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Me Chama Que Eu Vou

Me Chama Que Eu Vou

70 minutos

Apesar de serem protocolares quando comparadas com produções semelhantes, certas biografias, em formato documental ou ficcional, têm como mérito narrar a história de uma figura tão vibrante e apaixonante, que torna difícil atentar a aspectos mais ou menos burocráticos e convencionais. Por mais que estes estejam presentes na narrativa, se cuidados por uma direção hábil e talentosa como a de Joana Mariani, não interferem em como apreciamos o resultado final. Com isto, não quero dizer que basta narrar a história de uma figura pública igual a Sidney Magal que você pode escapar ileso do uso medíocre da linguagem cinematográfica, e ‘Bohemian Rhapsody’ está aí de contraprova, mas apenas que a forma não deve ser analisada isoladamente em descompasso com o coração.

Em ‘Me Chama que Eu Vou’, Sidney Magal abre um baú de memórias alimentado pela personalidade assumidamente narcisista a ponto de tornar-se acumulador de recortes de jornais e revistas, fotos e vídeos de arquivos suficientes para que Joana debruce-se e construa o mosaico da personalidade do cantor e dançarino. Os elementos formais são os habituais: o antes, relacionado cronologicamente, em contraponto com entrevistas na casa de Sidney, na Bahia. Como as engrenagens dialogam entre si, é aí que está a magia.

Dá para enxergar, na escolha de imagens e trechos de vídeos, a dualidade entre Magal e Magalhães, uma espécie de médico e monstro, ou a representação do ideário de uma vida de fantasia, não de realidade, uma encenação do eu-narcisista que existe, bem ou mal desenvolvido, dentro de nós, e um desejo intrigante de ser amado e discutido. Filho único de uma mãe que “não o forçou a cantar, mas o protegeu para cantar”, desde jovem Magal sonhou com a vida artística na sociedade dos anos 70, um cenário mais machista que os dias de hoje e que não estava pronto para compreendê-lo de imediato.

Inteligente a ponto de reconhecer ser usado pela máquina publicitária e utilizá-la como trampolim ao seu sucesso, o Magal de ontem era um objeto de inquisição por entrevistadores interessados na sexualidade sugerida pela liberdade de movimentos e pelo modo de vestir-se e tendentes a notícias falsas ou imprecisas apenas por serem sensacionalistas. Além de este ser o retrato do jornalismo de entretenimento da época, o documentário é evidência do pensamento do período e da forma como este mudou: uma canção como “Se te agarro com outro, te mato” seria impensável nos dias de hoje diante da epidemia da violência doméstica, e o fato de estar inserido no documentário é indicativo da jornada do cantor que a retirou da lista de shows.

A honestidade documental é admirável e reflexo da sinceridade do biografado, que não lamenta em reconhecer não ter técnica interpretativa, embora tenha sido sempre ator, e rememora os pontos baixos da carreira com ternura ao reconhecer, emocionado, as oportunidades que lhe foram dadas.

Como panorama de momentos da vida e carreira do ator, ‘Me Chama que Eu Vou’ opta por delimitar o recorte, e não abrange-lo. Por saber que 72 minutos não servem nem para arranhar a superfície da história do ícone, o documentário decota o verniz da personalidade de Magal e ilustra-o junto às  suas canções mais dançantes. O resultado é vibrante, romântico e revelador.

Crítica publicada durante a cobertura do 48º Festival de Gramado.

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