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Fernanda Young: Foge-me do Controle

4.5/5

Fernanda Young: Foge-me do Controle

2022

87 minutos

4.5/5

Diretor: Susanna Lira, Clara Eyer

Eu conhecia a Fernanda Young mais de nome e por parte de seu trabalho. Quando eu era criança, todos assistíamos a Os Normais (2001-2003). Lembro que fui ao cinema assistir ao filme junto a meu pai e passamos mal de tanto rir. Guardo com carinho o dvd de ambos os filmes e sempre que está passando, sou hipnotizado pela tela. Outro filme que Fernanda roteirizou foi Muito Gelo e Dois Dedos D’água (2006), que havia gostado bastante. Mas é somente após o documentário Fernanda Young: Foge-me ao Controle é que pude estar mais perto da magnitude dessa figura.

Fernanda é uma artista de mil faces! Da mais melancólica à mais debochada. Mas não é só sobre isso. Descobri que além de uma roteirista incrível, também era poetisa, escritora, atriz, apresentadora (vi um ou outro Saia Justa com ela, mas não dei a devida atenção à Irritando Fernanda Young) e, também, desenhista. Além de suas várias atividades, somos apresentados às leituras de Fernanda sobre ela mesma, seja por entrevistas, clipes, imagens de arquivo, ou pela leitura de seus poemas pela voz da amiga Maria Ribeiro.

É perceptível que o filme se eleva na ilha de edição. Apesar do roteiro prévio, a montagem acaba sendo um personagem extra ou um espelho da personalidade da artista. O caos da intensidade de pensamentos é traduzido pelos fragmentos de outras obras cinematográficas que servem de pano de fundo à leitura dos poemas. Do construtivismo soviético ao experimentalismo de vanguarda, tudo serve para ilustrar os sentimentos mais íntimos e, também para provar que Fernanda era mais que palavras, mas imagens. Já nem consigo mais dizer onde termina Maria (Metrópolis, 1927) e onde começa Fernanda. E é com esse fluxo caótico orquestrado em forma de documentário, que Susanna Lira resgata a voz de Young. Em alguns momentos, confesso soar verborrágico (se eu reclamo, é porque eu estou amando a experiência) e nos dificultar a absorção de tanto em tão pouco tempo. Mas assim aparentava ser a roteirista das desventuras de Vani (que acredito ter um pouco – ou muito – da escritora também). Não à toa o nome Foge-me ao Controle.

Arte, verborragia e a irreverência que compõem Fernanda Young / Foto: Divulgação

O filme não tem pudores em se enveredar por aspectos espinhosos de sua protagonista. Fernanda fala abertamente sobre sua sensação de inadequação, as dificuldades na vida escolar devido à dislexia e, também fala sobre o estupro que sofreu na adolescência por seu primeiro namorado. E confrontar o mundo sendo um livro aberto, apesar de nem sempre traduzível, fazia de Fernanda ser quem ela é. A escritora dá aula sobre feminismo e individualidade em multimeios. Seus poemas nos dilaceram ouvidos e escancaram as hipocrisias que insistimos encenar. Com palavras, ela se desnudava. Mesmo que a nudez nunca fosse um tabu. E a sua voz se emudeceu precocemente. É uma pena não termos mais os incômodos de Fernanda Young ecoando através de versos, cenas, mensagens de WhatsApp ou tweets. Infelizmente o mundo perdeu todas aquelas pessoas: a escritora, a roteirista, a apresentadora, a atriz, a mãe, a mulher, a desenhista, a irreverente, a revoltada, a disléxica, a desbocada, a asmática, a bruxa, a puta, a punk, a fã de Roberta Miranda, a feminista, a contestadora, a foda pra caralho, a Fernanda Maria Young de Carvalho Machado. Essa constelação chamada Fernanda Young ainda não se extinguiu e Susanna Lira – uma guardiã de memórias através de sua filmografia – é também responsável por eternizar essa(s) figura(s).

A partir do momento em que os créditos finais se encerraram, tive vontade de conhecer mais das obras e da artista. Quero ler seus livros, dissecar seus poemas, consumir seus roteiros e, com certeza, rever Os Normais. Que mulher foda!

Fernanda Young: Foge-me ao Controle foi assistido para o Festival Internacional de Cinema de Paraty e terá sua estreia nos cinemas dia 29 de agosto.

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