Brad Pitt a bordo do divertido e frenético trem em direção a seu destino
Quando era jovem lá em Barbacena (daí vocês tiram minha idade), o cinema de ação era resumido a Arnold Schwarzenegger, Sylvester Stallone, Bruce Willis, Wesley Snipes e outros, disputando quem tinha o maior bíceps. Não que não adorasse aquele cinema hoje denominado brucutu, mas que bom assistir às ramificações do gênero de ação no século, a estilização do gênero além do óbvio, a influência do cinema asiático no balé de artes marciais, a introdução do senso de humor ácido e macabro, ao empoderamento feminino dentro do gênero. Hoje, mais do que nunca, o cinema de ação oferece tantas oportunidades além de homens valentões salvando o mundo e trocas de tiros e sopapos, excitante para quem ama o gênero.
E Trem Bala acumula ramos do cinema de ação contemporâneo dentro da embalagem apertada do veículo sobre trilhos mais rápido do mundo. Adaptado por Zak Olkewicz a partir do livro de Kōtarō Isaka, o roteiro é mais acelerado do que o tempo de parada nas estações ao situar o espectador dentro de um mundo de assassinos néon, tipo aquele de John Wick, embora bem mais humorado. Somos apresentados a Joaninha, o codinome do personagem interpretado por Brad Pitt, cujo azar definiu a decisão tomada na carreira: em vez de assassino de aluguel, apenas o cara que surrupia e entrega aquele item a quem o contratou (no caso em particular, uma maleta de prata com milhões de dólares). O problema é que Tangerina e Limão, Aaron Taylor-Johnson (de A Era de Ultron) e Brian Tyree-Henry (de Atlanta), foram contratado para levar a maleta e o filho de Morte Branca, Logan Lerman, ao chefão do crime organizado no Japão. Há terceiros casualmente interessados na maleta, o Príncipe (Joey King), e aqueles que estão no trem por motivos particulares, casos do Lobo (Bad Bunny) e Kimura (Andrew Koji).
A salada de personagens aumenta à medida que o trem avança em direção à estação de Kyoto e participações especiais começam a desaguar dentro da narrativa no mesmo ritmo frenético com que os golpes são trocados pelos personagens. Muito do charme da narrativa está em curtir a viagem, e assistir aos encontros e desencontros dos personagens, que não sabem o motivo de estarem reunidos naquela situação, embora tentem executar sua missão da melhor maneira possível. O tempo avança e a direção de David Leitch (de John Wick, Deadpool e Atômica) retrocede ao passado para revisitar alguns momentos desconhecidos de nós, às vezes duas vezes para esclarecer fatos não apresentados na integralidade. Não demora para a garrafa d’água batizada ter sua história de origem.
O escracho do tipo de humor de Deadpool – embora não autorreferencial – é diretamente proporcional à ação e violência. Na realidade, logo que o trem deixa a estação, a direção proporciona 2 horas de suspensão da descrença… e da respiração. Não só em razão de os personagens estarem em movimento, indo de lá para cá, mas quando estão sentados, os diálogos conferem alternativa e dinamismo à narrativa, pois são encenados igualmente de modo ágil. Enquanto isto, o roteiro proporciona mudanças de percurso no meio do caminho que ressignificam a missão de Joaninha e dos demais dentro de um argumento que remete ao azar e à sorte, e ao destino como se este fosse o inimigo insuperável colocado diante da trupe de assassinos.
A ação é encenada dentro dos vagões apertados do trem, e utiliza a falta de espaço como estímulo para a construção de sequências envolventes de luta, valorizadas ainda pelo fato de Joaninha recusar-se a utilizar armas de fogo. No lugar, aquilo em que puder colocar a mão: bandeja, garrafa de água (olha ela de volta) etc. Brad Pitt, aos 58 anos e em apenas o 3º filme de ação (após Snatch: Porcos e Diamantes – que nem de ação propriamente dito é – e Sr. e Sra. Smith), realiza o máximo de stunts possível, adicionando ainda ao personagem o maneirismo do movimento agitado do corpo e uma grata jovialidade ao papel. Ao lado da estrela-mor que ilumina a narrativa inteira, um elenco coadjuvante competente e igualmente pitoresco, em maior ou menor grau de participação.
Tudo muito empolgante, como blockbusters devem ser, com humor ácido, sádico e mórbido, ação frenética e descontrolada, coincidências e revelações no melhor estilo Guy Ritchie de fazer cinema e atores com carisma em abundância. Eu curti cada minuto dessa viagem e já quero comprar o tíquete de volta.
Trem Bala está disponível nos cinemas.
Leia também a crítica escrita por Thiago Beranger no link.
Crítico de cinema filiado a Critics Choice Association, à Associação Brasileira de Críticos de Cinema, a Online Film Critics Society e a Fipresci. Atuou no júri da 39ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo/SP, do 12º Fest Aruana em João Pessoa/PB, do 24º Tallinn Black Nights Film na Estônia, do 47º TIFF – Festival Internacional de Cinema em Toronto. Ministrante do Laboratório de Crítica Cinematográfica na 1ª Mostra Internacional de Cinema em São Luís (MA) e Professor Convidado do Curso Técnico em Cinema do Instituto Estadual do Maranhão (IEMA), na disciplina Crítica Cinematográfica. Concluiu o curso de Filmmaking da New York Film Academy, no Rio de Janeiro (RJ) em 2013. Participou como co-autor dos livros 100 melhores filmes brasileiros (Letramento, 2016), Documentário brasileiro: 100 filmes essenciais (Letramento, 2017) e Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais (Letramento, 2018). Criou o Cinema com Crítica em fevereiro de 2010 e o Clube do Crítico em junho de 2020.
1 comentário em “Trem Bala”
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