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Ramona

3/5

Ramona

2024

81 minutos

3/5

Diretor: Victoria Linares Villegas

“O que você acha necessário para ser mãe? Ter coragem”

Se a gravidez na adolescência é uma realidade presente em diversos locais do globo, em países do terceiro mundo ela se torna mais evidente. Essa acaba por ser um reflexo da falta de educação sexual, políticas públicas, violência sexual dentro e fora de casa, misoginia e de um meio marcado pela vulnerabilidade. Em um país continental como o Brasil, ela é uma questão que salta aos olhos; em um insular como a República Dominicana, ela grita. Independente da localização geográfica, é algo que merece ser discutido, desde sua origem até a maneira como essas adolescentes que vão se converter em mães devam ser acolhidas.

Ramona aborda o assunto através da inquietação de Camila, uma atriz que, diante da sua insegurança para interpretar Ramona, uma adolescente periférica que acaba engravidando, realiza um laboratório entrevistando Ramonas da vida real. O documentário se cria em cima desses encontros em que as adolescentes contam suas histórias de vida. Muitos desses depoimentos compartilham traços em comum. Alguns refletem uma inocência inerente da juventude, outros refletem a malícia dos homens, em especial os mais velhos. Um fato que chama a atenção ao longo desse coletar de histórias é que muitas dessas meninas são filhas de mulheres que também se tornaram mães na adolescência. É triste observar como a experiência da maternidade acabou por desmanchar sonhos pela sobrecarga de responsabilidade.

Ainda mais triste são alguns depoimentos que denunciam a violência na qual essas adolescentes são expostas, antes e depois da gestação. Muitas não são acolhidas pela família e, em um caso especialmente, uma jovem gestante conta das violências várias cometidas por seu padrasto. Nesse momento, a montagem faz uma escolha sagaz de exibir a imagem da atriz, apresentando uma expressão de espanto igual a dos que estão desse lado da tela, sentados nas poltronas. É revelado também que muitas dessas adolescentes são abordadas por homens – dos mais novos aos mais velhos – oferecendo bebidas e maconha em troca de favores sexuais ou, até mesmo, a intenção de entorpecê-las para o sexo sem consentimento. É curioso que, apesar desse cenário hostil, muitas dessas jovens acreditam que o destino se deve ou ao comportamento inadequado daquelas que se atiram na vida (sexual) precocemente, ou devido a falta de malícia derivada de uma criação muito rígida, mas que não prepara para as armadilhas do mundo.

A busca pela legitimidade da interpretação produz a encenação da abordagem masculina sobre a personagem adolescente mediante a plateia de gestantes. Elas julgam e comentam cada detalhe das reações e atitudes a serem tomadas, participando ativamente do processo criativo do roteiro. É quando escancara esse filme dentro do filme que a proposta se eleva. Pois apesar da inquietação que dá origem a seu argumento, o desenrolar do documentário se sustenta no formato talking head, se permitindo apenas a algumas pinceladas do processo de construção de personagem por parte da atriz. O exibir mais dos bastidores confere novas camadas ao longa. Ainda mais quando ele questiona quem realmente está apto a interpretar o papel.

A solução trazida ao final é a mais interessante possível. Mais que trazer aquelas pessoas reais para interpretar papeis dentro do suposto filme, ele recorre a uma espécie de teste de elenco. O achatar diversas tomadas com diferentes atrizes sociais interpretando Ramona em uma mesma cena comprime ficção e realidade em um mesmo plano. O resultado disso é uma construção híbrida completamente inesperada e que se sobressai a qualquer outra originalmente pensada. Acaba que um recorte do processo de uma produção cinematográfica se tornou um filme ainda mais interessante.

Ramona foi exibido na Mostra Continente do 18º Festival Internacional de Cinema de Belo Horizonte – Cine BH.

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