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O Pacto

(Seeking Justice), Estados Unidos, 2011. Direção: Roger Donaldson. Roteiro: Robert Tannen. Elenco: Nicolas Cage, January Jones, Guy Pearce, Jennifer Carpenter, Harold Perrineau, Xander Berkeley, Joe Chrest, David Jensen. Duração: 105 minutos.



Coloque-se nos sapatos do professor de inglês Will Gerard: você é um sujeito feliz e pacato, casado com a January Jones que, em um certo dia, descobre que ela fora vítima de um estuprador que a deixou hospitalizada com enormes hematomas e lacerações no rosto inteiro. Enquanto pensamentos de vingança ruminam na sua cabeça, você recebe a visita do misterioso Simon, oferecendo não apenas condolências, mas também a ‘solução’ do problema (leia-se: a morte do estuprador) em troca de um favor no futuro. Roteiristas e/ou diretores inteligentes poderiam transformar essa premissa em um estudo interessante sobre a moral e a violência gratuita descabidamente perpetuada nas grandes cidades. Porém, não é o que acontece com ‘O Pacto’!



Substituindo conflitos éticos por uma historinha de ação pretensiosa e derivada, o roteiro de Robert Tannen apresenta uma organização secreta de vigilantes cujo objetivo é limpar as ruas de Nova Orleans de assassinos, estupradores, molestadores de crianças e outros bandidos, utilizando cidadãos vítimas de grave violência para praticar esses crimes. Parece uma espécie de ‘corrente do mal’, conceitualmente prejudicada ao descobrirmos que os cidadãos usados pela organização são prontamente descartados (‘suicidados’ é o termo adequado), o que causa estranheza ao descobrirmos os métodos usados pelos agentes para se livrar do homem-comum: tiros em uma movimentada avenida ou bater na traseira de um veículo para empurrá-lo de grande altura.


Entretanto, situações absurdas e estúpidas não são raras no roteiro, o que me leva a questionar a (falta) de inteligência de Robert Tannen. Obrigando o incauto herói a ratificar seu aceite através da compra de duas barras de chocolate em uma máquina de venda automática e o levando a postar uma carta para papai noel no zoológico, os homens por trás da organização secreta soam mais preocupados em deixar mensagens no quadro-negro ou na geladeira do que amarrar as pontas deixadas soltas. Com meia dúzia de coincidências (o menor dos males) e uma reviravolta chinfrim envolvendo um coadjuvante, Tannen também demonstra desconhecer os procedimentos policiais mais básicos, mantendo intacto o cubículo de um jornalista supostamente assassinado. Falta, inclusive, bom senso e verossimilhança, na fuga de Will da delegacia ou no crachá que permanece operacional mesmo depois do óbito de seu titular.


Sem o menor esforço de mascarar essas grosseiras bobagens do roteiro no ritmo tenso e paranoico de boas perseguições, a direção de Roger Donaldson (dos ótimos ‘Efeito Dominó’ e ‘Treze Dias que Abalaram o Mundo’) é despersonalizada, burocrática e apática, desprovida dos menores vestígios de inspiração e criatividade. Falhando em estabelecer o desejável clima de insegurança e tensão, a cena em que Will se vê obrigado a cruzar uma movimentada avenida para fugir de agentes da organização, de tão mal decupada e grosseiramente truncada, surge muito mais como uma paródia de ‘Os Picaretas’ (aquele com Steve Martin onde Eddie Murphy interpretava dois personagens) do que extraída de um filme de ação. Mais, se considerarmos a abundância de ângulos baixos, zooms desconfortáveis e planos inclinados despropositados, é fácil observar um panorama generalizado do clima de desmotivação que deve ter assolado a produção…


Exceto Nicolas Cage, claro! Desde 2006, protagonizando com mais frequência 3 ou 4 bobagens anuais (acho que dez títulos bastam para fundamentar o argumento: ‘World Trade Center’, ‘O Sacrifício’, ‘Motoqueiro Fantasma’ e sua continuação, ‘O Vidente’, ‘Perigo em Bangkok’, ‘O Aprendiz de Feiticeiro’, ‘Caça às Bruxas’, ‘Fúria sobre Rodas’ e ‘Reféns’), o ator está mais discreto do que habitualmente, embora insista em irritantes tiques de atuação, como o leve apertar do osso do nariz, o franzir de testa constante e o balbuciar. Soltando-se no baile de máscaras, declamando Shakespeare ou derrotado no jogo de xadrez por “não se arriscar”, o ator mal consegue adotar um tom uniforme na interpretação, variando de ingênuo aborrecido, atormentado arrependido e herói de ação na mesma cena (um feito, eu diria!). Insatisfeito em destruir sua carreira, Nic Cage arrasta consigo os (fracos) talentos de Guy Pearce, January Jones (mas sua beleza compensa), Harold Perrineau (o Michael de ‘Lost’) e Jennifer Carpenter (que não consegue sequer deixar o figurino da irmã do ‘Dexter’).


Trivial nos demais departamentos, como a fotografia desinteressante de David Tattersall e a trilha sonora padrão de J. Peter Robinson, a montagem de Jay Cassidy consegue ser desastrosa na elipse de ‘6 meses depois’ e na transição do vômito de Will para a imagem de um zelador limpando o chão, atingindo o fundo do poço no ‘clímax’ da narrativa e seus rápidos cortes secos.


Não tão ruim quanto os últimos filmes de Nic Cage, mas atingindo um nível de mediocridade alarmante, ‘O Pacto’ é um pseudo-thriller policial inferior a muitos congêneres esquecidos nas prateleiras das locadoras. Seria o destino mais adequado, digo, no mundo perfeito cinéfilo.

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13 comentários em “O Pacto”

  1. Algumas bobagens da vida não deveriam existir, é o caso de você como critico de cinema, assim como um sem numero de pessoas, gostei do filme, não é uma maravilha, mas é melhor do muitos que você elogiou, faça um favor a si mesmo, vá trabalhar na feira vendendo abobrinha que se identifica mais com você, pois como crítico meu amigo você é um merda…
    Ps:Voce citou Motoqueiro fantasma como ruim,???, é um dos melhores filmes dele, e o 2 então,não é a toa que é o mais visto nos estados unidos, me poupe com sua ignorância…

  2. Antes de tudo, recomendo informar-se melhor.

    Motoqueiro Fantasma 2 foi uma moderada decepção nas bilheterias, estreando há 4 semanas atrás em 3o lugar nas bilheterias e, atualmente na 14a posição. A bilheteria total é de $48 milhões de dólares, menos da metade que o original arrecadou ($ 115 milhões). Estamos, evidentemente, falando somente dos Estados Unidos neste caso.

    Tendo custado quase $60 milhões de dólares e, baseado nas estimativas de que um filme tem que arrecadar aproximadamente 3 vezes mais do que o seu orçamento para lucrar, Motoqueiro Fantasma 2 está no vermelho/amarelo, mundialmente tendo alcançado $105 milhões.

    Em resumo: além de usar um argumento tolo, o de que bilheteria é sinônimo de qualidade de cinema, você ainda o usou de maneira equivocada e desinformada.

    De todo modo, obrigado pela visita, comentário e participação.

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