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Nanny

98 minutos

Um terror psicológico sobre a terceirização da criação dos filhos e as relações de trabalho

Em Nanny, o terror é a ferramenta escolhida para discutir a situação de Aisha (Anna Diop), uma imigrante ilegal senegalesa, que consegue um emprego de babá para um casal rico em Manhattan com a intenção de viabilizar a vinda do filho, que ficou sob os cuidados de sua família no Senegal. À medida que a trama avança, a relação com os patrões desanda e uma presença sobrenatural ameaça o desejo de Aisha em se reunir com o filho, colocando em risco até a pequena Rose, de 5 anos. 

Logo chama a atenção a ambientação do designer de produção Jonathan Guggenheim, que torna impessoal, frio e hostil o apartamento onde moram Amy (Michelle Monaghan) e Adam (Morgan Spector), apesar de ser amplo e espaçoso. A ironia ainda está presente no figurino com que conhecemos Amy: um macacão alvo como a neve, enquanto constrói uma relação de proximidade falsa com Aisha, ao recebê-la com um abraço. Já Mark, ausente da família e recluso dentro do escritório, demonstra ter segundas intenções para como Aisha. 

Engana-se, porém, quem pensa que Aisha se coloca na posição de vítima. O roteiro escrito por Nikyatu Jusu, que também dirige, cria uma protagonista ciente dos direitos que possui. Aisha se impõe à família, não aceita o pagamento abaixo do combinado em razão de horas extras acumuladas, muito menos a crítica de Amy ao modificar a alimentação de Rosa para a comida que prepara e compra com o dinheiro do próprio bolso. Além disso, não tarda para que haja uma briga de egos entre Amy e Aisha ante a preferência de Rose pela última, com quem convive a maior parte do tempo. É uma crítica em mão dupla: primeiro, aos pais que terceirizam a criação dos filhos; depois, à Aisha, que abre mão (temporariamente) do filho a fim de cuidar da filha dos outros, deixando-o também aos cuidados de terceira pessoa. 

Inclusive, o ciúme do garoto literalmente transborda em linguagem de terror. Aisha acredita que o cômodo que ocupa está sendo inundado; noutro momento, que uma sereia a agarra em direção ao fundo do mar; Aisha ainda avista a sombra de uma aranha gigante na parede ou uma cobra na cama. Alguns destes momentos envolvem a água, que desempenha uma função específica na trama, outros parecem inseridos casuisticamente e pouco comunicam em termos de metáfora. No lugar, tem um papel mais diretor em criar a atmosfera de delírio da protagonista, acentuada pela trilha sonora de Bartłomiej Gliniak e Tanerélle, que combina sons desconcertantes com instrumentos musicais senegaleses, e a direção de fotografia de Rina Yang, cujas cores e iluminação expressivas conferem ares expressionistas ao terror de Aisha. 

Ainda assim, não há como ignorar a sensação de falta de estrutura da narrativa, incapaz de interligar a vida pessoal de Aisha – o relacionamento com Malik (Sinqua Walls) – com a vida profissional. A sensação que tive é de que o trabalho de babá sufoca a vida pessoal – o que faz sentido, é verdade -, embora não haja instante em que Aisha demonstra inconformismo quanto a isto. Além do mais, Nikyatu Jusu trabalha tanto em cima da reviravolta, em que oferecerá uma explicação para os fenômenos sobrenaturais (alguns deles, pelo menos), que quando chegou tive a impressão de que havia desvendado o que ia acontecer bastante tempo antes. 

Para piorar, alguns dos eventos são acomodados na narrativa de qualquer jeito, sob a parca justificativa de se tratarem de alucinações. Ora, na casa vigiada 24 horas por dia, qual a forma de justificar erguer a faca para a pequena Rose, mesmo que estivesse sendo tomada por visões sobrenaturais? A necessidade de criar momentos impactantes, sobretudo no ato final, prejudica a construção do terror mas não dilui a força que há na atuação de Anna Diop e na discussão trazida à primeiro plano sobre a terceirização da criação dos filhos e a culpa decorrente da negligência parental.

Nanny não tem data de estreia nos cinemas brasileiros ou nas plataformas de streaming.

Filme assistido no 47º Festival Internacional de Toronto

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