O rapaz, agora aos 17 anos, está de malas prontas para ir à faculdade e os seus brinquedos ansiosos para saber qual será o seu destino. Relembrando momentos mais saudosos quando eram a menina dos olhos de Andy, os brinquedos participam de uma intensa e agridoce aventura em um trem, recheada de melancolia ao descobrirmos se tratar somente de uma gravação. Triste é constatar que os brinquedos se contentam apenas no toque do seu dono, nem que seja na busca por um celular dentro da caixa onde todos estão esquecidos.
Mas, não é o caso de Andy ter se transformado em vilão, só o amadurecimento natural do jovem que revela um afeto enorme pelos brinquedos, especialmente Woody. Assim, ao decidir guardá-los no sótão, que se não é o destino ideal, ao menos permitiria que eles permanecessem juntos, uma confusão acaba levando-os para a creche Sunnyside, um lugar aparentemente inofensivo em que os brinquedos podem novamente alegrar crianças (e cumprir o seu propósito). Aos poucos, o diretor Lee Unkrich revela a natureza tenebrosa daquele lugar fotografado no escuro da noite e com um relâmpago cruzando o segundo plano.
Em Sunnyside, as crianças, inocentemente cruéis, torturam e maltratam os brinquedos, e os brinquedos obedecem as ordens de Lotsu, um urso de pelúcia cor-de-rosa que dissimula na voz doce e pausada um verdadeiro ditador. Woody então, o único escolhido a acompanhar Andy na universidade, retorna para resgatar os seus amigos. Usando os brinquedos como alegoria para o medo de todos nós em sermos descartados por que nós amamos, o roteiro escrito a oito mãos é comovente na mensagem da mãe de Andy, “eu queria estar com você sempre!“, e na atemporal história de amizade em que nós nos preservamos na memória e lembranças dos outros ainda que não estejamos mais na vida deles.
Evitando infantilizar o público alvo, Lee Unkrich não ignora a crueldade infantil e dos brinquedos uns para com os outros, recriando planos que nos fazem temer pelo destino dos brinquedos. E é emblemático, nesse sentido, todo o terceiro ato que se passa no lixão e representa o maior desafio que Woody, Buzz e os outros enfrentaram, demostrando também como a Pixar nunca entrega um filme fácil para o seu público.
Igualmente engraçada, a narrativa tem um humor inteligente construído sobre as pecualiaridades de cada brinquedo, como a divertida chave que habilita o modo espanhol de um personagem ou outro que se considera um intérprete de Shakespeare. A riqueza de detalhes da Pixar também impressionada e observe as marcas do tempo no baú onde estão os brinquedos ou as desbotadas orelhas de Hamm e as manchas no tecido de Lotsu.
Figurando nos melhores do ano com regularidade, mais uma vez a Pixar abocanhou o topo e Toy Story 3, além de ser o melhor filme do ano até agora, é também a melhor animação já produzida da Pixar que, independentemente da técnica empregada, ensina que a qualidade de uma história reside nos personagens e na capacidade da narrativa de envolver o espectador naquele mundo. Assim, sem cometer injustiça alguma, não há termo melhor para descrever a animação com o adjetivo obra-prima.
Avaliação: 5 estrelas em 5.
Crítico de cinema filiado a Critics Choice Association, à Associação Brasileira de Críticos de Cinema, a Online Film Critics Society e a Fipresci. Atuou no júri da 39ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo/SP, do 12º Fest Aruana em João Pessoa/PB, do 24º Tallinn Black Nights Film na Estônia, do 47º TIFF – Festival Internacional de Cinema em Toronto. Ministrante do Laboratório de Crítica Cinematográfica na 1ª Mostra Internacional de Cinema em São Luís (MA) e Professor Convidado do Curso Técnico em Cinema do Instituto Estadual do Maranhão (IEMA), na disciplina Crítica Cinematográfica. Concluiu o curso de Filmmaking da New York Film Academy, no Rio de Janeiro (RJ) em 2013. Participou como co-autor dos livros 100 melhores filmes brasileiros (Letramento, 2016), Documentário brasileiro: 100 filmes essenciais (Letramento, 2017) e Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais (Letramento, 2018). Criou o Cinema com Crítica em fevereiro de 2010 e o Clube do Crítico em junho de 2020.
2 comentários em “Crítica | Toy Story 3”
Nunca concordei tanto com uma crítica sua como esta! Toy Story 3 é perfeito. (Lindo)^oo
Sem mais!!!
Também achei legal o "Tó, estoure 3"