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O Espetacular Homem-Aranha

The Amazing Spider-Man. Estados Unidos, 2012. Direção: Marc Webb. Roteiro: James Vanderbilt, Alvin Sargent e Steve Kloves. Elenco: Andrew Garfield, Emma Stone, Rhys Ifans, Denis Leary, Martin Sheen, Sally Field, Irrfan Khan, Campbell Scott, Embeth Davidtz e Chris Zylka. Duração: 136 minutos.

O tempo é um bom termômetro para grandes filmes e depois de assistir ao reinício da franquia do herói mais popular do universo Marvel, não é difícil concluir que a adaptação de Sam Raimi de 2002 tornou-se um clássico do gênero. Não que O Espetacular Homem-Aranha seja ruim, pelo contrário, é um trabalho consistente, satisfatório e ocasionalmente empolgante, reapresentando um personagem que mal tínhamos nos despedido apropriadamente em um novo rosto, mas com dramas praticamente idênticos. E este é o seu grande defeito: qual o sentido de revisitar a história daquele jovem inseguro tão bem estabelecido antes se nada realmente novo é servido juntamente na bandeja? Mas, fiz uma promessa de que o propósito desta crítica não seria o de estabelecer comparações entre os dois filmes, apesar desta ser uma ideia tentadora; então, tendo apagado temporariamente da memória a trilogia anterior, o filme de Marc Webb (dono do sobrenome mais adequado possível) tem charme e personalidade suficientes.

Ambientado em uma Nova York opressiva e escura, o que se reflete nas cores azul e vermelha do uniforme menos vivas do que de costume, o roteiro escrito a seis mãos explora uma lacuna desconhecida na vida de Peter Parker: o destino dos seus pais. Assim, ao encontrarmos um garotinho brincando de esconde-esconde e encontrando o escritório de seu pai, Richard Parker, revirado por invasores em busca de arquivos secretos, existe a intenção de estabelecer um contexto de conspiração razoavelmente bem realizado. Alguns anos mais tarde, habitando com os tios Ben e May, acidentalmente Parker encontra a pasta do seu pai e descobre uma foto dele junto ao idealista cientista Curtis Connors, especialista em répteis, e que sonha em curar deformidades a partir do cruzamento inter-espécies. Até que, mordido por uma aranha geneticamente modificada no laboratório, Peter desenvolve habilidades aracnídeas, como a capacidade de escalar paredes, superforça e um sexto sentido invejável.

Peter, porém, é apenas um adolescente tentando atravessar o último ano do colegial desapercebido. Não nerd como alguém poderia esperar, ele posa de herói ao ver o valentão Flash Thompson humilhando um colega e se envolve com a cativante e espirituosa Gwen Stacy, de encontro ao esteriótipo da mocinha em perigo. Assim, é natural que seus superpoderes sejam usados de forma imatura, como na demonstração de virilidade na quadra de basquete, ou para interesses egoísticos, na busca do assassino de um parente. Ser herói não passa na sua cabeça até descobrir ser responsável, indiretamente, pelo surgimento da grotesca criatura reptiliana que ameaça as ruas de Nova York: o Lagarto, monstruoso alter-ego do Dr. Connors que usara o soro não testado em si mesmo. Embalando-se entre arranha- céus e visto com desconfiança ou mesmo como um ameaça por muitos, o herói parte na busca de uma cura enquanto tenta manter a salvo os habitantes da cidade.

Aproveitando a primeira metade para construir a personalidade de Peter , Marc Webb é sensível em ilustrar a amargurada existência do jovem no meio do caloroso lar e os lampejos de alegria, como aquele após o olhar sobre o ombro de Gwen, parecem momentaneamente capazes de suprimir o vazio sentido. Por outro lado, a direção é desastrada no surgimento do Homem-Aranha: subitamente Peter costura o uniforme, adapta os lançadores de teia (a opção destas serem orgânicas, embora infiel aos quadrinhos, fazia mais sentido) e domina as habilidades de se dependurar nos prédios, escalar paredes e lutar de forma graciosa e irritando os adversários. Tudo isto ocorre bruscamente, mesmo que a extensa duração permitisse ao cineasta se esforçar mais e evitar soluções preguiçosas e, num certo momento, ninguém mais estranha a mudança no comportamento de Peter e seus machucados frequentes.

