O bromance entre hospedeiro e simbionte é o verdadeiro protagonista
Por Alvaro Goulart
“Quando você entra no coração de um amigo, não importa em que lugar você ocupa, o importante é que você nunca o deixe”, disse Dom Quixote.
Sendo a simbiose uma relação de interação entre dois organismos, podemos dizer que é uma espécie de amizade em um nível mais elevado. Apesar do subtítulo do filme ser “Tempo de Carnificina”, o que mais possui tempo de tela é o “bromance” entre Venom e Eddie Brock.
A história se desenvolve com Eddie Brock (Tom Hardy) interagindo com o sociopata Cletus Kasady (Woody Harrelson) para auxiliar o Detetive Patrick Mulligan (Stephen Graham) enquanto acompanhamos a convivência entre o protetor letal e seu hospedeiro. Nessa continuação, o tom áspero do anti-herói é deixado de lado, dando goles maiores da fórmula do MCU ao incorporar mais comédia para o filme.
Se o filme de estreia foi questionado por se levar demais a sério, agora o alívio cômico domina as cenas. O “bromance” é bem explorado. As “DR’s” são bem engraçadas, assim como o apartamento destruído durante a briga e a criação de galinhas – tudo seria bastante questionável fora daquela diegese.
O antagonista, apesar de muito bem vivido por Woody Harrelson, não teve o devido tempo para entregar sua crueldade sádica, conhecida das páginas dos quadrinhos. É contada a pilhagem de corpos em sua trajetória e a abominação de seus atos, mas tudo é entregue de forma muito superficial, inclusive a origem de seus traumas – uma tentativa falha de trazer o mínimo de humanidade para um personagem que claramente não precisava dela.
As cenas mais intensas de Venom – Tempo de Carnificina antecedem o nascimento do monstro vermelho. Existe um terror inerente nas interações de Brock e Kasady, principalmente por esses momentos remeterem aos diálogos da agente Sterling com Hannibal Lecter, em O Silêncio dos Inocentes.
Trazer Frances Barreson, ou Shriek (Naomie Harris) para a narrativa já foi uma decisão inteligente. A vilã, apesar de desconhecida para o público que não consome os quadrinhos, trouxe um propósito maior para Kasady, além de um conflito interessante com seu simbionte. A presença do Detetive Patrick Mulligan desperta curiosidade, já que o personagem nos quadrinhos é o hospedeiro de um último simbionte: Toxic.
O “tempo de carnificina” ficou apenas para o nome. Era esperada uma maior violência dado o antagonista, mas a mesma foi diluída para a censura do filme. O tom de comédia também é responsável por intensificar essa lacuna. Mesmo deixando o filme num formato mais palatável, o resultado final é um tanto desequilibrado.

JORNALISTA E PUBLICITÁRIO. Cresceu no ambiente da videolocadora de bairro, onde teve seu primeiro emprego. Ávido colecionador de mídia física, reune mais de 3 mil títulos na sua coleção. Já participou de produções audiovisuais independentes, na captura de som e na produção de trilha musical. Hoje, escreve críticas de filmes pro site do Cinema com Crítica e é responsável pela editoração das apostilas do Clube do Crítico. Em 2025, criou seu perfil, Cria de Locadora, para comentar cinema em diversos formatos.