O 1º Festival de Cinema de Xerém estreou suas exibições com a Mostra Competitiva de Fluminense e Baixada de Curtas, contemplando produções independentes realizadas no espaço geográfico da cidade do Rio de Janeiro e/ou das cidades que compõem a baixada fluminense, ou por realizadores que residem nessa região.
A seguir, a ficha técnica dos quatro curtas-metragens que compuseram a mostra junto aos comentários sobre cada um deles:
CAXIENSE F.C
2021
20 minutos
Atores: João Gabriel, Jony Jarp, Marselha Mercedes, Lorre Motta, Vitor Senra
Gênero: Comédia
Roteiro: Marcos Gabriel Faria
De forma fluida, acompanhamos a jornada de um adolescente até a “peneira” de seu time de coração, o Caxiense Futebol Clube, um modesto time da baixada fluminense onde seu pai fora ídolo. Ainda que sua mãe lhe dê todas as instruções e orientações, ele se envolve nos mais diversos contratempos para chegar no local dos testes a tempo. Com uma linguagem lúdica e corporal, O diretor estreante Marcos Gabriel Faria remonta um pouco dos filmes de comédia clássica – Em especial O Enrascado, de Buster Keaton. Existe A dinâmica entre o policial que o persegue pelas ruas do centro de Duque de Caxias carrega consigo elementos de desenho animado, como Tom e Jerry e Pica-Pau. Isso se dá pela escolha de planos e a movimentação de ambos no quadro. Penso, inclusive, que agente de polícia foi inspirado no Leôncio, o antagonista bigodudo do pica-pau. Principalmente no plano detalhe evidenciando seus olhos ao fitar o jovem correndo.
Apesar de a leveza ser uma característica dessa produção, o diretor reforça temas reais como a violência policial contra corpos negros e a ausência da figura paterna (o pai, inclusive, está mais presente na narrativa em forma de retrato. Ainda quando se encontra com seu filho, seu rosto está cortado pelo teto do quadro – mesma forma na qual adultos são retratados em desenhos infantis). O diretor ainda permite uma ruptura da atmosfera fílmica ao colocar uma arma contra a câmera, colocando imediatamente o espectador no lugar daquele garoto. No fim, a vida real é bem diferente dos desenhos animados.
ELAS POR ELAS
2023
20 minutos
Direção: Renata Silva
Atores: Rose, Maria, Beatriz, Kamily, Barbara
Gênero: Documentário
Roteiro: Renata Silva
Cinco vivências femininas são transportadas para a tela. O que elas possuem em comum: a vulnerabilidade social, a violência doméstica, o abuso sexual e psicológico, a gravidez na adolescência, a fome e a evasão escolar.
Cinco mulheres da baixada fluminense tem suas histórias contadas diante de uma câmera. Histórias repletas de dor e luta. A câmera as acompanha e permite ouvir o lamento daquelas que tiveram suas perspectivas negligenciadas e suas histórias invisibilizadas pelo estigma social. Um documentário que, ainda que se estruture de forma convencional, se torna visceral pelos depoimentos que revela.
O curta recebeu os troféus Zeca Pagodinho de Melhor Direção, Melhor Roteiro e Melhor Montagem.
MINHA VIDA É UMA SÉRIE
2023
12 minutos
Direção: Taisa Alves
Atores: Taisa Alves, Maurício Lage, Paulo Moreira, Lucas Cruz
Gênero: Comédia
Roteiro: Taisa Alves
Após perder o emprego e o namorado, Stephanie entra em uma crise existencial e passa a acreditar que sua vida é uma sitcom. Com medo de desaparecer por desconfiar que a série de sua vida está prestes a ser cancela, ela decide mergulhar em um triangulo amoroso afim de alavancar a audiência.
Quem disse que o Show de Truman não poderia inspirar uma sitcom na baixada? Com um roteiro irônico e autoconsciente, “Minha Vida é uma Série” brinca com as estruturas clássicas desse subgênero da televisão como, por exemplo, as risadas de fundo. A criatividade durante a montagem e as técnicas de edição empregadas no curta também conseguem contornar a limitação de cenários e recursos. Dois pontos altos do curta são o tema musical de encerramento e o carisma do ator Maurício Lage, na pele do melhoramigo da protagonista.
O curta recebeu os troféus Zeca Pagodinho de Melhor Direção de Arte e Melhor Ator.
PASSARO MEMÓRIA
2023
15 minutos
Direção: Leonardo Martinelli
Atores: Ayla Gabriela, Henrique Bulhões
Gênero: Drama
Roteiro: Leonardo Martinelli
Lua, uma mulher trans, percorre a cidade maravilhosa em busca do seu pássaro chamado Memória que se esqueceu do caminho de volta para a casa. É interessante como Leonardo Martinelli nos oferece uma poesia através da imagem enquanto nos faz refletir sobre pertencimento, realidade e escapismo. A ironia já se encontra no nome do pássaro e seu possível esquecimento. Também podemos confabular acerca de Munin, o pássaro de Odin que representa a memória, e que retornava a seu dono para contar-lhe aquilo que observara em suas viagens. Mas, acima de tudo, podemos atribuir a esse pássaro de estimação a possibilidade de ser e voar livremente, assim como escolher por retornar ou não.
Ao contrário do pássaro, que por si só já representa liberdade, Lua se sente prisioneira do mundo ainda que transite por ele. Seu andar é pesado e receoso. Apenas quando a realidade é moldada para uma dimensão musical que seus movimentos ganham a suavidade de um balé. A dança permite com que ela não colida com os transeuntes que circulam na contramão. Ao contrário do que o conservadorismo sugere, a massa passa a mimetizá-la, e o movimento de todos passa a ser uniforme, como um único organismo. Essa nova liberdade contrasta com a realidade que a enclausura na fotografia, seja nas sombras ou do outro lado de um balcão. Pássaro Memória consegue capturar nosso olhar ao mesmo tempo que permite que nosso pensamento deslumbre voos ao fim de sua exibição.
O curta recebeu os troféus Zeca Pagodinho de Melhor Filme, Melhor Fotografia, Melhor Atriz, Melhor Filme por Juri Popular, além do Prêmio Edna Fujii.
JORNALISTA E PUBLICITÁRIO. Cresceu no ambiente da videolocadora de bairro, onde teve seu primeiro emprego. Ávido colecionador de mídia física, reune mais de 2 mil títulos na sua coleção. Já participou de produções audiovisuais independentes, na captura de som e na produção de trilha musical. Hoje, escreve críticas de filmes pro site do Cinema com Crítica e é responsável pela editoração das apostilas do Clube do Crítico.
2 comentários em “Mostra Competitiva Fluminense e Baixada de Curtas Comentada”
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O filme;” minha vida é uma série ” é a prova viva que no nosso pais a cultura só precisa que nossos governantes tenham um olhar mas atento ao nossos talentos, a arte,educação e o esporte sem dúvida mudam o mundo. É encantador ver a dedicação de todos,minha filha “lohanne ” responsável pela trilha sonora do filme foi brilhante, parabéns a todos.