Com origem no movimento estudantil alemão, o RAF – que até então não havia sido batizado – voltou seus olhares a eventos no contexto geopolítico internacional, como a invasão do Vietnã e a libertação do território palestino. Estes jovens guerrilheiros ao encarar seu passado nazista se voltaram em um anseio de protesto contra as autoridades símbolo de um país decadente. A morte de um jovem após um ato covarde da polícia alemã é o que bastou para que o RAF direcionasse o seu alvo.
Utilizando imagens de arquivo no decorrer da narrativa, Uli Edel apresenta uma excelente sequência em que apresenta inúmeros conflitos ao longo de todo mundo explorando o paralelismo com que estes refletem o terrorismo na Alemanha. Uli Edel também é competente ao, junto ao montador Alexander Berner, conferir agilidade e coerência temática a um projeto de quase 150 minutos que nunca perde ritmo.
O roteiro de Bernd Eichinger, baseado no livro de Stefan Aust, explora múltiplas linhas narrativas que mesmo enfraquecendo as biografias de Andreas Baader e Ulrike Meinhof, fornece pistas para compreender a evolução das motivações dos guerrilheiros. Responsável por diálogos belíssimos, como o proferido por um pai a uma repórter no ato de condenação de sua filha, Eichinger critica o uso da violência – perpetuada ou por terroristas ou por policiais – expondo sutilmente, comentários de mortes de inocentes que impedem a formação de uma imagem idealizada do RAF ou mesmo que os condenemos de imediato. E neste âmbito, a cena final é emblemática e contundente.
Se Moritz Bleibtreu (Baader) constrói um personagem imprudente, violento e desprovido de carisma, Martina Gedeck (Meinhof) saí-se infinitamente melhor. A conhecemos em uma praia naturalista juntamente com sua família e, após testemunhar a traição do marido, ela se volta ao movimento para escapar do seu mundo de faz-de-conta que desmoronou. Suas ações, que não usam a violência, mas sim a propaganda ideológica, atingem um grau de monstruosidade imenso ao abandonar as filhas, o que a torna a personagem mais trágica da produção. Finalmente, Bruno Ganz nos brinda com uma criação completamente distinta do Hitler que vimos em A Queda!, ao criar um investigador pragmático que, acima de tudo, está um passo na frente do RAF por vê-los não como inimigos, mas como seres humanos experimentando frustrações e anseios.
Contabilizando diversas tragédias imperdoáveis na conta da RAF, como o trágico incidente nas Olimpíadas em Munique ou o atentado ao avião da Lufthansa na década de 70, O Grupo Baader Meinhof nos revela cidadãos reprimidos pelo legado de memórias que desejariam esquecer e que funcionaram como uma pequena fagulha que eventualmente culminaria em um grito de liberdade de um povo sufocado – a queda do muro de Berlim.
Avaliação: 5 estrelas em 5.
Crítico de cinema filiado a Critics Choice Association, à Associação Brasileira de Críticos de Cinema, a Online Film Critics Society e a Fipresci. Atuou no júri da 39ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo/SP, do 12º Fest Aruana em João Pessoa/PB, do 24º Tallinn Black Nights Film na Estônia, do 47º TIFF – Festival Internacional de Cinema em Toronto. Ministrante do Laboratório de Crítica Cinematográfica na 1ª Mostra Internacional de Cinema em São Luís (MA) e Professor Convidado do Curso Técnico em Cinema do Instituto Estadual do Maranhão (IEMA), na disciplina Crítica Cinematográfica. Concluiu o curso de Filmmaking da New York Film Academy, no Rio de Janeiro (RJ) em 2013. Participou como co-autor dos livros 100 melhores filmes brasileiros (Letramento, 2016), Documentário brasileiro: 100 filmes essenciais (Letramento, 2017) e Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais (Letramento, 2018). Criou o Cinema com Crítica em fevereiro de 2010 e o Clube do Crítico em junho de 2020.