Antes disso acontecer, porém, Joe conhecera Kristen Arnesen, uma ingênua secretária acidentalmente tomada por uma das garotas de programa de um passeio de barco. Ofendida com a confusão, a jovem acaba cedendo aos galanteios de Joe depois de repentina mudança de atitude só existente no cinema. Anos depois, os dois se casam, têm uma filha, Debbie, e parecem viver o sonho americano. até que o álcool começa a se introduzir na vida conjugal, primeiro na forma do Brandy Alexander, valendo-se do vício de Kristen por chocolate, e depois nos cada vez mais comuns porres motivados pela desgastante rotina e o precoce nascimento da filha. Certa noite, inclusive, Kristen causa o incêndio do apartamento do casal, visto corriqueira e passageiramente na narrativa.
Narrativas envolvendo o alcoolismo, como esta de Vício Maldito, não fogem muito à regra de encarar a depreciação do ser humano em função do embaraço e arrependimento provocado pelo vício. E sua ínfima recompensa repousa longe do alcance do espectador e atravessa obrigatoriamente a trajetória da degradação moral e física, o vexatório e doloroso retrato da frágil condição humana. Não há prazer em acompanhar este retrato, mas Jack Lemmon e Lee Remick, indicados ao Oscar, trazem muita dignidade a seus difíceis personagens, acendendo a fagulha no público que nos leva a ansiar pelo restabelecimento da sobriedade e paz familiar.
Assim, Vício Maldito funciona mais como mensagem de alerta e propaganda dos alcoólicos anônimos agraciada por ótimos intérpretes, embora tenha um plano final pertinente e épico, onde aquele idealista e promissor jovem, agora um adulto calejado, é confrontando com a imagem mais assustadora para um viciado: o múltiplo-retrato que representa a vergonha do seu pecado, o medo da recaída e o desejo de se entregar sem amarras ao vício.
Independentemente de qual caminho Joe seguirá, nosso contato com aquele casal não poderia ser mais amargo.
Crítico de cinema filiado a Critics Choice Association, à Associação Brasileira de Críticos de Cinema, a Online Film Critics Society e a Fipresci. Atuou no júri da 39ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo/SP, do 12º Fest Aruana em João Pessoa/PB, do 24º Tallinn Black Nights Film na Estônia, do 47º TIFF – Festival Internacional de Cinema em Toronto. Ministrante do Laboratório de Crítica Cinematográfica na 1ª Mostra Internacional de Cinema em São Luís (MA) e Professor Convidado do Curso Técnico em Cinema do Instituto Estadual do Maranhão (IEMA), na disciplina Crítica Cinematográfica. Concluiu o curso de Filmmaking da New York Film Academy, no Rio de Janeiro (RJ) em 2013. Participou como co-autor dos livros 100 melhores filmes brasileiros (Letramento, 2016), Documentário brasileiro: 100 filmes essenciais (Letramento, 2017) e Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais (Letramento, 2018). Criou o Cinema com Crítica em fevereiro de 2010 e o Clube do Crítico em junho de 2020.