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A Son of Man – La maldición del tesoro de Atahualpa

A Son of Man – La maldición del tesoro de Atahualpa

90 minutos

Enquanto debatia com colegas na sala de imprensa a respeito desta produção que havíamos assistido, mas não digerido satisfatoriamente, chegamos à conclusão de que existe um fanfic muitíssimo bem elaborado em torno da figura, já mítica, do co-diretor e protagonista, o tal Jamaicanoproblem. O pseudônimo de Luis Felipe Fernandez-Salvador y Campodonico (será?) é somente a cortina de fumaça em torno desta aventura que representou o Equador no Oscar do ano passado, alegadamente uma história verídica com personagens reais interpretando eles próprios.

A trama inicia após Pipe (Bolona) receber uma carta do Pai (Campodonico) com quem não se relaciona desde sempre, convidando-o a retornar ao Equador a fim de encontrar o ouro perdido do último Sapa Inca (o título dado ao Imperador) Atahualpa. A lenda conta que os incas haviam negociado com os espanhóis o resgate em ouro de seu líder, mas sua execução antecedeu a negociação, e o prêmio, em represália, restou enterrado em lugar desconhecido. O Pai, em memória de seu progenitor e deste ante dele, resolve que Pipe é quem descobrirá a pista final ao tesouro estimado em 7 bilhões de dólares, desbravando a floresta amazônica equatoriana e sobrevivendo às intempéries postas em seu caminho.

Poderia ser uma aventura despretensiosa, inspirada nas vividas por Indiana Jones e na busca cinematográfica ao El Dorado e à Cidade Perdida de Z, ou uma farsa divertida como a cena inicial sugeriria, em que o Pai aparece como a versão latina Jack Sparrow (de Piratas do Caribes), a bordo do barco denominado Presente de Deus e ao som de uma música circense que ridiculariza a pretensão de seu incauto explorador. Contudo, a arrogância dos diretores – mais de Jamaicanoproblem do que de Pablo Agüero – termina por condenar esta produção ao esquecimento ou, quando não, a ser rememorada como cult caso consiga penetrar dentro do mercado de exibição norte-americano e lá construa seu público.

Desde o princípio, a direção mal disfarça não entender ao certo que tipo de narrativa deseja contar, entulhando-a com conceitos e sequências que parecem irresistíveis, isoladamente, mas não funcionam dentro do todo. Assim, quando a câmera se aproxima do vitral da igreja e descobrimos Donald Trump, como anjo / santo, condenando ao submundo Che Guevara, como demônio / serpente, apesar de apreciarmos a ironia da arte, esta não encaixa na narrativa que debate temas conhecidos (obsessão, ganância) como camada da relação pai e filho em seu núcleo. Noutro momento, após um Padre benzer a expedição que os levaria ao coração da floresta, a narrativa corta para uma sequência debaixo do filtro infernal avermelhado e uma música heavy metal, elaborando um contraste que funcionaria melhor caso a narrativa abraçasse o caráter absurdo.

A minha percepção era a de Pipe: ‘naquele momento, eu realmente não entendia nada’. Um exemplo disto são as camisetas estampadas empregadas por certos membros da expedição e pelo Pai, que parecem haver sido escolhidas pela figurinista por serem chamativas, não por ajudarem a narrar a história. E o que comentar a respeito do momento em que a esposa Lily (Ghemen) está deitada sobre sua boia cor-de-rosa no formato de flamingo, logo após uma referência gratuita a “O Poderoso Chefão” (a cabeça do cavalo), enquanto a trilha reproduz a versão clássica de Mr. Sandman? A aleatoriedade deste momento apenas rivaliza com o fato de que nada nele contribui para a narrativa.

Entretanto, seria injusto caso não elogiasse o excelente trabalho de fotografia de Benjamín Echazarreta. Com o emprego recorrente de drones que percorrem com fluidez as locações escolhidas com esmero, o espectador viaja ao interior do cenário inóspito como se estivesse na companhia dos personagens e dos perigos (inexistentes) de sua jornada quixotesca. E se considerarmos que a resolução da tecnologia tende a ser inferior quando comparada com a filmagem tradicional, o produto final é mais impressionante porque não percebemos haver a perda na textura de imagem.

A montagem de Thomas Fernandez é competente, em particular quando não tenta forçar transições, como acontece no início da narrativa, para se concentrar em conservar o ritmo mais correspondente à pegada labiríntica da narrativa. O problema é que esta não lhe ajuda, e o roteiro corta personagens de modo abrupto, ainda que premeditado, e salta rumo a conclusões, eventos e revelações insatisfatórias, como a do Pai a Pipe. E o fato de este participar mais da trama como o narrador, não como ator, prejudica sua essência, que seria a de retratar como um pai guia o filho até certo ponto da vida até começar a ser guiado por este.

Ou talvez eu esteja tentando procurar sentido neste desastre narrativo.

Publicação escrita durante a cobertura do 47º Festival de Gramado

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