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Crítica | Repo Men – O Resgate de Órgãos

Uma premissa intrigante e original é o primeiro passo do nascimento de uma obra extraordinária. Tome Minority Report e o conceito de prender assassinos antes deles cometerem crimes: explorada com maestria por Steven Spielberg, esta é uma ficção científica que expande as barreiras da ciência e cria diversos questionamentos morais além de se preocupar com a ação. Vingador do Futuro atingiu este mesmo nível de excelência. Dois exemplos em um rico universo de obras de um gênero limitado apenas pela criatividade dos roteiristas.

Repo Men, tematicamente similar ao pavoroso Repo! The Genetic Opera, entraria no mesmo rol dos filmes do parágrafo anterior no que tange a sua premissa, mas falha miseravelmente em sugar dela o seu potencial beirando o humor não intencional. No futuro, a União financia órgãos artificiais (artiforgs), como corações e pulmões, cedendo-os aos beneficiários em um financiamento. Mas em caso de atraso nas prestações, Coletores poderão legalmente extrair o órgão (repossuí-lo) do corpo da pessoa inadimplente. Um curioso conceito que o personagem interpretado por Jude Law compara com a hipoteca de uma casa.

Nas mãos de pessoas competentes, este conceito seria expandido satisfatoriamente e facilmente provocaria dilemas: a repossessão de um coração nada mais é do que um homicídio, ao mesmo tempo em que é justificável, pois a propriedade daquele órgão é da empresa que caso não o houvesse fornecido em primeiro lugar já teria causado a morte do paciente. A própria natureza do enxerto de órgãos artificiais no corpo humano produziria upgrades antes impossíveis, como uma super audição ou visão aperfeiçoada.

Mas Repo Men não está interessado em nada disso. Com a narrativa derivada e similar a Minority Report, Remy (Jude Law), um coletor, ao repossuir um órgão acaba sendo vítima de uma descarga que o torna beneficiário de um coração artificial. Não conseguindo pagar as dívidas e em meio a separação de sua esposa, ele acaba se voltando contra o próprio sistema que antes defendia, desenvolvendo uma consciência tardia. Jake (Forest Whitaker), seu melhor amigo, acaba sendo escalado para repossuir o coração de Remy, que parte em uma cruzada contra a União e o sistema.

O diretor Miguel Sapochnik investe em um futuro com trens que andam entre arranhas-céus (Batman Begins?) e apresenta uma técnica de induzir pessoas à beira da morte a um sonho eterno e feliz (repossuiu o conceito de Vanilla Sky). Ou seja tudo que é descrito carece de ineditismo, tornando-se maçante à medida em que os conceitos são usados de forma nada inventiva. Até a direção de arte do interior das casas está longe de parecer vindo do futuro. Demonstrando tem um senso de humor desprezível, Sapochnik introduz uma operação cirúrgica realizada por uma criança e um filho que acerta acidentalmente a mãe com um tranquilizante, sequências que em contexto algum são cômicas. Ainda não satisfeito com a qualidade do material, ele atinge o fundo do poço na cena erótica em que Remy e Beth (Alice Braga) substituem o prazer do orgasmo pela dor de uma cirurgia.

Pobre Jude Law que durante o desenvolvimento da narrativa não sabe bem o que fazer. Atravessando as 2 horas de projeção com um ar de incredulidade, o ator é sabotado sempre quando parece desenvolver algum arco dramático, obrigando a praticamente abandonar o filho, algo que desvia do caráter do personagem apresentado. E se Liev Schreiber ri de si mesmo, Forest Whitaker novamente opta por um projeto que esconde o seu talento e as motivações de seu personagem permanecem um mistério absurdo.

Grotesco quando deveria ser misterioso e cheio de cenas descartáveis quando deveria ser oportuno, o roteiro ainda tenta mandar o espectador para casa com um final surpreendente, mas que é telegrafado em pelo menos três momentos. Desta maneira, Repo Men tem todas as características que uma ficção teria que evitar: previsibilidade, preguiça e inépcia.

Avaliação: 1 estrela em 5.

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12 comentários em “Crítica | Repo Men – O Resgate de Órgãos”

  1. Com certeza o pior filme do ano. E o pior de tudo é que o livro é otimo. Conseguiram estragar o filme, o nome dos atores e o livro…

  2. estou com raiva de ter assistido esse filme, o pior que já assisti,o que mata o filme é a porra do fim, affz todos enganados, é meio que uma ficção dentro de uma ficção….
    o livro é otimo, mas o filme –"

  3. Perfeito… acredito que aqueles que não curtiram este filme, tbm nao curtiram Vanilla Sky, pois o fim faz essa relação entre as duas películas. As atuações estavam maravilhosas (mas obviamente que A.Braga demorará a repetir um trabalho como fez em Blindness). Jude Law, como sempre, está muito bem.

  4. Perfeita crítica. A melhor que já vi até agora, coerente e explicativa. Não conhecia o blog até então, contudo já foi alçado à estrela mais altas do meus favoritos.
    Resumindo: era o filme que todos esperavam, mas que foi estragado.

    Parabéns pelo blog!

  5. Não achei o filme tao ruim, ao contrario, gostei. O grande problema, e nesse ponto eu concordo com a critica, é que na tentativa de fazer algo que atenda os interesses holiudianos, por assim dizer, o filme perde aldacia e originalidade nas fotografias e direção. porem o roteiro e a ideia do filme são bem originais!!
    Tenho certeza que o livro deve ser ótimo!

  6. Presumo que o livro seja bom, apesar de não tê-lo lido.

    O grande problema de Os Coletores, na minha opinião, é a incapacidade de equilíbrio dos gêneros na narrativa. É uma bagunça completa. Infelizmente.

  7. O Filme te faz entrar na crueldade do personagem, as cenas sangrentas são necessárias para entender a realidade do filme, te faz achar todos os cortes e mortes normais, assim como nosso anti-herói encara a vida, pessoalmente torci contra ele no começo, mas a partir do momento que ele ganha um novo coração, tive meu sentimento de justiça satisfeito e passei a torcer pela evolução moral do personagem, com um coração artificial que tem mais sentimentos que um de carne. Claro que o filme peca por ter estereótipos de heróis de filmes americanos, cenas de ação típicas e enfadonhas, talvez desnecessárias. Tirando a parte "Missão Impossível", o filme é bom, as cenas fortes devem ser compreendidas de maneira correta pois é o que salva o filme, o resto é entretenimento descartarvel, assim como transformers.

  8. A única parte da história que salva é a tal "história original". A verdadeira premissa do filme é que os valores morais por que a humanidade lutou tanto tempo foram extintos em nome do mercado e as pessoas em geral são omissas com isso. Não é um filme sobre "como o mundo poderia ser", mas um amontoado de falácias justificando uma carnificina baseada num retrocesso ético, moral e legal da sociedade. Matar não é mais crime, se justificado por uma dívida e realizado pelas pessoas certas. A posição do estado e da sociedade é completamente omitida. O filme tem ares de um sonho ou um delírio pueril sobre o funcionamento do mundo, a história tem um desnecessário "gore", na minha opinião totalmente desnecessário. Não é ame ou odeie, apenas odeie.

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