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La Forma de las Horas

La Forma de las Horas

72 minutos

Filmado em apenas 8 dias e financiado independentemente após a suspensão, pelo governo de Mauricio Macri, do incentivo ao patrocínio cinematográfico dado pela Incaa (a Ancine dos argentino), La Forma de las Horas poderia ser resumido, nas mesmas palavras de Ana, como a história “sobre uma mulher que escreve sobre um homem e uma mulher que não estão mais juntos em uma casa que não é mais deles”. Ao longo de dez capítulos – distribuídos por enxutos 72 minutos -, iniciados por textos digitados no computador e apagados na sequência como uma tentativa de verbalizar um sem-número de sentimentos, a narrativa estabelece uma situação simples, porém contada de maneira inventiva.

O encontro de Ana (Díaz) e seu ex-marido (Noher) na cabana onde moravam pode parecer um fragmento de sua imaginação – não seria estranho supor isto – ou uma ação desenrolada no breve intervalo de tempo em que pôs a casa à venda, empacotou os pertences e tentou deixar para detrás o passado que retorna para assombrá-la. Para ela, “perdoar e esquecer são quase a mesma coisa”, o que permite re-interpretar a pergunta retórica “como seria me esquecer?” como um desejo de perdoar a si própria. Ou, noutro contexto, tornaria a frase do ex-marido, “espero que nunca me perdoe”, como um pedido para não ser esquecido.

O conceito de reminiscências vem à cabeça: ao invés de memórias, boas ou más guardadas, aquelas seriam impressões deixadas por pessoas ou situações nas nossas vidas e que não nos desgarram não importa o que façamos. E este verbo, importar, também tem relevância conferida pela personagem, à medida em que tenta reescrever o passado como se fosse uma obra de ficção, buscando racionalizar o término do relacionamento a partir do confronto de ideias consigo própria, representada literalmente na narrativa como seu ‘duplo’ que a encara enquanto entra no carro ou que frustra seu desejo de apagar com a facilidade de pressionar o delete no teclado do computador.

As olheiras e o abatimento de Julieta Díaz simbolizam, sem meias palavras, o estado psicológico da protagonista, que está presa no tempo não-linear, mas espiral, igual à bailarina que dança em torno do próprio eixo na floresta de álamos defronte de sua casa. Esta cronologia fluida é o que a narrativa tem de melhor, descobrindo significados diversos a partir da revisitação de situações com alterações particulares (mãos que antes se tocavam através da cortina de vidro do banheiro agora perdem a sintonia) ou conhecimento adicional (a cena introdutória ganha contexto modificado quando retorna no meio da narrativa). Até mesmo porque o “efêmero é o que dura um só dia”, e assim as impressões deixadas tornam e retornam em um balé de saudade e mágoa, presença e ausência, amar e não estar mais lá.

O dinheiro escasso impactou na qualidade da imagem – embora a fotografia desbotada some ao estado de espírito da protagonista de maneira que palavras não poderiam -, porém a criatividade frutifica nestas situações e, com pouco, a diretora Paula de Luque introduziu bastantes símbolos: os cães à beira do mar e cujas peles têm a mesma cor dos figurinos trajados por Ana (marrom, envelhecido e desgastado) e o ex-marido (preto, que confere um ar mórbido à presença do ator em momentos centrais) e o conceito central de que o tempo não é linear, mas um jogo que pode ser visto de ângulos variados.

Julieta e Jean Pierre atuam em tom abaixo do convencional, e este minimalismo cerca com a pontiaguda inevitabilidade um relacionamento que não mais existe, apesar de permanecer e demarcar a personalidade daqueles que o viveram neste drama romântico melancólico e criativo.

Crítica publicada durante a cobertura do 47º Festival de Cinema de Gramado

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