo (Sherry Cola), amiga de infância de Audrey e uma artista plástica nada ortodoxa; DeadEye (Sabrina Wu), prima de Lolo e seguidora de bandas de K-pop; e Kat (Stephanie Hsu), amiga de faculdade de Audrey e famosa atriz na China. Na trama, Audrey foi uma órfã da China adotada por pais americanos que precisa reencontrar sua mãe para conseguir fechar um importante contrato no gigante asiático. Para isso, leva a irreverente Lolo como tradutora… que acaba levando também a singular DeadEye de penetra na missão. Audrey conta também com Kat, cujo passado não pode ser revelado ao noivo puritano. Entre confusão, disputa de tapas, orgasmos e muita cocaína, as quatro companheiras seguem viagem nesse road movie.

Totalmente sem tabus, o filme mostra que mulheres também podem se divertir sem filtros. Podem beber até passar mal, transar com quem tiver afim – e com quantos tiver afim. Assim como gostar do que as satisfaçam e as deixem plenamente realizadas. É sobre ser livre para ser quem quiser e fazer o que quiser podendo viver em paz com suas escolhas. Afirmar isso é panfletagem? É, mas ainda vivemos em tempos onde o óbvio precisa ser dito, principalmente quando as mesmas escolhas não têm o mesmo peso sobre as figuras masculinas. Basta rebobinar os filmes de comédia que citei lá no início e ver como atitudes proporcionais eram relativizadas. O legal de trazer a perspectiva feminina é também inverter os papéis. Em Loucas em Apuros, os corpos masculinos são objetificados e em cenas realmente engraçadas. Algumas escolhas nas cenas de contextos sexuais podem parecer extrapolado, mas, ao mesmo tempo, esse exagero também removem o teor erótico das cenas, deixando espaço apenas para o riso. Por acaso, só existe um momento explicito no filme, mas é puramente cômico.  Acredito que a filmagem do filme deve carregar o “d” de diversão, não o de “desconforto”. Isso reforça a importância de uma diretora mulher. E a presença de mulheres ao longo do processo, desde a escrita do roteiro, é o que garantem o sucesso do longa.

Além da perspectiva feminina, Loucas em Apuros também carrega consigo o protagonismo de mulheres asiáticas. A indústria por muito tempo limitou o espaço de “amigas da protagonista” às mulheres não-brancas. No caso de pessoas asiáticas, ainda tem o agravante de refletirem estereótipos. O filme faz questão de lembrar que asiáticos não são “tudo igual” e que, inclusive, existem diferenças de traços e culturais dentro da própria China. Também somos convidados a conhecer um pouco mais sobre a ancestralidade chinesa, e a abrir os olhos para o racismo e outras formas de hostilidade as quais os imigrantes são submetidos. É interessante algumas falas sobre o choque cultural entre uma pessoa criada nos EUA com alguém criado na China – principalmente o contraste entre individualidade e coletividade. Assim como o caminho que o filme vai calçando para a reflexão de cada uma das personagens centrais.

Loucas em Apuros foi um enorme acerto! Seu humor irreverente entrega gargalhadas e reflexões pontuadas de maneira leve e orgânica. A existência de um filme centrado na perspectiva feminina e com protagonismo asiático traz um frescor à indústria já saturada das mesmas histórias. Como um filme de comédia, ele não deixa nada a desejar para recentes sucessos, como Se Beber Não Case. Também prova que o olhar feminino precisa substituir o male gaze, inclusive nesse gênero, conseguindo oferecer histórias tão ou mais loucas. Ainda estamos encerrando o primeiro semestre, mas, entre os que assisti até agora, Loucas em Apuros ocupa o lugar de Melhor Filme de Comédia do Ano.  

Loucas em Apuros estreia nos cinemas no dia 03 de agosto, com sessões antecipadas em 20 de julho.

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