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The Son

The Son

123 minutos

Hugh Jackman e Laura Dern tentam lidar com a depressão do filho adolescente no drama do diretor de Meu Pai

O dramaturgo Florian Zeller tem um universo teatral no ambiente familiar: The Mother (2010), a mãe; The Father (2012), adaptado nos filmes A Viagem de Meu Pai (2015) e Meu Pai (2020), que rendeu o Oscar de Melhor Ator a Anthony Hopkins; e a mais recente The Son (2018), o filho, adaptado neste drama. Se em Meu Pai o diretor explorou a deterioração da mente e do eu causada pela doença de Alzheimer, em The Son aborda a depressão profunda, com tendência mutilatória e suicida, do jovem Nicholas (Zen McGrath), o filho do casal divorciado Peter (Hugh Jackman) e Kate (Laura Dern), abalado após o casamento do com Beth (Vanessa Kirby, de Pieces of a Woman). 

The Son é devastador de maneira diferente do que foi Meu Pai, ainda que menos eficiente na manipulação da emoção do espectador. Se neste último, era o produto da percepção equivocada dos acontecimentos narrados a partir do ponto de vista não confiável do homem interpretado por Anthony Hopkins, em The Son a manipulação é sujeita à cegueira causada pela intensidade trabalhista e emocional do mundo contemporâneo que incapacita os pais e a madrasta de perceber o sofrimento extremo de Nicholas. O roteiro inicia com o pedido de Nicholas para morar com o pai, atendido pela mãe e aceito, com algumas ressalvas, pela madrasta, a dias de dar à luz a seu filho. O desejo dele é de estabelecer contato com Peter, embora este trabalhe o dia inteiro e viaje com frequência à Washington, para trabalhar na campanha de um Senador. 

Diferente de Meu Pai, em que o design de produção desempenha um papel central na criação, desconstrução e recriação do olhar e da percepção do protagonista e do público do universo diegético, o de The Son é pragmático, realista e até certo modo acolhedor. Não é a externalidade que provoca a depressão de Nicholas, é o que habita dentro dele e, às vezes, mal consegue traduzir em palavras. Além de gazear colégio para perambular pela cidade e de se machucar para sentir algo concreto na pele – alertas vermelho para que a família tome providências -, Nicholas aprende a falar mentiras que julga que os pais desejam escutar e em que acreditam durante a maior parte do tempo. 

A racionalidade e autoconfiança de Peter – realçadas pela ótima atuação de Hugh Jackman – impossibilitam-no de perceber o instante em que deve agir, e, quando o faz, não sabe bem o que fazer e passa do ponto aceitável. A melhor intenção de Peter e o desejo genuíno de não repetir o erro do pai, uma participação breve, mas intensa de Anthony Hopkins, não são suficientes para consertar Nicholas, pois o filho não precisa de reparo, mas de acolhimento. Nicholas tenta. Muda-se de casa. Esforça-se em sorrir. Entretanto não basta para superar a angústia profunda. Não basta apenas terceirizar o tratamento com psiquiatra, Peter e Kate precisam aprender a conversar com o filho, mas é Beth a única autêntica e honesta com os sentimentos dela. 

A trama sabe para onde está dirigindo o espectador. A partir de certo instante, percebemos que o roteiro de Florian Zeller e Christopher Hampton só pode concluir a história da família de uma forma. Qualquer alternativa seria desleal com o investimento emocional do público, ainda que pudesse ser artificialmente gratificante. Desse modo, The Son é como a descarga ralo abaixo misturada com um conto de alerta, em que percebemos a tentativa dos pais e do filho, no que falham e a relação de alertas, para que não sejam repetidos os erros neste mundo real (além das telas de cinema). Isto atrapalhou a minha experiência, porque se o resultado é inevitável, então os 123 minutos apenas parecem uma contagem regressiva até que cheguemos lá, com relances esperançosos e felizes, a exemplo da cena da dança. 

Florian oferece aos atores momentos Oscar: o encontro no restaurante entre Peter e Kate e a forma sensível com que a ex-esposa relembra o casamento sem precisar de um flashback ilustrativo daquele momento (basta o olhar de Laura Dern) e a cena em que Peter está com o filho recém nascido no braço, objeto do sorriso discretíssimo de Vanessa Kirby. Contudo, se os atores veteranos estão irrepreensíveis, o mesmo não posso falar de Zen McGrath (dói citar isso). Às vezes, não sabia se a intenção da direção era que o adolescente fosse ou aparente manipulador ou se havia a inocência de quem não entende a origem da angústia extrema que sente e nem como conversar a respeito. Uma cena exemplifica é nas lágrimas, que parecem forçadas. E, se forçadas, foi intencional ou reflexo da má direção do ator? 

A simbologia de The Son também é óbvia: a máquina de lavar é o lembrete do sentimento turbulento de Nicholas, e a menção a certo dispositivo literário denominado a partir do poeta e escritor russo (se eu ficar, parece spoiler), enquanto o sibilo da chaleira em ebulição é tão evidente que não há como o interpretar de modo diverso. Aliás, óbvio ou não, é inegável o potencial dramático de The Son embora, diferentemente de Meu Pai, a forma de revelá-lo seja menos eficiente. 

The Son deverá estrear no Brasil em novembro deste ano.

Filme assistido no 47º Festival Internacional de Toronto.

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