Para coroar este ano em que assisti a 594 filmes (acesse meu Letterboxd e confira a lista completa), os melhores filmes exibidos, comercialmente, nos cinemas brasileiros ou em plataformas de vídeo por demanda (Netflix, Net Now etc) em 2017.
10- Além das Palavras
Mais do que evidenciar quem era Emily Dickinson, esta biografia reproduz o que significou SER Emily Dickinson. O hermetismo entediante de quem parecia sequer sair da propriedade da família misturado com os diálogos irônicos e observações determinantes daquele período, com a alegria transformando-se em amargura e esta em angústia. Isto com a melhor atuação da carreira de Cynthia Nixon.
Ao lado de A 13ª Emenda e O. J. Made in America, que viria a vencer o Oscar 2017 de Melhor Documentário, este trabalho debate a questão racial norte-americana e o que proporciona mais reflexões pela abstração na poesia de James Baldwin e pela maneira pragmática com que arranca as raízes do racismo a partir do terror inominável dos brancos ou, mesmo, da raiva de tantos negros. Um documentário poderosíssimo.
8- Columbus
Nesta narrativa romântica sobre imobilismo e arquitetura, o mundano encanta de tal modo que parece que o diretor japonês Yasujirô Ozu retornou, nem que apenas para esta produção. Uma obra poética, verossímil e convincente, e muitíssimo bem atuada, sobre as raízes, não de concreto, mas emocionais que nos prendem ao que somos.
7- Dunkirk
Uma experiência imersiva, cuja sensação, ao término, é a de alívio após sermos encurralados e bombardeados por nazistas, cujos rostos sequer temos a capacidade de discernir, e sobrevivermos depois de uma luta feroz pela própria vida. Aqui, não importa o rosto visto no espelho, somos centenas de milhares com o intuito exclusivo de assistir ao sol nascer mais um vez em um trabalho tecnicamente irrepreensível.
6- Martírio
Palavras são incapazes de expressar a relevância artística deste trabalho antropólogo e indigenista, com um retrato empático do processo tortuoso de retomada das terras indígenas na posse de ruralistas que acreditam que o gado é mais importante do que gente. É um resgate histórico entrelaçado que apresenta o estágio da discussão social, midiático e parlamentar do processo de demarcação de terras, escancarando a indiferença com que a sociedade trata os povos nativos e o lobby da bancada ruralista no Congresso Nacional. Um documentário que desperta a revolta a partir do modo gentil e apaixonado com que se relaciona com seu tema.
5- Logan
Existe muito mais nos super-heróis do que apenas as aventuras espetaculosas da Marvel Studios, e a despedida de Hugh Jackman do papel que o fez famoso é uma obra de arte em amargura, angústia e heroísmo, que convergem na violência ínsita a um personagem que carrega facas afiadíssimas nos punhos, enfim retratada de modo satisfatório. O melhor do seu gênero desde O Cavaleiro das Trevas e X-Men: Primeira Classe.
4- Moonlight: Sob a Luz do Luar
O vencedor do Oscar 2017 de Melhor Filme, após aquela lambança de troca de cartões, é uma narrativa dramática sobre amadurecimento e autoconhecimento ambientada dentro da comunidade negra norte-americana. Mas agora, o enfoque não está na questão racial, e sim sexual, em uma experiência sensorial que narra o complexo desabrochar da sexualidade.
3- Silêncio
Filmes como esta produção de Martin Scorsese nasceram para serem apreciadas com o espírito dentro do templo do cinéfilo, o cinema, empregando a neblina e a contemplação como elementos determinantes da peregrinação de fé dos personagens na terra do sol nascente. Não necessariamente a fé cristã, já que não há certo ou errado no assunto da religiosidade. E, para um diretor que já explorou todas as formas de violência no cinema, esta desponta como a mais cruel: a exercida contra a alma, na rejeição da fé e na recusa ao próprio desejo do martírio.
2- A Criada
A percepção é desafiada por esta produção sul-coreana do diretor Park Chan-wook, que está muitos passos a frente do espectador, a ponto de trabalhar, com paciência e perspicácia, reviravoltas que não têm o propósito de nos tapear e sim de elucidar a forma míope e tendenciosa com que enxergávamos os personagens até então. Tudo isto enquanto discute o sexismo masculino em uma narrativa maiúscula e a melhor de sua carreira.
1- mãe!
A agonia permanente neste terror psicológico, catapultada pela fotografia claustrofóbica, é só a ponta do iceberg de uma obra que comunga, sem atropelos nem descompassos, a religiosidade e a arte de modo uno e indissociável, confundindo as figuras do Criador com a do Artista e a da Musa com a Natureza, enquanto passeia pelo texto bíblico com segurança e autoridade. Isto sem deixar de frisar a atuação inesquecível de Jennifer Lawrence.
A seguir, em ordem alfabética, mais 15 filmes que carrego no coração deste ano de 2017.
Cidade Perdida de Z, A
Detroit em Rebelião
Eu, Olga Hepnarova
Gabriel e a Montanha
John Wick – Um Novo Dia para Matar
Icarus
La La Land – Cantando Estações
Luta de Steve, A
Mulher Fantástica, Uma
Nosso Reino
Notes on Blindness
Planeta dos Macacos: A Guerra
Sob o Sol
Star Wars: Episódio VIII – Os Últimos Jedi
Tartaruga Vermelha, A
Crítico de cinema filiado a Critics Choice Association, à Associação Brasileira de Críticos de Cinema, a Online Film Critics Society e a Fipresci. Atuou no júri da 39ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo/SP, do 12º Fest Aruana em João Pessoa/PB, do 24º Tallinn Black Nights Film na Estônia, do 47º TIFF – Festival Internacional de Cinema em Toronto. Ministrante do Laboratório de Crítica Cinematográfica na 1ª Mostra Internacional de Cinema em São Luís (MA) e Professor Convidado do Curso Técnico em Cinema do Instituto Estadual do Maranhão (IEMA), na disciplina Crítica Cinematográfica. Concluiu o curso de Filmmaking da New York Film Academy, no Rio de Janeiro (RJ) em 2013. Participou como co-autor dos livros 100 melhores filmes brasileiros (Letramento, 2016), Documentário brasileiro: 100 filmes essenciais (Letramento, 2017) e Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais (Letramento, 2018). Criou o Cinema com Crítica em fevereiro de 2010 e o Clube do Crítico em junho de 2020.
1 comentário em “Os Melhores Filmes de 2017”
Você assistiu a 594 filmes em um ano? Que incrível, queria conseguir assistir a tantos assim neste espaço de tempo. Sua lista está ótima e muitos destes me encantaram. Gosto muito de vários filmes que estão nesta lista, já que figuram entre os melhores filmes argentinos . São sempre tão únicos em sua forma de contar suas histórias, mesmo que o cinema daquele país seja conhecido por ter diversos filmes fantásticos de diversos gêneros.