Assalto em Dose Dupla (Flypaper, Alemanha/Estados Unidos, 2011). Direção: Rob Minkoff. Roteiro: Jon Lucas, Scott Moore. Elenco: Patrick Dempsey, Ashley Judd, Jeffrey Tambor, Pruitt Taylor Vince, Tim Blake Nelson, Mekhi Phifer. Duração: 87 minutos.
Parece suficiente para divulgar
Assalto em Dose Dupla mencionar ser
“do mesmo roteirista de Se Beber, Não Case 1 e 2”, apesar desta minúscula frase conter dois erros graves de publicitários desatentos e distribuidores preguiçosos promovendo qualquer subproduto norte-americano nos cinemas, independentemente da procedência e da qualidade deste. Em primeiro lugar, são dois roteiristas (Jon Lucas e Scott Moore), e não
um como a divulgação parece insistir; além de eventualmente terem escolhido alguns dos piores filmes das carreiras de Patrick Dempsey e Ashley Judd, respectivamente,
Transformers 3 e
O Melhor Amigo da Noiva, e
A Fada do Dente e
Território Restrito. O outro erro é mais grosseiro, pois a dupla de roteirista
SEQUER escreveu
Se Beber, Não Case 2, proeza registrada a Craig Mazin, Scot Armstrong e Todd Phillips. Portanto, se nem mesmo quem foi pago conseguiu promover essa bobagem direito, eu mesmo que não vou defender algo mais apropriado para ser lançado diretamente em Blu-Ray e DVD. Enquanto isso, ótimas produções como
Hanna e
50/50 amargam as prateleiras das locadoras sem sequer ter visto as luzes de projeção.
Dessa sorte, a menção de Jon Lucas e Scott Moore provoca o ligeiro interesse por parte de um público na história de Tripp (Dempsey), um obsessivo compulsivo, surpreendido ao término do expediente bancário pelo assalto de duas gangues de criminosos, uma de profissionais, a outra de caipiras. Determinado a proteger a caixa Kaitlin (Judd), por quem ter uma paixão secreta, Tripp usa sua inteligência e percepção acima do normal para solucionar a situação. Claramente inspirado por Arthur Conan Doyle e Agatha Christie, o roteiro assume rapidamente o seu lado insano e eventualmente divertidinho, mas sucumbe no tom exageradamente pretensioso de inúmeras e improváveis reviravoltas e na ausência da necessária faísca de humor para que este exemplar funcione como comédia.
Nesse sentido, acontecem coisas demais em um curto espaço de tempo, e a interação de mais de uma dezena de personagens torna impraticáveis a assimilação e a identificação do espectador com a narrativa, comprometendo irremediavelmente o resultado final. Por sua vez, o diretor Rob Minkoff (cuja obra-prima O Rei Leão parece sempre conferir relevância a uma relativamente medíocre e apagada), é incapaz de estabelecer a geografia do banco, essencial para que compreendamos, por exemplo, o tiroteio inicial ou as movimentações dos personagens nas salas e corredores.
Transformando Tripp em praticamente o único elo do público com a narrativa, Rob Minkoff extirpa o elemento surpresa e inusitado das revelações do sujeito, deixando a cargo do espectador a aborrecida tarefa de apenas acompanhar a nova descoberta do sujeito (obviamente traduzida através de um flashback, em preto e branco, o que apenas me trouxe saudades de Hercule Poirot, Miss Marple ou Sherlock Holmes que conseguiam deduzir e explanar didaticamente as suas descobertas). E nem se canse em buscar as pistas deixadas pelos roteiristas nos 15-30 minutos inicias, comprovando que o raciocínio de Tripp parece andar na corda bamba da sorte.
Por outro lado, Patrick Dempsey inevitavelmente revela-se o grande achado da produção, assumindo um lado histriônico e nitidamente dependente de ansiolíticos, calmantes e antidepressivos. Assim, a ausência dos medicamentos do sujeito é obviamente trabalhada pelo roteiro e usado como recurso para motivar o seu comportamento frenético e acelerado e a sua incapacidade de se manter parado ou de calar a boca, o que culmina na hilária cena em que, após beijado, ele se joga e se debate no chão por não conseguir processar tantas informações ao mesmo tempo. A dupla de ladrões caipiras interpretados por Tim Blake Nelson e Pruitt Taylor Vince também é divertida, sobretudo este último e a consequências de um tiro à queima roupa. Infelizmente, o restante do elenco, especialmente Ashley Judd, é mormente apagado e descartável, o que é decepcionante.
A montagem de Tom Finan, das animações clássicas 2D da Disney como Hércules ou A Nova Onda do Imperador, é desajeitada em conferir o ritmo rápido e histérico que a narrativa demandava, fazendo com que menos de 90 minutos consigam parecer muito mais arrastados e excessivamente longos.
Curiosamente, essa é a justificativa dos equívocos da equipe publicitária de Assalto em Dose Dupla: o sono provocado por uma narrativa genérica, desesperadamente ansiosa para repousar nas confortáveis prateleiras de uma locadora.
Para onde deveria ter ido imediatamente.
Crítico de cinema filiado a Critics Choice Association, à Associação Brasileira de Críticos de Cinema, a Online Film Critics Society e a Fipresci. Atuou no júri da 39ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo/SP, do 12º Fest Aruana em João Pessoa/PB, do 24º Tallinn Black Nights Film na Estônia, do 47º TIFF – Festival Internacional de Cinema em Toronto. Ministrante do Laboratório de Crítica Cinematográfica na 1ª Mostra Internacional de Cinema em São Luís (MA) e Professor Convidado do Curso Técnico em Cinema do Instituto Estadual do Maranhão (IEMA), na disciplina Crítica Cinematográfica. Concluiu o curso de Filmmaking da New York Film Academy, no Rio de Janeiro (RJ) em 2013. Participou como co-autor dos livros 100 melhores filmes brasileiros (Letramento, 2016), Documentário brasileiro: 100 filmes essenciais (Letramento, 2017) e Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais (Letramento, 2018). Criou o Cinema com Crítica em fevereiro de 2010 e o Clube do Crítico em junho de 2020.
2 comentários em “Assalto em Dose Dupla”
Essa semana está osso de lançamentos, hein? Fui ver "Inquietos" e estive praticamente no mesmo barco que você. Hehehheeh
Abraço
Ao menos você assistiu a um Gus Van Sant, e não a um DIRECT-TO-HOMEVIDEO! Rs