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Crítica | Piratas do Caribe: A Vingança de Salazar

Piratas do Caribe: A Vingança de Salazar

129 minutos

Sou fiel aos filmes que amo e guardo, com carinho no coração, minha primeira memória do pirata Jack Sparrow enquanto este pairava, altivamente, sobre o mastro de um navio, apenas para, no corte seguinte, descobrirmos tratar-se de uma embarcação tripulada por um homem só, naufragando a olhos vistos até atingir, milimetricamente, a altura do convés, em direção ao qual Jack caminha de modo tão seguro e despreocupado que é fácil inferir que momentos como aquele são uma constante na vida daquele homem folclórico. Porém, desde 2003, quando A Maldição do Pérola Negra zarpou em direção ao sucesso esmagador e Johnny Depp, a sua primeira indicação ao Oscar, passaram-se 14 anos e o que restou em A Vingança de Salazar, quinta entrada da série, é somente a pálida tentativa de resgatar os tempos de glórias idos que não voltam mais.

É também a frustrada oportunidade de Johnny Depp restaurar a fama abalada por acusações de violência doméstica e por um ostracismo criativo duradouro, e é curioso como a franquia é um termômetro interessante para analisar o auge e o declínio deste ator outrora interessante, mas dado a péssimas decisões. Pois, apesar de performances respeitáveis em Edward Mãos de Tesoura, Ed Wood, Donnie Brasco ou Profissão de Risco, todos ótimos filmes, somente com Jack Sparow o ator alcançou o topo da pirâmide em Hollywood, tornando-se um dos nomes mais bancáveis ainda que a frente de produções ruins (A Fantástica Fábrica de Chocolate ou Alice no País das Maravilhas que o digam) que compartilhavam outro aspecto: a errônea ideia de que quanto mais esquisito fosse o personagem mais completo este seria, e quanto mais o ator embarcava nesta ideia furada, pior seu desempenho em cena.

Neste quinto episódio, escrito por Jeff Nathanson (de Velocidade Máxima 2 e A Hora do Rush 2 e 3) a partir do esboço de Terry Rossio (roteirista da franquia), Jack Sparrow alia-se a Henry Turner (Thwaites) e Carina Smyth (Scodelario) na busca do lendário Tridente de Poseidon, artefato que tem o poder de acabar com as maldições dos oceanos, dentre elas a do capitão espanhol Salazar (Bardem), condenado a uma embarcação fantasma por causa de Jack, de quem deseja se vingar. No meio do caminho, Barbossa (Rush) ora auxilia Salazar, ora Jack, de acordo com suas prioridades e consulta uma feiticeira cuja motivação é incerta para afirmar o mínimo. No encalço deles, a marinha britânica liderada pelo Almirante Scarfield (Wenham), também interessado no poder do Tridente. Tantos personagens resultam na constatação de que não chance de eles serem mais do que meras caricaturas de figuras passadas: Henry faz as vezes de Will Turner ao passo que Carina, de Elizabeth Swan, enquanto Scarfield almeja, sem sucesso, ser um oponente à altura do que fora o almirante Norrington. Nem Jack ou Barbossa escapam de serem reflexos de quem outrora foram, e se a este é dado ao menos um instante dramático ancorado, exclusivamente, nos episódios passados, àquele resta apenas a sobra dos espólios, aqui entendida como eventuais instantes cômicos (a dica que dá a Henry sobre cortejar mulheres é a minha cena favorita).

Não me entenda errado, Jack Sparrow permanece fascinante pela imprevisibilidade com que lida com as adversidades, sem deixar de contar com a sorte e a astúcia, porém resta fadado à repetição. E ao escutar a pergunta retórica “Alguém poderia me explicar por que estou aqui?”, alguém poderia questionar-se se, de fato, isto não se aplica ao próprio Johnny Depp. Enquanto isso, Javier Bardem empresta seu talento a Salazar, embora o ator seja refém de efeitos especiais excelentes – nada além da obrigação de uma superprodução que custou 250 milhões de dólares – e da motivação rasteira do personagem. Ainda assim, o andar decrépito e encurvado aliado à dicção pausada conferem ao vilão ao mesmo um ar ameaçador, algo que o vilão anterior, Barba Negra, sequer tinha.

E apesar de não ser justo comparar este com Navegando em Águas Misteriosas, de longe o pior da série, também não o é com o original e O Baú da Morte: não há, por exemplo, grandes set-pieces de ação, como o ataque do Kraken e a luta de espadas sobre uma roda em movimento, ao passo que, sempre que podem, os diretores noruegueses Joachim Rønning e Espen Sandberg reciclam dramas e sequências de episódios passados, chegando ao cúmulo de reproduzir a fuga de Jack da guilhotina de modo bastante semelhante à… fuga de Jack da forca. A propósito, em determinado grau, Salazar é apenas a versão fantasmagórica do amaldiçoada Barbossa, tanto em propósito quanto no desenlace narrativo; aliás, soa como uma trapaça do roteiro a habilidade que Salazar demonstra no terço final e não utilizara até então, mesmo que ela pudesse ser útil para capturar Jack em terra firme.

Mais escura do que o habitual, a fotografia de Paul Cameron prejudica quem encarará a versão 3D – os óculos enegrecem ainda mais o quadro –; por sua vez, a trilha sonora de Geoff Zanelli restringe-se a reutilizar o tema de Hans Zimmer, que continua sendo um dos melhores do cinema de aventura de tempos recentes. Por fim, o design de produção de Nigel Phelps é digno de prêmios por atribuir identidade a cada navio, especialmente o formato ‘centopéico’ do de Salazar, mas especialmente pela ilha que traz sobre o solo acidentado o reflexo perfeito do céu estrelado.

Uma moldura bonita, é verdade, para uma produção que deveria estar ao lado do verbete medíocre.

P.S.: Após os créditos, há uma cena adicional contraditória, sobretudo se considerarmos o que ocorreu no terceiro filme da série e os eventos do filme deste.


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