De forma similar, ao mergulhar na obrigatória ação, a narrativa também alterna altos e baixos. A câmera acompanha incessantemente os movimentos do Homem-Aranha subindo pelas paredes, esgueirando-se por estreitas aberturas e se balançando por entre prédios, as lutas têm energia e bom humor suficiente para se sustentarem e a ênfase pontual no terror é oportuna. Contudo, o excessivo desleixo com a identidade secreta do herói e o óbvio desenrolar dos planos do Lagarto (um dispositivo é apresentado no meio da narrativa apenas para isto) sequer disfarçam a falta de inventividade do roteiro: além de sugerir o exército reptiliano jamais utilizado, ele, deselegantemente, pega emprestado sequências inteiras, como a destruição do banheiro fruto do descontrole da superforça (nem a boa gag do teclado do computador exime este grosseiro copiar-e-colar).

Entretanto, o elemento humano prepondera no saldo final positivo: Andrew Garfield é convincente no papel-título, apresentando um jovem calejado que poderíamos tomar por nosso vizinho. Mas, embora ele tenha que carregar a responsabilidade da narrativa, é Emma Stone quem se destaca e Gwen Stacy transborda de carisma e energia logo que surge em cena, tornando fácil se apaixonar por esta geek de olhos grandes e sorriso encantador. Por sua vez, Rhys Ifans (lembra-se dele como o amigo estranho de Hugh Grant em Um Lugar Chamado Notting Hill?) transforma Curtis Connors em um cientista bem intencionado e ético que, assim que é transformado no Lagarto, sucumbe a um complexo de Dr. Jekyll e Mr. Hide. O resto do elenco composto de atores conhecidos, como Martin Sheen, Sally Field e Denis Leary, está correto e tem bons momentos. Aliás, observe o sinal dos tempos : até Flash, interpretado por Chris Zylka, que poderia ser apenas um brucutu unidimensional, é apropriadamente humanizado em um instante de sensibilidade.

Com uma linguagem narrativa padrão, a montagem é eficiente na elipse encerrada no reflexo de Peter Parker e no raccord da torre Oscorp que salta da tela do computador à imponência no centro da cidade. Já a direção de arte enfatiza, as vezes exageradamente, a genialidade do herói: o pôster de Einstein divide espaço no apertado quarto com um cubo mágico resolvido e a trava da porta eletronicamente desenvolvida. Por sua vez, o laboratório da Oscorp revela-se impessoal, mas funcional, diferindo do escritório de Curtis Connors, mais humano, apesar da dimensão monstruosa que este viria a assumir.

Deixando portas abertas para a anunciada trilogia (espere a sequência durante os créditos finais), Marc Webb é covarde ao ensaiar a quebra de uma promessa logo após esta ser realizada e recorde a ousadia de Sam Raimi que evitou derrapar no mesmo quesito no seu Homem-Aranha . E, se até aqui consegui evitar comparações, não posso deixar de destacar que O Espetacular Homem-Aranha perde para o irmão mais velho, embora a perspectiva de novas aventuras do aracnídeo não mais na colorida Nova York, mas nessaa claustrofóbica selva urbana, seja interessante e empolgante.

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19 comentários em “O Espetacular Homem-Aranha”

  1. O Espetacular Homem-Aranha foi, pra mim, uma verdadeira decepção. Nossos textos tem muito em comum – embora discordemos pontualmente (e isto ficará evidente se ler o que escrevi). Infelizmente, não achei espaço para comentar essa falha realmente brusca da não efetivação do exército de lagartos – o que seria muito interessante, por sinal. Na verdade, espero que tirem Marc Webb da direção. CAMPANHA: VOLTA SAM RAIMI!

