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Crítica | A Morte te dá Parabéns

A Morte te dá Parabéns

96 minutos

Assassinos mascarados. Mocinhas indefesas. Moralismo sexual. O terror slasher convencional soa careta para os dias atuais, algo que Wes Craven reconheceu no clássico Pânico e suas continuações. Assim,  enquanto produções como Corrente do Mal empregavam os elementos característicos do subgênero em favor da alegoria sexual, outras procuraram subvertê-los, como é o caso de Terror nos Bastidores. A Morte te dá Parabéns não é diferente, e através da estrutura narrativa do loop (ou carrossel), já vista em Feitiço do TempoNo Limite do Amanhã Antes que eu Vá, procura injetar algo novo à fórmula desgastada, uma tarefa em parte bem-sucedida.

De modo imediato, o roteiro de Scott Lobdell apresenta Tree (Rothe) como a típica vítima introdutória de serial killers mascarados no cinema: loira, promíscua, grosseira, amante de um professor casado e distanciada do pai, a colegial orgulha-se de haver cuspido no motorista de Uber e humilha a colega de irmandade por causa do que come no almoço (eu não tomei café, afirma a vítima, para receber de resposta um seco “Pra quê café da manhã?”). É a típica personagem cuja morte não provocaria espanto no espectador, tanto que é a primeira a ser esfaqueada pelo assassino com uma máscara de bebê. A primeira e a única (uma only girl, portanto?), pois a cada vez que morre, Tree acorda no mesmo dia. Uma maldição (dádiva soa melhor) que será quebrada apenas depois de descobrir a identidade do assassino, e se tornar a final girl típica do slasher, a moça decente e bondosa que enfim vence o monstro.

Parte da graça desta paródia do gênero está no típico objetivo do subgênero whodunit, ou seja, quem é a pessoa detrás da máscara? A líder da irmandade, o garoto que a stalkeia, a colega de quarto ou a esposa do médico? Assim, depois de se familiarizar com a prisão temporal em que está, Tree começa a usar sua habilidade de reviver o mesmo dia para riscar nomes do quadro de possíveis assassinos. Mas, por ser uma mistura de Hercule Poirot com Forrest Gump, Tree sequer se atenta para o fato de que as principais pistas da identidade do seu algoz estão diante do próprio nariz (e em cima da cabeceira do quarto). Em vez disto, busca dicas com Carter (Broussard, o garoto clichê repleto de pôsteres de thrillers e terrores no quarto) quando o principal recurso era apenas perguntar para o espectador — eu sei que você adivinhou quem estava debaixo da máscara, mas acabou trapaceado pela história a pensar diferentemente.

Frustrado um dos pilares narrativos de Christopher Landon (diretor de Como Sobreviver a um Ataque Zumbi Atividade Paranormal: Marcados pelo Mal), resta, então, investir no prazer culposo do slasher: a condução dos assassinatos, iniciada assim que o espectador avistava o mascarado, antes até de o personagem tomar ciência de sua presença. Nesse jogo de predador e presa que acaba na ponta da faca, o importante é tanto a criatividade da morte quanto a tensão construída, e Landon, em geral, permanece no limiar da mediocridade, com acertos ocasionais: o suicídio dentro da cúpula do sino e a explosão do carro de polícia são os momentos em que Landon retribui ao espectador o investimento feito na premissa absurda.

Sorte nossa que Jessica Rothe está em uma performance inspirada, exagerada e desbocada o suficiente para adoçar a paródia e determinada a encerrar o ciclo a todo custo. E mesmo que questionemos, a cada nova vida, a esperteza da personagem (p. ex.: entrincheirada no próprio quarto, Tree esquece de fechar todas as portas), Rothe evidencia a força de vontade da personagem para que continuemos a crer em seu sucesso. Já ao seu redor, estão tantos estereótipos que sequer vale a pena enumerar (se bem que calha citar que um deles tem até uma boate com jogo de luz dentro do quarto), todos vítimas em potencial caso não fosse de Tree o privilégio de ser a escolhida.

Com regras frouxas, dentre as quais o enfraquecimento físico mal explicado de Tree a cada “ressurreição” (se a intenção for fazer o espectador temer pelo seu destino, basta relembrar que a morte apenas faria ela reviver o mesmo dia, pois não importa como isto ocorra ou quem provoque), A Morte te dá Parabéns até deveria afinar as arestas do roteiro e quem sabe estabelecer uma produção menos tapada do que é. Mas não sei se, caso fizesse isto, seria divertida como é, ao menos até acordarmos no dia seguinte.


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