Curta-metragem patrocinado pela Yves Saint Laurent a Almodóvar, Extraña Forma de Vida é um faroeste romântico frio e desprovido de apelo que não a grife do diretor e os atores Pedro Pascal (O Mandaloriano e The Last of Us) e Ethan Hawke (Antes do Amanhecer).
O enredo trata do reencontro do rancheiro Silva (Pascal) com o agora xerife Jake (Hawke) após 25 anos. O passado esconde o motivo real da visita: Silva viajou com o propósito de dissuadir Jake de prender seu filho, acusado de ter cometido um crime. Enquanto isto, por uma noite, Silva e Jake revivem o romance tórrido que viveram no passado.
Há muita coisa errada com o projeto, mas, de modo imediato, não há paixão, desejo, tesão. Apesar de a voz rouca de Ethan Hawke, que tem se tornado muleta de interpretação do ator, conferir dimensão sexy à sisudez do personagem, ou de Pedro Pascal ser charmoso, a ausência de tensão sexual entre os personagens arruina a pretensão do projeto. Jake roça a barba no pescoço de Silva em uma cena desajeitada; no restante do tempo, não há beijo ou atração, tudo é omitido. Quando muito, Almodóvar recorre à cena em que Pedro Pascal está deitado de bumbum nu. Ironicamente, em um flashback, as versões dos personagens se beijam banhados por vinho, o que é sugestivo até do comprometimento dos atores com o projeto.
Sem funcionar como romance, senão no fado inicial que dá título e melancolia à obra, Extraña Forma de Vida tampouco é um bom faroeste. Almodóvar recorre ao clássico para compensar a inexperiência frente ao gênero: há a encenação do truelo popularizado em Três Homens em Conflito e quadros na parede que remontam aos clássicos de John Ford. A busca de Jake por Silva é anticlimática e não funciona como miolo do enredo.
Ao menos, Almodóvar tenta imprimir o estilo kitsch ao oeste árido: as cores da camisa de Silva, da luminária e da caneca, os objetos cênicos religiosos, e mesmo os enquadramentos do diretor que posicionam ambos os personagens em foco, ainda que estejam no plano de frente e de fundo. Trazê-los em evidência é o mínimo que se pode fazer para pôr o sentimento do reencontro no mesmo plano, já que todo o restante, Extraña Forma de Vida não é apto a fazer.
Crítica publicada durante a cobertura do Festival de Cannes 2023.
Crítico de cinema filiado a Critics Choice Association, à Associação Brasileira de Críticos de Cinema, a Online Film Critics Society e a Fipresci. Atuou no júri da 39ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo/SP, do 12º Fest Aruana em João Pessoa/PB, do 24º Tallinn Black Nights Film na Estônia, do 47º TIFF – Festival Internacional de Cinema em Toronto. Ministrante do Laboratório de Crítica Cinematográfica na 1ª Mostra Internacional de Cinema em São Luís (MA) e Professor Convidado do Curso Técnico em Cinema do Instituto Estadual do Maranhão (IEMA), na disciplina Crítica Cinematográfica. Concluiu o curso de Filmmaking da New York Film Academy, no Rio de Janeiro (RJ) em 2013. Participou como co-autor dos livros 100 melhores filmes brasileiros (Letramento, 2016), Documentário brasileiro: 100 filmes essenciais (Letramento, 2017) e Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais (Letramento, 2018). Criou o Cinema com Crítica em fevereiro de 2010 e o Clube do Crítico em junho de 2020.