  2. Bacana tu não se prender nas associações de forma gritante, Márcio. As vezes, nem eu consigo fazer isso (algo que fiz quando avaliei X-men: first class). Acho que sem o de Raimi como parâmetro, o de Webb é um belo filme, tem suas falhas, mas é um belo filme. A química entre os dois protagonistas, a relação deles e os atores são muito bons. Já é de aplaudir o fato de Gwen não ser uma "vagabunda interesseira" (perdoem o palavreado), como geralmente esse tipo de personagem é tratada em filmes de herói.

    Abração!

  3. Começo a ficar curioso em relação ao filme, à medida que leio críticas como a sua, sóbrias, que destacam tanto os lados positivos quanto negativos do filme. Reconheço os problemas que a trilogia anterior teve, inclusive o desastre que foi o terceiro filme, no entanto ela já bastava por si só como narrativa do nascimento do personagem. O primeiro filme de Sam Raimi foi sem dúvidas um marco e o segundo é na minha opinião um dos melhores do gênero (só perdendo para "Batman o Cavaleiro das Trevas") e é por isso que não vejo um porquê que embase a decisão de se fazer este reboot. Conferirei, quando possível, mas apenas por desencargo de consciência…

  4. Os filmes de Sam Raimi são um LIXO pois mataram tudo que havia de cativante no Peter Parker. Todo o senso de humor, toda a genialidade do protagonista simplesmente inexiste nesses três filmes! Peter não é só um garoto que foi picado por uma aranha e ganhou poderes. Ganhar poderes temos mil heróis por ai ganhando. O que o torna único é o seu senso de humor, sua inventividade, seu gênio indomado! Nos quadrinhos a genialidade de Peter não deixa nada a dever a de Tony Stark por exemplo.
    Além disso o Homem-Aranha é o único herói que se ferra de verdade, que leva ferro, se machuca e que as coisas de fato dão errado. Nos filmes de Sam nada disso acontece! Temos um herói mascarado perfeitinho! Que não tira sarro dos inimigos, que não cria seus lançadores de teia, que não erra num salto e dá de cara com um ônibus!
    O filme do Sam Raimi pode ser um ótimo filme sobre um super heroi qualquer mas é bem distante da personalidade cativante que tornou o cabeça-de-teia o herói mais querido da Marvel!

  5. Não concordo completamente Lucas. Bem, no cinema é muito mais crível que o Homem-Aranha tivesse teias orgânicas do que usar lançadores de teia que exigiriam preciosos minutos que poderia ser investidos no desenvolvimento do personagem.

    Afora esse detalhe, o Homem-Aranha do Sam Raimi apanha pra caramba, tem problemas financeiros (o do Marc Webb não tem), encara uma depressão, precisa praticar bastante para ter pleno domínio dos seus poderes (novamente, o que o do Marc Webb não precisa), cria seu próprio uniforme, precisa espremer 7 dólares para pagar um lanche para a namorada Mary Jane, tudo isso. Mais humano impossível Lucas.

    Até que o senso de humor ficou devendo, mais principalmente no primeiro filme do que no segundo do Dr. Octopus, mas em resumo o do Sam Raimi é bem completo e redondo como estudo de personagem.

  6. Cara, acho esse argumento péssimo. Dizer que o filme é ruim simplesmente por ser diferente do material original. Assim como eu não acho que ser mais fiel ao original automaticamente torna o filme bom. Já é mais do que hora do pessoal aprender a separar as coisas. Adoro os quadrinhos do Homem-Aranha e também adoro os dois primeiros filmes do Sam Raimi. Ainda não vi O Espetacular Homem-Aranha então me abstenho de qualquer comparação.

  7. Confesso que sou fâ da franquia, mas o terceiro filme deixou um pouco a desejar, em comparação aos dois primeiros, que para mim foram um dos melhores filmes de super héroi. Tenho a impressão que o filme será muito bom, e próxima semana o verei com certeza.
    Ótimo texto!
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