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Eternos

Eternos

157 minutos

A vencedora do Oscar, Chloé Zhao, dirige o ambicioso projeto da Marvel Studios

Em seus filmes anteriores, Chloé Zhao trabalhou com equipes reduzidíssimas, roteiros abertos e sujeitos a improvisação, atores não profissionais – exceto Frances McDormand e David Strathairn em Nomadland -, fotografia naturalista e temas relacionados a personagens a margem da sociedade. O oposto do desafio proporcionado por Eternos. Então, não é inesperado que a diretora vencedora do Oscar demonstre inexperiência ou insegurança, mas é louvável vê-la tentar imprimir algo a mais no subgênero de super-heróis.

Desde a pré-produção, Eternos já enfrentava dificuldades: o roteiro de Ryan Firpo e Kaz Firpo foi reescrito por Chloe Zhao e Patrick Burleigh e após pela chinesa, de forma solo. É possível enxergar, na narrativa, a razão e o resultado de tantos tratamentos. Eternos apresenta uma equipe de seres milenares, criados por entidades denominadas Celestiais, com o objetivo de preservar a ordem dentro do procedimento de expansão da vida no universo. Para cumprir esta missão, os Eternos, liderados por Ajak (Hayek), precisam assegurar que a humanidade alcance o estágio de evolução esperado, enquanto enfrentam os Deviantes, criaturas que se alimentam de vida inteligente e cuja monstruosidade não poderia ser mais evidente do que a revelada no design.

Depois de acreditarem haver exterminado os Deviantes, os Eternos se separam e, séculos depois por iniciativa de Sersi (Chan), Duende (McHugh) e Ikaris (Madden) e motivo que não mencionarei, decidem que a equipe precisa ser reunida para combater uma nova ameaça. A tarefa de apresentar personagens cujos objetivo, natureza e universo destoam dos super-heróis tradicionais já seria uma tarefa complicada, que dirá fazê-lo em um universo cinematográfico consolidado, em que toda ação deve ser acompanhada da resposta à pergunta “onde os Eternos estavam quando…?”. A consequência é um roteiro que precisa introduzir e desenvolver, como for, uma dezena de personagens, a trama, os pontos de viradas e as ramificações dela e remodelar o universo conhecido para filmes futuros.

Sem alternativa que não a exposição, o roteiro é uma espécie de jogo de fases em que o trio de Eternos viaja a localidades ao redor do mundo para convencer os ex-companheiros a se unirem à causa, enquanto também é uma viagem ao passado para revelar a influência dos Eternos na história da humanidade. Esta estrutura prejudica a fluidez da narrativa, que trava quando havia começado a engrenar, ainda mais em face à exigência, para animar o público cativo, de que haja cenas de ação. Genéricas, estas sequências evidenciam a subutilização dos Deviantes, aquém à potencialidade que é sugerida no terço final, e a descartabilidade para satisfazer o arco dramático de uma personagem.

Além do mais, depois de Liga da Justiça, The Boys e Invencível, apenas para citar três exemplos, não existe nada original na equipe povoada por versões de heróis já conhecidos, com poderes idem. O que parece haver de lampejo de originalidade é justo a presença de Chloé Zhao.

Não me refiro somente à fotografia de Ben Davis, em planos abertos em que os personagens são colocados diante da natureza, iluminados pelo sol ou crepúsculo, diante da golden hour – que confere uma aparência de anime às lutas entre os personagens distantes da civilização -, mas também à forma como a diretora introduz questões nunca antes tratadas desta forma na Marvel. Por não serem humanos, mas deuses, os Eternos não estão submetidos às mesmas questões morais. Enquanto os Vingadores não hesitariam em proteger a terra de invasores nem que isto equivalesse ao genocídio, os Eternos refletiriam se vale a pena salvar 8 bilhões de pessoas e impedir o nascimento de mundos e povos? Se o estalo de Thanos representava o desaparecimento de entes queridos, para os Eternos era somente um atraso nos planos maiores.

A isto, Chloé Zhao introduz questões existencialistas, teístas e referentes a propósito na essência do roteiro, articuladas a personagens cujas ações demonstram consequências muito além do bem e do mal. Para acabar com as guerras e os conflitos humanos, Druig (Keoghan) escraviza suas mentes; já Phastos (Henry) ressente a tecnologia inspirada na humanidade ser utilizada para o mal. Já Duende, apesar da similaridade com Peter Pan e a Claudia, a vampira de Kirsten Dunst em Entrevista com o Vampiro, decide muito mais baseada nos sentimentos do que no destino da humanidade. É bastante reconfortante assistir a esta versão de heroísmo mais egoísta e menos humanizada, ainda que, em última análise, sirva a mesma finalidade.

Pois, mesmo que Eternos apresente uma narrativa truncada e com um peso morto nos Deviantes ou na menção à Mahd Wy’ry, também introduz personagens que, individualmente considerados, têm dramas tridimensionais para inspirarem filmes-solo ou desfechos poéticos. E não poderia deixar de mencionar a riqueza humana manifestada na representatividade mais ampla, ambiciosa e natural  em um filme do gênero. Um presente destes deuses imperfeitos, em uma narrativa idem.

Eternos estreia este final de semana nos cinemas brasileiros e, em breve, será exibido na Disney+

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