A Hora da Esucirdão (The Darkest Hour, Estados Unidos/Rússia, 2011). Direção: Chris Gorak. Roteiro: Jon Spaihts. Elenco: Emile Hirsch, Olivia Thirlby, Max Minghella, Rachael Taylor, Joel Kinnaman, Veronika Ozerova, Dato Bakhtazdze. Duração: 89 minutos.
Desrespeitar as leis da física não é o maior problema de A Hora da Escuridão, embora fosse razoável esperar que os produtores ao menos fizessem o dever de casa e estudassem um pouco sobre gaiola de Faraday, energia ondulatória e eletromagnetismo antes de jogar conceitos e teorias goela abaixo do espectador. O maior problema dessa grande bobagem apocalíptica é desrespeitar as leis da física com o único intuito de justificar uma narrativa estúpida que sequer faz sentido de acordo com os ínfimos parâmetros estabelecidos pela sua lógica interna. Revivendo bobagens colossais como O Mistério da Rua 7, que ao menos divertia esporadicamente, o roteiro assinado por Jon Spaihts envia os sócios norte-americanos Sean (Hirsch) e Ben (Minghella) para a apresentação de uma nova rede social na Rússia, quando são surpreendidos por um ataque de uma misteriosa força alienígena que, aparentemente constituída exclusivamente de uma pulsante energia amarela (eles não usam lâmpadas econômicas naquele planeta), consome praticamente toda a população daquele país transformando-a em cinzas.
Incapaz de responder quaisquer perguntas sobre a natureza dos alienígenas, Jon Spaihts sugere que eles sejam de “energia ondulatória”, um conceito duvidoso que põe em cheque o porquê dos invasores absorverem a energia deixando a cidade às escuras (energia consumindo energia?). Todavia, isso não explica a hesitação dos invasores diante de uma poça de água, talvez tementes de se auto-eletrocutar, nem o genocídio humano clean ou como é feita a identificação da energia eletromagnética humana (nesse sentido, o vidro, isolante elétrico, funciona como improvável esconderijo). Mas, eis que surge a bendita gaiola de Faraday, construída de improviso pelo eletricista russo Sergei (Bakhtazdze), em um espaço de tempo máximo 4 dias, o que isoladamente seria um esforço admirável e inverossímil, e alimentada por baterias operacionais (sabe-se lá como!). Com o objetivo de proteger os integrantes da gaiola de descargas elétricas, uniformemente distribuídas na superfície externa, é curioso que um experimento que deveria chamar a atenção dos invasores acabe mantendo-os afastados e que seres humanos consigam tocar e abrir a gaiola de fora (o que deveria eletrocutá-los imediatamente).
Quisera esses serem apenas os problemas de A Hora da Escuridão que ao final poderia ainda ser uma aventura escapista. Mas, não são! Prejudicado por diálogos expositivos (uma comissária de bordo, durante o vôo para Moscou, solicita: “desliguem os celulares pois estes interferem no sistema de navegação”), pela gigatesca habilidade de dedução dos heróis (“Eles vieram com um plano!” – sim, claro -, e “somos ricos em minerais” no vislumbre das grandes torres de energia), ou simplesmente por conversas manifestamente estúpidos (ao abrir o porta-malas de um carro de polícia, Ben afirma “É tudo em russo!”, e Sean retruca “O que você esperava?”, e rapidamente consigo imaginar meia dúzia de memes construídos a partir desse diálogo rasteiro), a narrativa ainda conta com personagens que consideram Rocky IV o aprendizado básico da cultura russa e que dispensam interesses românticos na danceteria com um “Muchas gracias”. Logo, nem me pareceu estranho que, após a morte de um cachorro pelas mãos (err, tentáculos) alienígenas, Skyler (Kinnaman) faça o oportuno e definitivo comentário: “Vocês viram! Eles mataram o cachorro. Eles mataram o cachorro!”.
Igualmente desinteressante, a direção de Chris Gorak já nos pueris créditos iniciais apresenta os nomes dos envolvidos na produção nas versões russa e inglês, uma maneira “eficiente“ e “criativa” para ambientar e contextualizar rapidamente a narrativa em Moscou, e que pode vir a ser útil para turistas na Rússia encontraram o McDonald’s da esquina (o product placement também é inquestionavelmente intrusivo). Com abundância de ângulos baixos acompanhando os personagens com algum monumento ao fundo – uma imponente Catedral ou a Praça Vermelha -, Chris Gorak entedia com a repetitividade que ilustra os ataques dos invasores. Basicamente, o grupo decide ir de A para B, algumas luzes se acendem (ou suas variações, o alarme de um carro dispara ou celulares começam a tocar – não me pergunte porque), e em segundos, todo mundo começa a correr e a disparar inúteis projéteis contra a armadura dos alienígenas.
Perdendo a oportunidade de impor um empecilho na incapacidade dos heróis em compreender a língua russa e a se comunicar adequadamente, a narrativa torna fácil a interação com outros personagens nativos que falam inglês fluentemente (apesar do carregado sotaque). Ambientado praticamente à noite, a fotografia de Scott Kevan é desastrosa e mais parece uma versão empobrecida e poeirenta da “noite americana”, uma técnica fotográfica para simular tomadas nortunas a partir de filmagens diurnas usando filtros específicos. Além disso, exagerando naquela que seria a única fonte de iluminação, todas as externas parecem banhadas da intensa luminosidade da lua cheia e nem as internas representam obstáculo maior para os protagonistas, munidos de um estoque infinito de sinalizadores.
