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O Palestrante

O Palestrante

102 minutos

Fábio Porchat finge ser coach motivacional em comédia

Apesar de ter momentos desprezíveis no humor, a exemplo da piada feita com a aparência bucal da atriz Judi Dench no Oscar, Fábio Porchat costuma se sobressair até em comédias menos eficazes, tipo Totalmente Inocentes, Meu Passado me Condena ou O Concurso, que dirá em obras superiores: Entre Abelhas continua sendo meu filme favorito de sua carreira e a série Homens!, na Amazon Prime, conquista com a franqueza do discurso a respeito da imaturidade e desconstrução masculina. Em ambos os casos, Fábio Porchat utiliza a autodepreciação como fonte do humor e elemento de construção de personagens inadequados onde estão. 

O protagonista Guilherme, de O Palestrante, está na intercessão entre esses dois mundos, embora a comédia dirigida por Marcelo Antunez (de Qualquer Gato Vira-Lata 2 – eita! – Até que a Sorte nos Separe 3: A Falência Final – ish!! – e Polícia Federal: A Lei é para Todos – socorro!) opte pela abordagem do escracho, não da reflexão. No roteiro escrito por Claudia Jovin e Porchat, Guilherme atravessa o pior momento da vida: é demitido do emprego e, após descobrir ter sido traído, é largado pela companheira. No dia seguinte, quando vai ao trabalho assinar a papelada da demissão, descobre que o chefe infartou e, aparentemente, ninguém mais sabia do desligamento. Guilherme, então, finge que nada aconteceu e viaja ao Rio de Janeiro, onde decide se passar por Marcelo, coach motivacional, enganando a todos, o tempo que o roteiro julgar conveniente, até aprender uma lição de vida e conquistar aqueles no resort para onde viaja. 

O maior problema de O Palestrante está na premissa frágil: basta uma pesquisa na internet para descobrir quem é Marcelo e não confundi-lo. Assim, o roteiro não exige só suspensão de descrença, exige que acreditemos que Denise (Calabresa) seja tola o bastante para não saber a identidade da pessoa que contratou. O fato de o nome de Marcelo ser comum ainda debocha da inteligência do espectador, quando havia soluções simples e elegantes do tipo: “você parecia diferente nas fotos da internet”, “é que as fotos da internet são retocadas” ou algo que o Porchat tiraria de letra. A propósito, não é apenas Denise que não busca quem Marcelo é, mas também Guilherme, incapaz de pesquisar o óbvio no YouTube: ‘palestra motivacional Marcelo’ e treinar conforme o que o cara criou. Desse modo, demora bastante para que o espectador compre a ideia da narrativa, se é que compra, para então curtir a participação afiada do elenco de apoio. 

Deve ser a primeira oportunidade de que me lembro em que Fábio Porchat é eclipsado pelo restante do elenco: Antônio Tabet, o mais irreverente em incorporar o estereótipo do carioca malandro, Paulo Vieira, Otávio Müller, Miá Mello e Maria Clara Gueiros, todos reproduzem o humor nas expressões, nas gírias, nos trejeitos e no comportamento. Diferentemente, Guilherme deve aparentar menos confiança pois o barato da narrativa está em transformar o perdedor habitual em um sujeito motivador, e no processo, alfinetar a profissão de coach. É por isto que as melhores cenas de Guilherme são o resultado do roteiro – lembram-se de vicissitudes? – ou da reação aos colegas de elenco. Da mesma forma, Dani Calabresa não interpreta uma personagem cômica, mas uma personagem submetida a instantes cômicos. 

Ambos são passivos ao humor porque O Palestrante é também uma comédia romântica que aproxima perdedores ao propor o reconhecimento do amor próprio e do traquejo social nos personagens. Contudo, faz isto de modo convencional em termos formais ao somente reprisar a fórmula do personagem apoiado na farsa, e que será descoberto no momento em que estava confortável com a mentira até ter a oportunidade de redenção. Assim, em certos momentos, Marcelo Antunez utiliza uma trilha sonora de suspense sugerindo que Guilherme pode ser desmascarado quando já sabemos que isto não acontecerá ainda – o momento do carisma de Mari. É um efeito vazio e ingênuo. Noutros momentos, por ter a informação que falta ao elenco, posso apreciar a trapalhada de Guilherme em fingir ser o palestrante que não é e reparar o semblante alheio de quem assiste às palestras e perde o fio da meada. 

Mas há um pecado na comédia, com o título que tem, não aproveitar a possibilidade que há nas palestras para produzir ou humor besteirol e pastelão ou irreverente e ácido. No lugar, sobra o desconforto de Guilherme em estar em posição de destaque, sequências breves e musicais mais embaraçosas do que engraçadas e a antecipação das voltas do roteiro que já conhecemos. 

O Palestrante é até eficiente quando vira a câmera aos coadjuvantes e os deixa livres para que o espectador sorria dos absurdos, mas falha em aproveitar o conceito central por não saber estabelecê-lo nem o desenvolver. Fica no quase. 

O Palestrante está em exibição nos cinemas brasileiros

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1 comentário em “O Palestrante”

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