Aumentando seu amor pelo cinema a cada crítica

Crítica | Tropa de Elite 2 – O Inimigo agora é Outro

Nos primeiros momentos de Tropa de Elite 2 encaramos um abatido Coronel Nascimento e fios de cabelo branco, olheiras fundas e ombros caídos. O retrato de um homem que passou 20 anos de sua vida combatendo a criminalidade e que se tornou um monstro tão grande quanto os traficantes para não ser devorado por estes. Rever um dos ícones do novo cinema Brasileiro em estado tão deplorável é o fio condutor de uma narrativa tão complexa quanto o sistema que o anti-herói incessantemente combate.

Apresentando-se não só para lucrar sobre o sucesso do antecessor, mas desenvolvendo uma história a partir da escalada na pirâmide da corrupção, da violência e do tráfico na cidade do Rio de Janeiro, Tropa de Elite 2 ataca os detratores e críticos da natureza animalesca de Nascimento, quando este em narração diz que “o chamavam de facista”. Aliás, ao enxergar a violência como mal necessário e se manter fiel a esta ideia até o último piscar de olhos, o filme não apenas se mostra corajoso e honesto como revela traços preocupantes de uma sociedade cada vez mais assustada e acuada em suas vidas.

Tais traços são demonstrados em diálogos que insistem em uma “limpeza étnica e social” ou quando Nascimento é aplaudido em um restaurante após comandar uma fracassada incursão em Bangu I que resultou na morte de traficantes de diversas facções criminosas. Nos enxergar no reflexo daqueles homens comuns que comemoram a morte de criminosos ou a crítica ao sistema penitenciário brasileiro com números realmente assustadores vemos como a violência mudou as pessoas que nós somos.

Apresentando outro personagem que é a antítese do Coronel Nascimento, o roteiro de José Padilha e Braúlio Montovani revela Fraga (Irandhir Santos) como sendo um homem idealista e que enxerga nos criminosos seres humanos oprimidos e não animais prontos para o abate. Se compartilha algo em comum com Nascimento é a sua incorruptibilidade diante de um sistema voraz. Além disso, a paixão com que se entrega aos seus ideias, com os olhos sempre cheios de lágrimas ou o sentimento de indignação exposto após a violenta invasão em Bangu I acabam transformando-o em um dos grandes personagens da narrativa. Matias (André Ramiro) também retorna e vemos como a gradual mudança de personalidade iniciada desde a inscrição no treinamento do BOPE se concretiza em uma pessoa sólida e brutal.

Os outros personagens também se revelam ricos em sua, err, ganância, desde o Capitão Fábio até o deputado Fortunato e o Prefeito. Mas é claro que o show caí no colo de Wagner Moura: ator talentoso e que entende bem a natureza do Coronel Nascimento, ele jamais se entrega a um único sorriso na narração se revelando uma imagem triste e nada heroica. Até mesmo quando se torna político na subsecretaria de segurança, ele se apresenta avesso àquele mundo no desleixo com que traja terno e gravata. E se o olhar que dispara ao ver a bandeira do Brasil sob a bandeira do BOPE durante o enterro que faz um belo paralelo com o de Neto no filme anterior, vemos como segurar um fuzil transforma aquele homem fazendo a arma ser mera extensão dos seus braços.

Dirigido com segurança por José Padilha, desde a incursão à favela do Rio acompanhada por um helicóptero do BOPE, até quando exibe a alegoria do fim do tráfico em duas cenas distintas – uma como Nascimento imaginava que ia acontecer e a outra que é o reflexo da realidade, a montagem também se destaca tornando a narrativa ágil e dinâmica como no atentado logo no início da projeção.

Encerrando a narrativa com uma visão panorâmica de Brasília que acaba apontando para diversos culpados que existem na política, Tropa de Elite 2 ousa mais do que ser apenas uma continuação de um produto. É um filme que aperfeiçoou a sua crítica social se revelando mais oportuna do que nunca no período de eleições, e sim, um dos raros casos de uma sequência que supera o material original.

5 estrelas em 5.

Compartilhe

Facebook
Twitter
LinkedIn
WhatsApp

1 comentário em “Crítica | Tropa de Elite 2 – O Inimigo agora é Outro”

  1. o filme é realmente bom, mas fico me perguntando se foi ou não coincidência o filme ser estreado um pouco antes das eleições, e logo quando estava quase certo de que a sucessora de Lula, seria a nossa presidente. Será que o mês de lançamento foi proposital? eu achei meio explicito.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Você também pode gostar de:

Valente

Brave, Estados Unidos, 2012. Direção: Mark Andrews, Steve

Mamma Roma

Mamma Roma, Itália, 1962. Direção: Pier Paolo Pasolini.

Os Especialistas

Os Especialistas (Killer Elite, 2011, Estados Unidos/Austrália). Direção:

Rolar para cima