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Pinóquio

Pinóquio

125 minutos

Assistir a esta versão italiana da literatura de Carlo Collodi, cuja primeira adaptação cinematográfica datava de 1911 e que acumula dezenas de adaptações ao longo de cem anos, exige que façamos esta pergunta: quando a repetição de uma mesma história, com personagens e eventos já conhecidos (o narrado) impacta na forma de contá-la (a narrativa)? Já houve Pinóquio em versão preto e branco e muda, animada e live action; italiana, norte-americana, soviética. Ora, a história do boneco de madeira, criado por um pobre e prestativo artesão, e que atravessava uma jornada de aventura antes de se tornar um menino de carne e osso e entender que deveria obedecer os mais velhos é de conhecimento público mesmo que muitos nem tenham assistido sequer à versão mais popular, de Walt Disney (1940). O que o diretor Matteo Garrone (de Gomorra) poderia imprimir na narrativa para que, mesmo diante da familiaridade da história, pudesse oferecer inédito em matéria de forma?

A resposta óbvia é a atmosfera sombria da fotografia de Nicolai Brüel, cuja cena inicial encontra, no escuro e isolado da luz de fora, Geppetto (Roberto Benigni, que ganha a oportunidade de se redimir da decisão desastrosa de interpretar o boneco Pinóquio no filme que dirigiu em 2002). A ideia de cinema de terror fantástico veio à cabeça, mas é abandonada ao encontrarmos o tronco de madeira animado de onde o boneco ganhará vida. Não há horror na jornada de Pinóquio, embora encontre uma série de adversidades e personagens inescrupulosos que pudessem fazer pensar nisto. É como se os Irmãos Grimm e Walt Disney combinassem de, juntamente, dirigir a animação, e terminassem no meio termo. A consequência é óbvia: Pinóquio é infantil demais aos mais adultos, e perturbador e mórbido aos mais infantes.

Isto é evidenciado quando o enforcamento de um personagem não é sugerido, mas ilustrado a olhos vistos, com uma inspiração gótica em emoldurar a imagem defronte da luz da lua. Se isto é chocante a ponto de o conto moralizante atingir uma versão extremamente gráfica, por outro é difícil não se incomodar em como os personagens foram infantilizados a ponto de se tornarem caricaturas mal acabadas: se o Chimpanzé que preside uma espécie de julgamento às avessas continua a divertir justo pela inconsequência da sentença absurda, o peixe na barriga da baleia ou o Grilo Falante são maquiados desastrosamente a ponto de permanecerem, sempre, sob sombras. O que é irônico se considerarmos que a maquiagem, combinado com efeitos visuais, que deram vida à Pinóquio (e também às marionetes do teatro de bonecos) é de uma exuberância e riqueza de detalhes que não comprometem a atuação de Federico Ielapi. Também não dá para ignorar a qualidade da edição do som em incorporar, até mesmo, os rangidos de madeira a cada movimento do personagem-título.

Entretanto, apenas mais velho, pude perceber como a história do conto é contraditória: se Pinóquio é exaltado por seus pares do teatro de bonecos por não ter cordas e, portanto, poder exercer o livre arbítrio, é punido de muitas formas sempre quando não age como orientado ou determinado pelos adultos. Pinóquio é livre, mas somente dentro do mundo das crianças, e a recompensa em obedecer é o prêmio de ser de carne e osso, não mais de madeira. Isto se complementa com a narrativa, que demora a compreender o que motiva seus personagens. Geppetto esculpe Pinóquio para ganhar dinheiro honestamente, mas, com maior rapidez do que o garoto de madeira foge de casa, constrói um laço paterno preocupado que se transforma em motivo de envelhecimento precoce.

Como obra de fantasia, Pinóquio acumula acertos e erros graças às decisões (a forma) de retratar o conto, ora encontra, na sobriedade, o tom adequado à narrativa apenas para perdê-lo na sequência posterior. Às vezes, a relação de causa e efeito evidencia que as atitudes desobedientes provocam consequências maiores do que só um nariz comprido – assim se encaixando na abordagem visual da narrativa, dentro de uma vila miserável –, enquanto em outros instantes o resultado é casual e inofensivo. Esta inconstância na forma de Matteo Garrone condena esta adaptação a ser mais uma na imensa quantidade de versões deste clássico… que ganhará ao menos mais duas nos próximos anos: a animação sombria de Guillermo Del Toro e o live action da Disney de Robert Zemeckis.

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