Por sua vez, sempre é impressionante a direção de arte dos thrillers apocalípticos, especialmente a desertificação das grandes metrópoles. Portanto, se em Eu sou Lenda, uma nova vegetação e fauna de animais de selvagens começavam a tomar conta da paisagem de Nova York, aqui as cinzas nas ruas desertas dançando de acordo com o ritmo do vento sugerem a quantidade de vítimas dos invasores. Igualmente grandiosos são os cenários, sobretudo um shopping center e os destroços de um avião na sua praça central. Porém, é incompreensível a inexistência de cadáveres, obviamente outros humanos morreram de causas diversas do que ataques dos invasores. Esse bom cuidado com a direção de arte infelizmente não acompanha o design dos alienígenas, inicialmente representados como clarões de energia distorcendo a imagem enquanto movimentam-se, mas que na primeira oportunidade tem traços claramente humanos pobremente reproduzidos pelos efeitos especiais. Da mesma maneira, a visão subjetiva dos alienígenas é derivada de filmes melhores e sequer provoca uma faísca de tensão no espectador.
Contando com um elenco de jovens apáticos e unidimensionais, o bom ator Emile Hirsh (da ótima atuação em
Na Natureza Selvagem), entrega-se a um personagem imbecil que, à beira da morte, não hesita em conversar com o manequim de uma loja e ficar fazendo piadinhas completamente inusitadas, além de exibir uma cara de paisagem quando alguém sugere uma fuga para um submarino! Da mesma forma, Max Minghella e Rachel Taylor parecem desprovidos de propósito, os tornando vítimas certeiras conforme os padrões do cinema, enquanto Olivir Thirlby tem o único objetivo de conseguir mandar um SMS para a sua mãe. Incluindo também uma milícia russa, suficientemente descrita pelas armas que carrega (metralhadora, lança-chamas e bazuca), o personagem menos inferior acaba sendo, surpreendentemente, o inescrupuloso empresário Skyler cujo diálogo sobre a coragem é o único que parece não ir diretamente para o lixo.
Com duração inferior a 90 minutos (um alívio!), A Hora da Escuridão ao menos respeita a 3ª lei de Newton, pois se para toda ação há sempre uma reação oposta e de igual intensidade, minha única reação a essa bomba é inclui-la imediatamente na lista dos piores filmes do ano.
Crítico de cinema filiado a Critics Choice Association, à Associação Brasileira de Críticos de Cinema, a Online Film Critics Society e a Fipresci. Atuou no júri da 39ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo/SP, do 12º Fest Aruana em João Pessoa/PB, do 24º Tallinn Black Nights Film na Estônia, do 47º TIFF – Festival Internacional de Cinema em Toronto. Ministrante do Laboratório de Crítica Cinematográfica na 1ª Mostra Internacional de Cinema em São Luís (MA) e Professor Convidado do Curso Técnico em Cinema do Instituto Estadual do Maranhão (IEMA), na disciplina Crítica Cinematográfica. Concluiu o curso de Filmmaking da New York Film Academy, no Rio de Janeiro (RJ) em 2013. Participou como co-autor dos livros 100 melhores filmes brasileiros (Letramento, 2016), Documentário brasileiro: 100 filmes essenciais (Letramento, 2017) e Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais (Letramento, 2018). Criou o Cinema com Crítica em fevereiro de 2010 e o Clube do Crítico em junho de 2020.
10 comentários em “A Hora da Escuridão”
Para quem parece um defensor ferrenho da Dona Física, a piada do parágrafo final é bastante infame e inapropriada, hein, senhor Márcio?
E não acho o filme tão desastroso assim. Mas enfim, não me prolongarei porque já o fiz na minha crítica, sensacional como de costume.
Abraço
Esta crítica estava pronta desde as 10 horas da manhã e pensei até a hora do almoço em um fechamento apropriado. Ou você preferiria a minha piada sobre Inércia ou, quem sabe, sobre Conservação de Energia?
A sua crítica está um lixo fedorento. A minha, sensacional e estupenda.
Mas, para quem quiser frustrar-se com meu amigo Eduardo, clique aqui e leia a opinião dele http://cinemasemerros.blogspot.com/2012/01/hora-da-escuridao.html
Sei lá. Mas que ficou estranho, ficou. As pessoas mais desfavorecidas nem vão perceber que é uma piada. Newton não ficaria orgulhoso, moço.
@ReclamesEduardo. Veja bem: RECLAMES
Re-escrevi. No fim, considero sua RECLAMAÇÃO de qualidade.
Ótima crítica. Ri só de ler as descrições dos acontecimentos absurdos e diálogos horrendos, mas não me aventuro a assistir A Hora da Escuridão. Me soou mesmo, desde o trailer e os anúncios, apenas mais um suspense teen absolutamente descartável. Passo longe!
"Suspense" é bondade sua 🙂
Eu, você e João citamos a duração do filme no último parágrafo de nossos textos. Quem copiou quem? CPI já!
Ainda não vi, mas só tenho andado a ouvir péssimas resenhas sobre o filme, até tenho medo de ver! Parabéns pelo blog 🙂
Sarah
http://depoisdocinema.blogspot.com
Obrigado Sarah 🙂
Bom que se dane as brigas de quem é bom critico e mau critico, o lance é, ESSE FILME É UM C.O.C.O SE TIVESSE COMO DEVOLVER MEUS 90 MINUTOS PARA EU GASTAR COM QUALQUER PORCARIA MENOS ISSO TA LOCO!