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True Detective: Terra Noturna

3/5

True Detective: Night Country

2024

3/5

Diretor: Issa López

True Detective retorna uma década depois da temporada original

O primeiro trimestre de 2014 iniciou com uma das melhores séries contemporâneas, True Detective. Uma parte do mérito da série criada por Nic Pizzolatto inteiramente dirigida por Cary Joji Fukunaga (de Beasts of No Nation e 007: Sem Tempo para Morrer) foi alimentar o espectador com teorias quando a internet já havia virado um fórum para este tipo de discussão. Semanalmente, depois o episódio de domingo, eu entrava no Twitter para trocar ideia sobre os signos que haviam despertado a minha curiosidade. Era um sentimento de caça ao tesouro ligeiramente parecido com Lost.

Esse era o mérito imediato. A qualidade duradoura e por que a série sempre será lembrada foi a construção e desenvolvimento do relacionamento entre os detetives Rust Cohle (Matthew McConaughey) e Marty Hart (Woody Harrelson) em momentos de tempo diferentes. Rust e Marty eram personagens complementares, e Matthew e Woody ajudaram um ao outro a alcançar um andar elevado em termos de atuação. 

Dado o êxito de público e crítica, era evidente que a HBO tentaria repetir a fórmula. Não houve a mesma sinergia entre o trio Colin Farrell, Rachel McAdams e Taylor Kitsch em True Detective 2. Na continuação, Mahershala Ali permaneceu refém da tentativa de reviver e atualizar a estrutura temporal do original. O resultado foi só confuso em True Detective 3. Nem foram mistérios ruins ou mal explorados. Creio que haja até injustiça por parte da crítica e do público, resultado da inevitável comparação com as sensações proporcionadas pelo original.

Tudo para afirmar que True Detective 4 sofre do mesmo problema das temporadas anteriores. De muitas maneiras, esta é a temporada mais enxuta. São apenas 6 episódios, não mais 8 como nas demais. A investigação acontece em uma janela breve de tempo e, ainda que haja flashbacks, estão em uma cronologia linear. E o mistério é desvendado sem manter pontas desamarradas. Parece até um passo cauteloso para trás, uma menor ambição dramática, um maior imediatismo.

A quarta temporada acontece na cidade de Ennis, no Alasca, durante a noite polar. Nesta época, a cidade permanece meses sem luz solar, em uma noite fria e implacável. É neste cenário em que os cientistas de uma estação de pesquisa misteriosamente desaparecem. Depois, são encontrados congelados e nus, iguais a um picolé humano. Na cena do crime, a chefe de polícia Liz Danvers (Jodie Foster, que retorna à televisão após cinco décadas) e Evangeline Navarro (Kali Reis) encontram uma pista que retoma um caso investigado no passado. Um crime relacionado ao assassinato brutal de uma jovem que protestava contra uma empresa de mineração na região.

A mexicana Issa López dirige e roteiriza a temporada, conferindo-lhe maior unidade estilística e temática. Issa explora a temperatura extrema como aspecto dramático no contexto da investigação. Por exemplo, a nevasca auxilia no intuito de esconder os vestígios dos crimes cometidos. Já o clima hostil e inóspito amplifica os temas da narrativa, de que o ser humano explora uma natureza que deveria ser preservada e intocada. Enfim, a friaca ainda é uma metáfora de relacionamentos fragilizados, enquanto é irônica se comparada com a forma com que as detetives encontram os cientistas.

A série se perde na introdução de elementos espirituais e em um retorno à temporada original – a partir de um símbolo facilmente reconhecível e que injustificado senão em um aceno. A espiritualidade em si não é problemática. Contudo, é a forma como se manifesta na narrativa, como um atalho para encaminhar a história adiante. Ou para os momentos em que as personagens esbarram em um beco sem saída. Até acredito que a espiritualidade, na esperança de fortalecer um debate sobre os povos originários daquela região e reais proprietários do que o capitalismo predatório tenta tomar, enfraquece o envolvimento com o mistério causado pela mesma exploração.

A sensação é de que Liz e Navarro não são competentes para solucionar o mistério, então uma parte do trabalho é terceirizada a visões (ou alucinações). E o fato de eu não saber descrever a natureza desses fenômenos parece-me sugestivo de que Issa López permaneceu no morno, sem abraçar a fantasia, nem o realismo. É um meio termo contraditório, uma vez que a explicação pé no chão do mistério vai no sentido contrário à relação de Navarro consigo própria. A propósito, mesmo que a temporada original contivesse elementos macabros e místicos próprios do horror, esta temporada é a primeira a envolver o terror propriamente dito debaixo do tecido policialesco, burocrático e político do caso. É uma adição interessante, mas, do mesmo modo que a espiritualidade, não é explorada senão conveniente e pontualmente.

Essa superficialidade retorna em elementos dramáticos e humanos. É que, a esta altura, já sabemos que True Detective é menos sobre o mistério e mais sobre como alguns mistérios mudam a vida das pessoas que o investigam. É sobre como crimes impactam a vida daqueles que ousam encará-los. Neste sentido, a investigação de Liz, Navarro e do jovem Peter Prior (Finn Bennett, uma bem-vinda descoberta) abre feridas e obriga os personagens a lidar com o que escondiam debaixo da neve: Liz e o luto, Navarro e a ancestralidade ou Peter e o pai, o policial corrupto Hank Prior (John Hawkes).

Aí é onde True Detective destaca-se: as boas atuações e os temas sociais e humanos envolvidos. A condescendência do poder público com o abuso das corporações que dominam a economia, e a consequência aos povos originários e às mulheres submetidas a abusos, e como policiais íntegros praticarão justiça em uma cidade riscada do mapa da maioria das pessoas.

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